Thursday, 12 November 2015

A crise que se avizinha

 


Pela primeira vez em dez anos, o governo de Moçambique foi bater à porta do Fundo Monetário Internacional (FMI) para pedir um empréstimo de 286 milhões de dólares, que deverá ser autorizado quando o Conselho Executivo daquela instituição financeira internacional se reunir em meados de Dezembro.
O pedido deste empréstimo é um indicador claro do quão stressada se encontra a economia moçambicana, numa altura em que uma das três principais agências de anotação financeira, a Fitch, acaba de baixar a classificação de Moçambique de B+ para B.
Ao atribuir esta nota, a Fitch acrescenta que o quadro fiscal do país “deteriorou-se de forma acentuada no decurso do último ano, reflectindo elevados défices orçamentais, um rápido crescimento da dívida pública, volatilidade de receitas e um crescimento da factura salarial”.
No contexto das discussões realizadas em Outubro entre o governo moçambicano e uma missão do FMI, esta prevê que o crescimento económico do país se situe em 6,3 por cento em 2015, passando para cerca de 6,5 em 2016. Estes dados contrariam o objectivo traçado pelo governo, que previa um crescimento económico de 7,5 por cento para o presente ano.
Embora a missão do FMI considere que a actividade económica em Moçambique se mantenha sólida e a inflação baixa em cerca de 2 por cento, esta deverá acelerar para 5-6 por cento “nos próximos meses devido à recente depreciação do Metical e aos necessários ajustes nos preços administrados”.
“Preços administrados” aqui devem ser entendidos como sendo preços controlados pelo governo em sectores chave tais como combustíveis, energia, transportes e bens alimentares básicos. Por outras palavras, o FMI prevê, em função dos entendimentos alcançados com o governo, que os preços destes bens deverão ser objecto de um ajustamento.
Seria bom se este ajustamento fosse no sentido de redução dos preços. Mas na realidade, quando se fala de ajuste, o entendimento é que dentro das próximas semanas começará a notar-se uma tendência progressiva dos preços, com o efeito de tal vir a corroer ainda mais os já pobres rendimentos da maioria dos cidadãos.
O FMI considera que os desafios económicos de Moçambique a curto prazo “tornaram-se mais complexos”, uma vez que tal como outros países da região o país está a ser vítima de “choques externos” associados, em parte, com a baixa no preço de matérias-primas e atraso nos investimentos relacionados com grandes projectos de exploração de recursos naturais, nomeadamente gás e carvão.
Nota ainda que as importações continuam a crescer, embora as exportações tenham estagnado. Isto, associado a um substancial declínio no fluxo de capitais para o país, tem resultado numa pressão sobre o mercado cambial, conduzindo a uma acentuada desvalorização do Metical.
Geralmente, o FMI evita debruçar-se sobre questões políticas e de governação interna nos países onde intervém. Mas a actual crise económica em Moçambique não é apenas uma questão técnica.
Ela resulta em parte de decisões políticas com fortes implicações no desempenho da economia.
Temos de nos lembrar, por exemplo, que uma decisão política, resultante das negociações entre o governo e a Renamo, determinou uma composição partidarizada dos órgãos de administração eleitoral, de cujas implicações o Tesouro hoje se ressente.
O galopante endividamento a que o país se sujeitou nos últimos anos, mesmo que em alguns casos se destinasse à edificação de infra-estruturas económicas importantes para o desenvolvimento, não pode estar dissociado da crise que actualmente nos abala. As consequências das avultadas dívidas contraídas em países como a China, algumas delas de qualidade duvidosa, estão a ter agora as suas repercussões.
Devemos estar preparados para enfrentar as consequências políticas, económicas e sociais que como resultado desta crise se avizinham.


Editorial do Savana de 06-11-2015

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