Xícara de Café por Salvador Raimundo
EM definitivo, os moçambicanos não estão preparados para mais escândalos.
Isso mesmo gritaram alto os manifestantes que sábado desfilaram por algumas artérias da cidade de Maputo, em representação dos demais moçambicanos em todo o país.
Sem pão que chegue porque o salário míngua e sem o arroz em quantidades para suportar um agregado familiar (média de cinco elementos), a fome é ainda agravada pela estiagem que tem assolado o sul e parte do centro de Moçambique, chamando a atenção dos doadores internacionais e do Programa Mundial para a Alimentação (PMA).
Mas é a guerra que mais aflige os moçambicanos, porque para além da sua natureza devastadora, condiciona a circulação de pessoas e bens entre o sul e o norte, passando pelo centro.
Isso mesmo motivou o desfile, sábado, de centenas de manifestantes em protesto contra a guerra não declarada, por tabela, chamando a atenção do facto de a crise de dívida oculta estar ainda por esclarecer.
Os moçambicanos exigem mais dos negociadores da paz e dizem que é urgente um cessar-fogo, acusando a arrogância e a intolerência principais argumentos que alimentam o recrudescer dos duelos entre o executivo e a Renamo, em sede de uma instância hoteleira da capital moçambicana.
Pese a garantia dada pelo presidente da República de que os seus delegados para a comissão mista gozam de independência, há semanas os moçambicanos assistiram ao episódio de clara interferência, através da comissão política da Frelimo, que forçou a comitiva a clarificar publicamente o teor de um entendimento havido entre governo e a Renamo àquele nível, sob mediação e facilitação internacional.
Tal acabou mexendo com todo o dispositivo organizacional que havia sido montado pelas três partes – governo, Renamo e mediadores – e que consistia no balanço por cada final da sessão negocial a ser apresentado, de forma rotativa, pela chefia das comitivas, Jacinto Veloso e José Manteigas.
Até à última sessão, coube a Mario Rafaelli, mediador-chefe, fazer-se de porta-voz.
Depois de algum avanço na questão relativa a governação das províncias, a comissão mista está a enfrentar dificuldades em alcançar consenso para um cessar-fogo provisório que seja.
Em causa, desconfianças mútuas. Dhlakama exige o recuo do exército por temer ser atacado e não lhe faltam argumentos credíveis, ou não credíveis, dependendo da análise que cada um fôr a fazer.
Caricato é que Filipe Nyusi venha, hoje, dizer aos moçambicanos que a paz é necessária, mas não a qualquer preço.
Então não é o mesmo Nyusi que em período de campanha e logo após tomada de posse andou a dizer que para a paz não deve haver outra coisa que esteja acima?
Não fosse a política ciência que só é válida quando os seus actores se contradizem, ao ritmo de afirmações contraditórias de manhã, a tardinha e a noitinha, diferente uma da outra...
EXPRESSO – 29.08.2016, no Moçambique para todos
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