São às centenas os camiões que transportam mercadoria manufacturada do Sul para o resto do país, entretanto encalhados em Save, à espera de uma oportunidade para a travessia do Rio e vencer a maldita distância até Muxúnguè. Daquí, outros tantos camiões que levam matéria prima para o Sul, igualmente à espera da vez.
Todo este cenário concorre para atrasos na entrega.
A mercadoria que parte de Maputo para as diversas regiões do centro e norte de Moçambique acaba encalhando no Rio Save, porque a segurança no troço que vai até Muxúnguè está deteriorada, por causa do conflito entre a Renamo e o Exército.
Gradualmente, os camionistas tomam conta, porém, de que a crise envolve unicamente as partes e não deve ter como protagonistas, também, os automobilistas que se fazem por aquele troço de cerca de 110 quilómetros de Estrada em condições paupérrimas, como se não bastasse.
Na paragem obrigatória de Save, são às centenas os camiões que aguardam a vez de se fazerem à Estrada. Os murmúrios raramente chegavam aos ouvidos dos elementos das Forças de Defesa e Segurança (FDS) estacionados na zona, responsáveis pela gestão do trânsito, alegadamente em defesa dos automobilistas e dos bens materiais, para que não sejam atingidos pelos elementos da Renamo.
Todos os camionistas que partem de Maputo, têm a consciência de que têm de pernoitar, no mínimo, uma vez no Rio Save, mas há quem acaba passando duas ou mais noitadas neste local, onde entretanto não falta praticamente nada, desde que haja dinheiro sempre disponível.
É uma espécie de feira, onde até o sexo “avulso” está patente, a preços inflacionados, devido à enorme procura por homens que periodicamente precisam de renovar o estado de animosidade.
Há prostitutas de todos os gostos e feitios, desde magras, passando por meio-magras até as que denotam gorduras quase a rebentar pelas costuras. Os preços, esses, é que variam de pessoas para pessoas.
As idades das prostitutas partem dos 16 até os 30 anos, e todas têm o mesmo objectivo: angariar o maior número de clientela em tempo recorde, que isso equivale a um acumular de dinheiro.
Há prostitutas que andam protegidas, por jovens locais que desempenham uma espécie de angariadores e, ao mesmo tempo, de ‘seguranças’ para que não haja quem não queira pagar a ‘corrida’ sexual em função do cronometrado.
Já lá vai o tempo em que as autoridades conseguiam controlar a actividade sexual neste local, entretanto fragilizadas pelo alto sentido de sedução das prostitutas, que fazem agitar notas de dinheiro aos olhos dos agentes policiais, ficando, desse modo, sem o sentido profissional capaz de impôr ordem deste lado da margem do Rio Save.
Jogo de empurra
Até um passado recente, os automobilistas que habitualmente se fazem ao troço Save-Muxúnguè apostavam no ‘salve-se quem poder’, cada um puxando a brasa para a sua sardinha, tornando-se presas fáceis dos elementos das FDS.
Até que chegaram à conclusão de que unidos, poderiam quebrar os obstáculos que se lhes colocavam à sua frente.
Esta viragem coincide com a comunicação da Renamo apontando para a necessidade de se observar, atentamente, o alvo da organização: elementos das FDS e viaturas que, embora sendo civis, transportam consigo agentes das FDS.
A partir daí altura, os automobilistas concertaram ideias e passaram a exigir que, sozinhos, poderiam avançar pelo dramático troço, sem a escolta das FDS.Os agentes recusam a ideia e até ameaçam com represálias se tal ocorrer. Gera-se uma enorme confusão entre os automobilistas e os elementos das FDS, gestores do troço.
Os automobilistas estão convencidos de que, sem a escolta militar, são capazes de acelerar a marcha pelo troço, como estariam isentos de qualquer acção bélica vinda das enormes machambas que caracterizam o aludido troço.
As autoridades não se convencem e tentam, em vão, recordar que nos primórdios da crise, alguns camiões de carga chegaram a ser abatidos para, deles, serem roubados bens materiais e alimentares, pelos mesmos indivíduos armados da Renamo que agora dão garantias de que não irão atacar os camiões quando não integrados em escoltas militares. Há um jogo de empurra no auge.
Do lado de Muxúnguè, a vila empresta alguma, aparente, normalidade, como se nada estivesse a acontecer a escassos quilómetros dali.
O mesmo que se passa em Save, em Muxúnguè, estão perfiladas centenas de viaturas com destino à região Sul, com passagem obrigatória por aquele troço de quase 110 quilómetros.
Deste lado, os camiões transportam normalmente matérias primas para as cidades de Maputo e Matola.
Por causa das dificuldades de momento, a alta de preços disparou em mais de 100% junto aos proprietários das mercadorias, preço que será reflectido ao consumidor final.
Os falsos camponeses
Nesse troço de aproximadamente 110 quilómetros, o tal de ataques repentinos de elementos da Renamo contra viaturas integradas na coluna escoltada por militares, não há sinais de perigo, quando visto à primeiro no primeiro contacto.
A paisagem é preenchida por machambas e alguma mata, isolada, mas na essência são machambas e algumas dezenas de camponeses a trabalhar a terra ou a fazer colecta da produção alimentar.
Não há, aparentemente, razões para desconfianças.
Mas há ataques mortíferos ao longo do troço.
O que sucede é que, os tais camponeses que andam a trabalhar a terra ou a colectar produção, coincidentemente sempre que uma coluna de viatura se faz à Estrada, escondem o material bélico e se fazem de camponeses, mas responsáveis por fazer passar a informação para os companheiros melhor posicionados em pontos estratégicos para os ataques.
Não surpreende, por isso, que os elementos da Renamo saibam identificar as viaturas civis que transportam militares e material bélico, sendo atacadas por isso.
Os camionistas, tradicionais utilizadores do troço, sabem disso e já se rendem à evidência dos factos. Eles tentam recusar integrar os militares nas suas viaturas, mas nem sempre ganham essa batalha, por sob o risco de serem registados como “colaboradores do inimigo” e daí excluídos das colunas.
Por causa de todo este cenário, as matérias primas que saiem do outro lado do Rio Save, para as fábricas do lado de cá, nomeadamente Maputo e Matola, atrasam a chegar e quando finalmente atingem o ponto de chegada, os custos são elevados.
Deste lado para lá do Save, os camiões transportam produtos acabados, manufacturados em fábricas que existem por cá, ou levados em grandes armazéns maputenses, para Sofala, Manica, Tete, Zambézia, mas acabam encalhando devido à tensão que se intensifica no mencionado troço Save-Muxúnguè.
O empresariado nacional lamenta e classifica o negócio como estando em ‘banho-maria’. sr
EXPRESSO – 24.06.2014