A escassos dias do início, a 5 de Novembro, da campanha eleitoral com vista à realização das quartas eleições autárquicas, marcadas para 20 de Novembro próximo, a actuação da Polícia de República de Moçambique (PRM) continua a levantar sérios questionamentos, principalmente no seio dos partidos políticos da oposição que entendem estar a ser vítimas de uma força totalmente partidária que age em função dos interesses do partido no poder, a Frelimo.
É que os agentes da Lei e Ordem, no óptica das forças das oposição política, contrariando a postura de imparcialidade que se espera que adoptem na resolução de qualquer que seja o caso, optam por acções que remetem a uma Polícia que age em defesa de interesses partidários. Efectuam “detenções sumárias sem observância das mais elementares normas jurídicas para o efeito”, para além de se manterem inertes em relação aos casos que envolvam directamente o partido no poder. Esta situação, de resto, é evidenciada nos inúmeros casos de “intolerância política” reportados pelos media, o que traz ao de cima o ostracismo da força policial e deixa claro o facto de que estes são instrumentalizados para servirem interesses políticos particulares através da hostilização da oposição.
Detenções
A recente detenção e julgamento do delegado político e outros três membros do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), que são também candidatos a membros da Assembleia Municipal na vila autárquica de Macia, província de Gaza, que depois foram restituídos à liberdade por falta de provas materiais do crime de que eram acusados, é disso exemplo. Os quadros do MDM, nomeadamente Joaquim Bane, João Mário, Miguel Jamisse (delegado de partido), e um outro cujo nome não foi possível apurar, foram detidos na noite do dia 15, no distrito de Macia, acusados de ofensas corporais contra três supostos membros da Frelimo.
A prisão foi executada depois de os quatro terem entrado em desavenças com três indivíduos apontados como sendo da Frelimo que teriam invadido a casa do delegado político daquele partido, onde decorria uma reunião de preparação das eleições autárquicas. O pessoal do MDM, depois de se aperceber de que estava a ser “espionado” por pessoas desconhecidas, procurou saber o que pretendiam, tendo estes dito que iam comprar barrotes. Sucede que no local em causa não se vende esse material de construção, facto que aumentou as suspeitas de que aqueles pretendiam espionar a reunião. Os dois grupos ter-se-iam, em seguida, envolvido em violência.
Entretanto, e é quando situação ganha um contorno curioso, a Polícia, quando chamada a intervir, chegou ao local e levou os dois grupos à esquadra, tendo mantido na cela os quatro membros do MDM e, supostamente, acompanhado a uma unidade sanitária o outro grupo de supostos membros da Frelimo alegando que estes haviam sofrido ferimentos e que precisavam de tratamento médico.
O que aconteceu, de facto, é que mesmo depois de terem recebido cuidados hospitalares os tais indivíduos que o MDM entende serem pertencentes ao partido no poder nunca mais voltaram para a esquadra, mesmo pesando sobre eles a acusação de invasão domiciliária.
Depois de seis dias de detenção à espera do julgamento, que veio a realizar-se na última segunda-feira (21), os quatro elementos do MDM foram restituídos à liberdade porque o juiz entendeu que não havia provas materiais que sustentassem a acusação. Este é apenas mais um caso de muitos que os partidos da oposição, particularmente o MDM, têm vindo a relatar relacionados com a fragilidade da Polícia moçambicana no cumprimento do seu dever.
Outros casos
Em Abril passado, elementos tidos como do partido Frelimo atearam fogo à Delegação Distrital do MDM, na sede do distrito da Macia, localizada no Bairro 5, na província de Gaza.
Na altura, o delegado político distrital do MDM, Miguel Jamisse, disse ter-se apercebido da presença de cerca de cinco indivíduos estranhos, que se faziam transportar numa carrinha de caixa aberta que, depois de satisfazerem seus intentos, se puseram em fuga, não tendo permitido que nem eles nem a sua viatura fossem identificados. Os tais indivíduos, com recurso a pé-de-cabra, teriam arrombado a porta da delegação, tendo posteriormente introduzido cinco pneus, alguns barrotes e uma botija de gás de cozinha e depois ateado fogo. Todo o mobiliário, composto por três sofás, uma mesa e outros bens, ficou calcinado.
Segundo contou o nosso interlocutor, aquele não era o primeiro caso pois “indivíduos ligados ao partido Frelimo” já haviam sido apanhados, na calada da noite, a arrear a bandeira do MDM. “O secretário do Gabinete do primeiro secretário do Comité Distrital do partido Frelimo, José Carlos, já me havia tentado atropelar de carro alegando que tinha trazido matsangas para Macia”.
Entretanto, a reacção do pessoal da Frelimo na ocasião é que deixou Miguel Jamisse mais indignado pois, de forma orgulhosa, fez notar que nada lhe iria acontecer porque “tanto a Polícia assim como os tribunais estão sob seu controlo”. De facto, o caso, quando levado ao tribunal ,“morreu” sem que tivesse sido feita a justiça contra os criminosos.
