Os deputados moçambicanos, eleitos para representar o povo no
Parlamento, defender os seus interesses e lutar pelo seu bem-estar, continuam a ir contra estes desideratos e pautam pelo despesismo de ano para ano. Em 2015, a Assembleia da República (AR) vai funcionar com 1.286.717.186,29 meticais. Porém, só a despesa com o pessoal vai absorver 694.845,81 mil meticais, um valor acima dos 225.609,45 mil meticais e 357.341,28 mil meticais destinados aos funcionários da Educação e da Saúde, respectivamente.
Por outras palavras, longe de desprezarmos o trabalho feito pelos nossos parlamentares em prol de quem os elegeu, o que eles vão “gastar” com as despesas de pessoal é mais que o triplo do que precisam, talvez, os 150 mil empregados da Educação e é pouco mais que o dobro do que foi alocado para tantos outros milhares de profissionais de saúde.
Assim, o Estado moçambicano dá azo para que não se tenha dúvidas de que privilegia os deputados e o outro pessoal burocrata da chamada “Casa do Povo”, em “prejuízo” dos docentes e funcionários da Saúde, pese embora, o Governo e a sociedade exijam, recorrentemente, brio profissional, melhor desempenho, maior eficácia e um bom atendimento a estes quadros, bem como a diferentes especialidades da Polícia, em particular a da Investigação Criminal, que labutam em situações adversas, chegando a faltar-lhes uniforme com qualidade e decente, meios circulantes, giz e até luvas médicas.
O povo ainda recorda, com muita tristeza, da greve generalizada dos médicos, enfermeiros, serventes e outros profissionais de saúde moçambicanos, em 2013, a qual durou quase um mês, e que a classe clama pela melhoria das condições de trabalho, mormente por aumento salarial correspondente 100% do seu salário base. Este assunto, não teve um desfecho satisfatório e alguém sentou sobre o mesmo. Os pedagogos também, com milhões de meticais de horas extras acumuladas e de que não beneficiam há anos também tentaram boicotar as aulas devido ao mesmo problema.
O Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar – a agricultura é a base do desenvolvimento nacional, segundo a nossa Constituição mas a realidade prova o contrário – também surge com 108.772,45 mil meticais destinados às despesas com o pessoal, um montante também muito abaixo em relação ao alocado à AR.
Todavia, o Ministério do Interior (MINT) é um dos poucos sectores que, segundo a proposta do Orçamento do Estado para 2015, vai encaixar alguma coisa como 5.645.649,04 mil meticais.
Numa altura em que o crime organizado e demais malefícios sociais tomam conta da sociedade, deixando a tudo e todos aprovados e inseguros, talvez seja para estimular a corporação a combater esta baixaria. O despesismo da AR não para por ai. A construção da residência oficial do presidente daquele órgão legislativo e que fiscaliza as acções do Executivo vai custar 90.142.355 meticais, um valor oito vezes mais que os 10 milhões destinados à edificação da cidadela parlamentar.
O Ministério da Justiça e Assuntos Constitucionais e Religiosos, outro sector chave para o acesso à justiça de que milhares de moçambicanos clamam e com sinais de definhamento, também vai continuar a minguar, pois as despesas com o pessoal (79.889,88 mil meticais) não chegam, nem de longe, aos 694.845,81 mil meticais da AR. Os bens e serviços estão orçados em 41.777,45 para o período em alusão.
As cadeias, que, apesar de alguma melhoria, ainda são consideradas locais que não permitem a regeneração dos detidos, terão igualmente poucos recursos para o pessoal assim como para satisfazer as necessidades de bens e serviços. Cite-se, como exemplo, a Cadeia de Máxima Segurança, vulgo BO, um local cuja celas são repulsivas, que apenas terá 85.987.21 mil meticais para despesas com o pessoal e 56.359.42 para bens e serviços.
O orçamento da “Casa do Povo” aprovado na quinta- -feira (23), com o voto da Frelimo, bancada maioritária, prevê ainda gastos com senhas de combustível no valor de 18 milhões de meticais, para além de outras despesas que com um pouco de austeridade podiam reduzir.
A Renamo e o MDM abstiveram-se, pese embora também vão se beneficiar destas e outras “regalias”. A oposição não vê o orçamento do Parlamento com bons olhos porque na sua opinião não tem sido aplicado de forma sustentável. Os subsídios de renda de casa, água, luz e empregados vão consumir 69.070.220 meticais em 2015.
A Renamo, por exemplo, alega que as instalações da AR se transformaram num cemitério de viaturas que já não circulam, algumas das quais foram adquiridas há pouco tempo. Aliás, no ano passado, uma avaliação independente recentemente realizada pela Comissão Europeia, juntamente com Irlanda, Alemanha, Bélgica, Itália, Finlândia, Países Baixos e França, que fazem parte do grupo de doadores externos maiores financiadores do Orçamento do Estado (G-19), indicou que o desempenho da AR e do Tribunal Administrativo (TA) foi menor nos últimos oito anos, apesar de os funcionários daquelas duas instituições terem beneficiado de capacitação técnico-profissional e apoio financeiro para melhorar a sua eficiência.
A mesma pesquisa deu a conhecer que “o Parlamento moçambicano continua a disponibilizar pouco tempo a matérias relevantes para melhoria das condições de vida da população moçambicana”.
Sobre este aspecto, há anotar que, em 2015, a “Casa do Povo” vai despender 22.500.000 meticais com ajudas de custo fora de Moçambique e 24.600.000 meticais dentro do país, actividades que juntas têm quase o mesmo custo (47.000.000 meticais) que as comissões de trabalho vão aplicar nas suas acções em prol dos seus representantes.
No que respeita especificamente à sua comissão especializada do Plano e Orçamento, a análise do G-19 concluiu que ela continua a dispor de “uma modesta capacidade” de realização do trabalho e a “usar padrões muito baixos” não devidamente especificados.
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