Tuesday 24 February 2009

O estranho caso Alex (2)

Vou tentar avançar um pouco mais com esta série.
Como expliquei, a alegação de que o Alex afinal não é moçambicano deixou muitas pessoas atónitas pois não havia dúvidas sobre a sua moçambicanidade. Devo acrescentar que o alegado nascimento do Alex em Angola é um dado novo.
Na altura da sua prisão, as autoridades revelaram que o Alex tinha em seu poder uma certidão de nascimento falsa que o identificava como natural de um distrito da Zambézia, e uma declaração que o autorizava a tratar de uma outra certidão de nascimento, como tendo nascido na Beira. Este pormenor é extremamente importante pois revela que o Alex queria regularizar a sua situação. A versão que eu tinha era que houve desaparecimento de documentos no seu distrito na Zambézia, possivelmente devido à guerra civil. Há lacunas que eu não consigo explicar mas que não invalidam o meu argumento de que o Alex tem direito à nacionalidade moçambicana.
Resumindo, temos então um cidadão, nascido ou não em Moçambique mas vivendo no País há meio século, filho de mãe moçambicana, considerado moçambicano e que tinha vontade de ser moçambicano.


( Continua )

11 comments:

Anonymous said...

Tenho estado a acompanhar o caso Alex, estranho não?
Os dados disponibilizados por José permitem alguma especulação, nomeadamente se o Alex não estará a ser vítima de eventuais posições politicas que desagradaram ao Poder ou aos poderzinhos. Mas sem outros elementos é arriscado avançar com mais especulações.
Espero que incida mais luz sobre
este caso e o melhor, talvez, é que esta história tivesse um final feliz.
Abraço
Agry

Anonymous said...

Porque nao se regulariza a situacao do Alex atribuindo-se-lhe a residencia permanente? Se ele quer casar com a mulher que ha pouco deu a luz um filho seu, especialmente sendo ela natural de Mocambique, porque nao e possivel? Ele quer naturalizar-se Mocambicano, como a sua Mae e Mocambicana, porque lhe e recusado este direito? Ve-se em Mocambique muita gente com a nacionalidade Mocambicana que mal consegue articular umas palavritas em Portugues, outros porque sao casados com Mocambicanos, outros porque tem bons padrinhos, outros porque fazem movimentar dinheiro por debaixo da mesa, etc. Porque nao se abrir uma excepcao a este caso? O Alex serviu para muita coisa, ate foi alfabetizador... Penso que o Alex e uma ameaca a Frelimo e a Renamo; ele e assessor de D. Simango, e participou activamente na sua campanha. Este caso tornou-se uma questao de 'humanismo'. Vamos ver o desfecho deste caso com muita atencao. O que lhe estao a fazer e uma grande injustica. Gostaria que a Liga dos Direitos Humanos se envolvesse no caso do Alex. Maria Helena

Júlio Mutisse said...
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Júlio Mutisse said...

Anonymous, concordo consigo que os dados que o José nos faculta neste momento só nos permitem especular. Já fiz isso no primeiro post.

Mas daí até ao facilitismo e simplismo de acusar o poder e os poderzinhos vai uma pequena distância. Aliás acho que ir por essa via é recusar pensar no que pode estar por detrás disto tudo, recusando dessa forma ajudar o Alex.

Meu caro, repito o que disse noutro comentário, nem a nacionalidade nem a residência permanente se dão oficiosamente; são requeridos.

Sabemos, agora, que o Alex tinha mãe moçambicana. A Constituição da República, a chamada Lei fundamental, é clara sobre estas situações; nos termos do nº3 do art. 24 da CRM, são moçambicanos os filhos de pai ou mãe de nacionalidade moçambicana ainda que nascidos em território estrangeiro, desde que expressamente sublinho expressamente), sendo maiores de dezoito anos de idade, ou pelos seus representantes legais, se forem menores daquela idade, declararem que pretendem ser moçambicanos. Qual é a situação do Alex? Declarou expressamente e pelas vias legais querer ser moçambicano?