Secretário-geral constituído réu
Recentemente, um grupo de membros da Frelimo inviabilizou o trabalho do secretário-geral do MDM, Luís Boavida, no distrito da Macia, durante a sua visita à província de Gaza. Estranhamente, ele foi constituído réu alegadamente porque tirou fotos a tais pessoas, que se encontram em liberdade. Entretanto, foi absolvido pela juíza que não viu elementos que sustentassem a acusação.
O processo foi movido pelos elementos do partido no poder, que não souberam responder quando questionados pela juíza sobre o que estavam a fazer e o que queriam na delegação do MDM.
Chókwè
Ainda este ano, o partido Frelimo destruiu as instalações da delegação do MDM no distrito de Chókwè, sob ordens do edil e do administrador distrital, como veio a provar-se. Igualmente, foram queimadas e destruídos os escritórios do partido do “Galo” em Chibuto e Mandlakazi, e em Xai-Xai foi inviabilizada a marcha do MDM por ocasião do seu dia, 7 de Março.
Já no dia 22 de Setembro, o partido do “Galo” manifestou o seu desagrado e preocupação face às “sistemáticas detenção e perseguições” aos seus membros, incluindo os candidatos a edis nalguns municípios que este ano acolhem as eleições autárquicas. Estes actos, segundo denunciou o MDM, são protagonizados pela Polícia, supostamente a mando do partido Frelimo.
Citando alguns exemplos, o chefe do Departamento Nacional de Formação de Quadros e Projectos do MDM, Elias Impuir, apontou os candidatos do MDM a edis dos municípios de Manjacaze e da vila de Bilene, todos na província de Gaza, sul do país, que teriam sido agredidos e detidos pela Polícia da República de Moçambique (PRM) durante uma reunião com quadros do seu partido, inserida no âmbito da preparação dos próximos compromissos políticos, nomeadamente, as eleições autárquicas, este ano, e as gerais, em 2014.
Montepuez
Outro caso que terá merecido pouca atenção da imprensa envolve um elemento da Serviço de Informação e Segurança de Estado que terá intimado o candidato a presidente do Conselho Municipal de Montepuez, Cabo Delgado, Pihale Mussa, a apresentar-se na manhã do dia 07 de Outubro, durante o qual o sujeitou a interrogatório.
A secreta moçambicana que muitas vezes é entendida como estando ao serviço do Frelimo e não do Estado moçambicano quis saber do candidato as razões de ele estar a concorrer pelo MDM, as suas intenções, o número de filhos, se é casado ou solteiro, a declaração dos bens que possui, o número de membros do partido e, por fim, exigiu uma fotografia. A forma como foi dirigido o interrogatório leva a crer que se tratava de uma acção encomendada pelo partido governamental, no sentido de o intimidar.
Código de conduta eleitoral
Entretanto, em reconhecimento deste e de outros problemas que precisam de ser combatidos, o Código de Conduta e Ética Eleitoral, que não é nenhum instrumento jurídico, adoptado pela maioria dos partidos que irão participar nas eleições autárquicas, estabelece que “as Forças de Defesa e Segurança devem garantir a segurança pública de todos os intervenientes eleitorais, sem discriminação partidária, e devem actuar no sentido de combater a violência eleitoral, seja qual for o promotor”.
Entretanto, é sentimento comum no seio dos partidos da oposição que nalgumas acções os agentes da Polícia se intrometem a mando e em defesa dos interesses do partido no poder.
Polícia formatada
Sobre esta situação, o chefe da bancada parlamentar do MDM, Lutero Simango, entende que o problema está nos agentes que comandam a Polícia porque estes estão politicamente formatados e ocupam cargos de chefia não por competência, mas por confiança política.
“As pessoas são nomeadas não em função da competência, mas por confiança política e como resultado, e para manter a sua posição e os privilégios adquiridos, combatem a oposição e o MDM tem sido uma das vítimas”, disse, acrescentando que estes “esquecem que juraram garantir a ordem e tranquilidade públicas.” O entrevistado entende que esse combate maquiavélico aos partidos da oposição só irá parar quando os opressores entenderem que ser oposição não significa ser inimigo, mas ressalva que “a mudança da mentalidade leva o seu tempo, que muitas vezes não é curto.”
“Há Polícia da República de Moçambique como instituição que nós respeitamos e reconhecemos a sua existência e legalidade. Mas também há agentes da Polícia e, infelizmente, são esses que asseguram o comando e a direcção da Polícia, são politicamente formatados para combater a oposição. E eles ignoram que juraram defender o cidadão, ” concluiu. Refira-se que em Maio último, a bancada parlamentar do MDM votou contra a proposta de revisão de Lei da Polícia da República de Moçambique alegando que a força policial no país “é instrumentalizada para reprimir e intimidar os partidos políticos da oposição”.
A Verdade
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