Sunday 19 December 2010

Residindo ilegalmente em Portugal: “Sopa dos pobres” alimenta moçambicanos


...E ASSIM vai a vida de muitos moçambicanos residindo ilegalmente em Portugal. A “sopa dos pobres” é a base da sua sobrevivência. Ela é servida pela Sociedade Beneficiente em Lisboa e se destina a pessoas carentes. Achando-se nesta condição basta dirigir-se ao refeitório criado especialmente para o efeito “desenrascar” um prato e sentar-se à mesa que, instantes depois, ser-lhe-á servido o alimento. E não são poucos os nossos compatriotas que assim vivem nas terras lusas. Não há, por assim dizer, um cadastro de beneficiários deste alimento. Mas vistos a olho nu se afere que são muitos, mas muitos mesmo, os moçambicanos que assim passam o seu dia a dia em Portugal. A Casa de Moçambique em Lisboa está atenta aos acontecimentos e, ao que apurámos recentemente, se desdobra em esforços visando apoiar os seus concidadãos. Um dos caminhos encontrados para o efeito é a legalização da sua permanência em Portugal para, por esta via, procurarem emprego formal.
A sua distribuição começa as 11 horas, prolongando-se até ao meio-dia, de segunda a sexta-feira. O cardápio, variado, é supervisionado por um nutricionista podendo, o prato, ser repetido tantas quantas e vezes o beneficiário o desejar. A acompanhar a “sopa do pobre” são igualmente servidas algumas fatias de pão, alimento que pode ser levado para a casa.
Alguns moçambicanos reconhecem que não fosse esta sopa estariam a passar por momentos extremamente difíceis.
“Aqui a vida é muito dura demais, sobretudo para quem não tem um emprego seguro. Esta sopa, na verdade, surge como uma dádiva e bênção de Deus. É que depois de a tomar torna-se fácil vegetar pela cidade a procura de emprego ou de qualquer ocupação”, disse um moçambicano, aparentemente 40 anos de idade, interpelado pela nossa reportagem naquela em Lisboa. Ele está em Lisboa há sensivelmente seis anos.
O interlocutor explicou que recorre a “sopa dos pobres” sempre que se encontra numa situação de desemprego, logo, sem nada para comer.
“Trabalho nas obras de construção civil. Mas há vezes em que fico desempregado. Ai perco o salário e fico sem nada para comer”, referiu a fonte.
Entretanto, a Casa de Moçambique, uma organização com sede em Lisboa, criada com o propósito de defender os interesses dos moçambicanos residentes em Portugal, reconhece a dura realidade em que vivem alguns moçambicanos e por isso chama a atenção, sobretudo aos jovens, para pensarem seriamente antes de tomarem a decisão de aventurar.
Segundo o presidente daquele organismo, Enoque João, uma das missões desta instituição é providenciar ajuda àqueles concidadãos que passam por dificuldades, sobretudo na questão da tramitação dos documentos para a legalização da sua permanência naquele pai. Aliás, esta é a condição sem a qual não é possível ter emprego formal. A seguir vem outros direitos.
Enoque João disse que ainda existem moçambicanos ilegais em Portugal que, por temerem o repatriamento compulsivo, não ousam se aproximar à Casa de Moçambique ou simplesmente à embaixada moçambicana.
As estimativas dão conta de que pelo menos seis mil compatriotas estão registados no Alto-Comissariado de Moçambique em Portugal dos quais pouco mais de três mil são membros da Casa de Moçambique.
O nosso interlocutor salientou que a falta de emprego constitui um dos principais constrangimentos para muitos moçambicanos em Portugal, encontrando como salvação as obras de construção civil, serviços de hotelaria e turismo e o emprego doméstico.
“É normal encontrar pessoas formadas a trabalharem nas obras ou em restaurantes como pessoal serventuário. Alguns são “barmans”. É que o enquadramento no mercado de emprego em Lisboa é uma autêntica dor de cabeça, incluindo para os nativos”, disse.
A Casa de Moçambique é uma instituição sem fins lucrativos e, em reconhecimento do seu trabalho, tem assento no ACIDI, um organismo que pertence à Presidência do Conselho de Ministros português, desde 2007.
Enoque João explicou que a instituição que dirige tem estado a realizar actividades de apoio social à comunidade, para além de outros trabalhos de sensibilização aos compatriotas para não aderirem a má conduta.
“A comunicação social portuguesa tem atribuído às comunidades estrangeiras, incluindo a moçambicana, a culpa pelos assaltos que tem acontecido nas principais cidades do país, cabendo a nós a tarefa de lhes tranquilizar e não só, também de mostrar os perigos que correm ao abraçarem condutas duvidosas”, salientou.
A Casa de Moçambique, segundo o seu presidente, realiza anualmente um convívio de confraternização e troca de experiência, no qual os dirigentes da agremiação aproveitam a oportunidade para passar mensagens de cidadania.
O intercâmbio com Moçambique é outra actividade realizada por este organismo, através de angariação de apoios e de estágios para o país. A título de exemplo, um clube de futebol da cidade de Xai-Xai em Gaza, está a receber algum equipamento providenciado pela Casa de Moçambique.
Em Novembro deste ano, o presidente da Casa de Moçambique assinou em Maputo um acordo de colaboração com o Ministério do Turismo para as áreas de hotelaria e turismo, que consistirá no envio de jovens para estágios no Hotel Marriott, na capital portuguesa.
No âmbito do acordo, partem em Janeiro próximo ano, vinte jovens moçambicanos, entre os quais 14 mulheres para o estágio, que vão substituir outros sete que se encontram a finalizar o estágio no mesmo hotel, desde o mês de Junho passado.
Segundo Enoque João, este acordo vai proporcionar o desenvolvimento da indústria hoteleira e a divulgação da imagem de Moçambique em Portugal.