A situação descrita no nº 2 do mesmo artigo, nos termos do qual são moçambicanos, ainda que nascidos em território estrangeiro, os filhos de pai ou mãe moçambicanos ao serviço do Estado fora do país, me parece, não se aplica ao Alex.

Pelo casamento, o Alex só podia adquirir a nacionalidade moçambicana depois de 5 anos após contrair casamento com a moçambicana desde que, cumulativamente:
a) declarasse querer adquirir a nacionalidade moçambicana;
b) preenchesse os requisitos e ofereça as garantias fixadas por lei.

Portanto, mesmo aqui, tudo dependia dele pedir. Pediu? Não sabemos. Aliás, do relato do José, fico com a impressão de que o Alex, se de facto nasceu em Angola, tentou outras vias para regularizar a sua situação; vias que por sinal não são as referidas legalmente e citadas acima, se não como explicar a situação das certidões?

Anonymous, é extremamente perigoso e sinuouso o caminho de empurar tudo para culpar o poder ou os poderzinhos.

Há um princípio legal que diz que a lei não deixa de produzir os seus efeitos pelo facto de, aquele a quem tais efeitos se produzem em determinado momento, não a conhecer. Costumo pensar que assumir isto absolutamente num país como o nosso com quase metade da população analfabeta é perigoso, principalmente se nos lembrarmos do Dura Lex... mas, pelos relatos aqui, o Alex não se incluia nesta faxa populacional para quem o absolutismo daquele princípio é perigoso.

Temos que nos indagar sobre o que fez o Alex. Pediu a nacionalidade? Foi lhe recusada? Com que fundamento? Para que efeitos tinha ele uma certidão de nascimento moçambicana se não é moçambicano? Não será por essas e outras que se lhe aplicaram as leis em vigor em Moçambique determinado a sua expulsão do país?

Antes de ir ao poder e ao poderzinho, tentemos perceber o que é que o Alex fez ou não fez. ME parece que tendo tudo para pedir o Alex foi se deixando ficar até ser encontrado em falta.

Remeto ao meu primeiro ccomentário, em termos humanos é triste; mas em termos legais... mais, porque a lei de nacionalidade dá muitas possibilidades...

José, sugestão: tentemos determinar com certeza, onde nasceu o alex, o que determinou a sua expulsão para Portugal e não Angola ou outro lugar (lembremos que, mesmo sendo criminosos, moçambicanos não são extraditados), e muitas outras coisas que nos ajudem a ajudá-lo.

Anonymous said...

Muthisse, já nos temos cruzado na blogosfera mas, desta vez, surpreendeu-me pela agressividade!
Quase me atrevia a afirmar que aguardava um pretexto para me crucificar!
Quando afirmei estar a acompanhar o caso Alex, referia-me exclusivamente às postagens do José. Não li mais uma linha para além destas.
Experimentei ,é certo, uma certa predisposição em aceitar os seus argumentos(do José), porque o tenho na conta de uma pessoa séria e incapaz, de sensasionalismos e especulações gratuitas. Por isso, e como deve ter lido, tive o cuidado, e a honestidade, de referir que sem outros elementos é arriscado avançar com mais especulações.
Depois há outro comentário de Anonymous. Será que me atribui a subscrição de ambos?
AGRY

Anonymous said...

Acabo de ler, só agora, os comentários à primeira parte deste caso. Nele confirmei, sobretudo, o quão solidário é o amigo José.
Abraço

JOSÉ said...

Amigo Agry, os dados que disponibilizei na verdade são insuficientes mas já permitem formar uma opinião, o Agry não teve dificuldade em chegar à conclusão certa. Analisou bem, caro amigo, não se trata de especulação nenhuma!
Gostei de o ver por aqui!
Abraço forte!
José

JOSÉ said...

Maria Helena, a resposta honesta às suas pertinentes questões traria indubitavelmente a solução para este triste caso. A sua análise é perfeita, nós estamos bem atentos.

JOSÉ said...

Júlio, concordo que os dados que disponibilizei são escassos mas são já suficientes para se formar uma opinião. Essa falta de informação também tem a ver com a atitude das autoridades a quem não interessa divulgar toda a verdade. O Alex foi preso por duas vezes, durante vários meses, tempo suficiente para se fazer uma investigação completa que não deixe dúvidas.

O que me preocupa não são os dados que faltam mas sim os que temos em nosso poder.

Ao contrário do que o Júlio afirma, não é fácil obter a nacionalidade ou residencia permanente, estou perfeitamente à vontade para fazer esta afirmação.

Júlio, o no. 2 do art. 24 da CRM, referido por si, deixou-me confuso, a alínea b) revela que 5 anos após o casamento não é suficiente declarar que quer adquirir a nacionalidade mas tem de preencher os requesitos e oferecer as garantias fixadas por lei. Complicado, não é? Será que está aqui um entrave?

A realidade é que se o Alex foi apanhado com documentos falsos, só revela que ele estava disposto a tudo para obter a nacionalidade moçambicana. Ninguém arranja documentos falsos se eles podem ser obtidos de forma legal e fácil, não acha?

Não tenho a certeza se a história dos documentos falsos é mesmo verdadeira, ao princípio também foi dito que o passaporte e visto do Alex eram falsos, posso garantir com segurança que isso é mentira.

Eu já afirmei várias vezes que as leis que regem a nacionalidade e permanencia dos estrangeiros são injustas e sujeitas a abusos e má aplicação.

Penso que deixa de ser assim tão importante saber onde nasceu o Alex, o que salta à vista é que ele tem direito a cidadania, ele quer ser moçambicano e que esse desejo lhe tem sido negado. Ele foi expulso para Portugal porque tem documentos legais portugueses, uma vez que não tem documentos moçambicanos. Portugal aceita a dupla nacionalidade. Ja agora, tenho curiosidade em saber quantos mocambicanos oussuem tambem outro passaporte.

Quer mesmo saber porque o Alex foi expulso? As autoridades dizem que estava ilegalmente em Moçambique, mas todos os que acompanham este caso desconfiam que este tratamento extraordinário e severo se deve ao activismo e ligações políticas do Alex.

Júlio, todos desejamos um final feliz para este caso, mas para isso não nos podemos restringir ao lado jurídico, é necessário que se dê atenção às vertentes humanas e políticas deste caso.

Júlio Mutisse said...

Agry,

Desculpe-me. Não quis ser agressivo consigo. É a minha forma de me expressar, esforço-me por ser compreendido e, não poucas vezes, cruzo-me com esse rótulo de agressivo (quase ao estilo do Bruno Alves do Porto). Mas sou sempre leal.

Desculpe-me também pelo lapso de lhe atribuir o 2º comentário.

O que é que está em jogo aqui? É um cidadão estrangeiro, em Moçambique há vários anos, que decide ser Moçambicano e que no decurso do processo é, por causas ainda não conhecidas, expulso do país. Isto é o que percebi do que o José nos relatou aqui.

Tenho tentado fazer passar a ideia legal de que, não bastam muitos anos em moçambique, nem o casamento, nem outra série de coisas para se ser moçambicano, se o indivíduo em causa não REQUERER a nacionalidade, dentro do esquema legalmente estabelecido (por mais dura que seja a lei, é a lei, quando as normas são inflexíveis o que devemos fazer não é contorná-las em esquemas, é influenciar a sua mudança).

Portanto, se não sabemos se o Alex requereu ou não a nacionalidade, torna-se leviano culpabilizar outros pela sua eventual expulsão por ter sido encontrado em situação irregular enquanto estrangeiro.

A questão da nacionalidade é extremamente sensível. Há pouco no blog da Ivone discutia-se e condenavam-se determinadas fragilidades de um sistema de recenseamento que poderia dar azo a naturalização ilegal de estrangeiros. Este debate foi levantado, creio, por se reconhecer a necessidade de um sistema rigoroso de controlo daqueles a quem se atribui a nacionalidade.

O Alex estava a muito tempo aqui? Sim, e esse é um dos factores a ter em conta no seu pedido, tinha mãe moçambicana, o que o qualifica para sê-lo, queria ser moçambicano; essa vontade tinha que ser manifestada nas estruturas certas dentro do esquema rígido de que o José fala e com o qual (o sistema) estou completamente de acordo. O processo de aquisição de nacionalidade noutros cantos do mundo é também bem complexo.