NOVA LEI DE IMIGRAÇÃO FAVORÁVEL AOS ESTRANGEIROS

ELIAS Sebastião Mauai é jurista, membro e vice-presidente da Casa de Moçambique que reconheceu a existência de moçambicanos ilegais naquele país, muitos deles com passaportes caducados.
“Procuramos uma aproximação com estas pessoas, incluindo a prestação de alguns apoios no que respeita a legalização da sua permanência”, disse.
Segundo Mauai a nova Lei de Imigração em Portugal (Lei nº 23/2007 de 4 de Julho e do Decreto Regulamentar nº 84/2007 de 5 de Novembro) traz algumas inovações que vem simplificando a vida do emigrante.
O importante nesta Lei, que estabelece o Regime Jurídico de entrada, permanência e saída de estrangeiros em território português, é que abre a possibilidade, a título excepcional, de ser concedida uma autorização de residência para fins de trabalho a estrangeiros que comprovem ter entrado e permanecido regularmente em Portugal; que tenham um contrato de trabalho ou uma relação laboral comprovada por sindicato, por associação com assento no Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração (COCAI), e que possuam a situação regularizada perante a Segurança Social.
Tal excepcionalidade também vem favorecer o trabalhador independente, profissional liberal e o empresário, através do artigo 89 da referida lei, assim como o estudante do Ensino Superior, sustentado pelo artigo 91 da mesma norma legal.
Infelizmente, explica Mauai, por falta de informação, ou pelo simples facto do imigrante já estar condicionado a ter sempre uma legalização extraordinária, torna-se fundamental esclarecer que, existem sim oportunidades de regularização de estrangeiros de países terceiros que estejam ilegais em Portugal.
Sem citar nomes a fonte explicou que a Casa de Moçambique já ajudou muitos moçambicanos a legalizar a sua estadia em Portugal, ao abrigo desta Lei.
“Portanto estamos abertos; o que não conseguimos é a transladação de cadáveres porque a instituição não tem verbas para esses fins”, disse.
Para Mauai esta Lei está a trazer melhorias na vida de muitos moçambicanos, embora reconheça haver necessidade dela ser muito mais divulgada.
Disse que uma das questões que já está a melhorar está relacionada com os contratos de trabalho, uma vez que antes desta lei muitos empregadores não pagavam o subsídio de férias, de natal e horas extras, aproveitando-se da sua condição de imigrante dos seus empregados.
“Mas também temos alguns moçambicanos já em idade avançada que não vão ou não se beneficiam da reforma porque durante anos estiveram a trabalhar usando a documentação de um outro indivíduo, exactamente porque a lei não facilitava a vida do emigrante”.
Esta situação torna a vida destes concidadãos muito mais difícil, porque mesmo para quem recebe salário mínimo estipulado em 475 euros (20 a 22 mil meticais) e pagar a renda de casa que anda por volta de 15 euros, não consegue fazer nada.

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