José,

Acho que é evidente que o processo de aquisição de nacionalidade não é tão fácil como o da constituição de empresas que tende a ser AINDA mais fácil (só para citar um exemplo). Acho que esse processo (aquisição de nacionalidade) deve ser minunciosamente analisado e os qualificadores ponderados para que se possa atribuir a alguém a nacionalidade deste Estado com todas as garantias legalmente estabelecidas.

Por imperativos profissionais, trabalho com processos de requisição de residência permanente. Mais uma vez, este é um processo no qual o Estado tem que se salvaguardar ao máximo. Só para lhe dar um exemplo, o Estado precisa saber de que é que vai viver esse estrangeiro a quem damos residência permanente. Me parece óbvio. Se nós moçambicanos já somos pobres, temos problemas de desemprego com todas as suas consequências conhecidas e desconhecidas, porque escancararrar as portas a mais alguém que só vai ajudar a piorar as coisas? Essa é, no meu entender, a razão porque esses processos tem muitos ingredientes. É claro que há problemas procidimentais e alguma morosidade nos serviços de migração, mas no geral os requisitos são rígidos e, mais uma vez, concordo com a sua rigidesz.

Parece-me que, neste caso, o meu amigo tolera de alguma forma a falsificação de documentos e, por ventura, o seu uso. o que é crime punível por Lei. Não posso ter outra leitura tendo em conta o que seguinte trecho da sua resposta a mim: "A realidade é que se o Alex foi apanhado com documentos falsos, só revela que ele estava disposto a tudo para obter a nacionalidade moçambicana. Ninguém arranja documentos falsos se eles podem ser obtidos de forma legal e fácil, não acha?"

Parece legitimar a ideia de que os meios justificam os fins tantas vezes condenada por ai. E respondendo José, pode ser que alguém arange documentos falsos por achar que nos qualificadores para atingir determinado desiderato lhe falta alguma coisa, um requisito. Há vários motivos que fazem as pessoas optarem pelas falsidades para além dos que podemos imaginar. Eu poderia devolveria a questão que colocas na parte citada lhe perguntando porque é que muita gente falsifica certificados de habilitações se os podem obter legalmente? Satisfazia te a ideia de agirem assim pela necessidade de aranjar um emprego ou entrar para uma universidade?

A mim não. Como não me satisfaz e me repugna a eventualidade de o Alex ter, por hipótese, falsificado documentos.

Acho para mim, independentemente do que as autoridades digam (até podem mentir) é importante saber os passos dados pelo Alex para ter o que ele queria. É que só desse modo saberemos se ele agiu legalmente e se alguém, eventualmente, mesmo presentes todos os requisitos para decidir, abusou do seu poder. Só assim poderemos ter dados para pressionar as auttoridades a corrigirem o eventual erro que possam ter cometido.

JOSÉ said...

Júlio, é claro que não posso tolerar a falsificação de documentos, mas a sua comparação com o certificado de habilitações, é, neste caso, infeliz. Quem forja ou compra um certificado de habilitações é porque não se quer dar ao trabalho de estudar, apenas tem de escolher entre estudar ou comprar as habilitações. O meu ponto é que neste caso, se o processo é simples para obter documentos por vias legais, não consigo entender como alguém pode optar por comprar uma certidão.
O Júlio acredita que a burocracia e o sistema judicial em Moçambique funcionam bem, infelizmente nem sempre é assim e também sabemos que há ma aplicacao na concessão de nacionalidades e residencias.
Como afirmei, não tenho a certeza se essa história dos documentos falsos é mesmo verdadeira.
O que está em causa é que nós temos visões diferentes do problema: o Júlio garante que o Alex é estrangeiro, não quis ser moçambicano, foi apanhado na ilegalidade e tem de sofrer as consequencias.Tudo muito simples e bem explicado, dura lex sed lex, nada mais. Em contrapartida, eu, tendo acompanhado de perto este caso, penso que o Alex tem direito a ser moçambicano , há pormenores muito estranhos neste caso e há uma vertente política. A minha opinião é partilhada pelos que acompanham atentamente este caso e conhecem o Alex.