Emissão de gases sem tratamento
Moçambique sem equipamento para monitorar os níveis de concentração de gases na atmosfera
Diferentes organizações da sociedade civil, nomeadamente a Livaningo, o Centro Terra Viva, a Liga dos Direitos Humanos, a Justiça Ambiental e a Kulima colocaram desde sábado último mais de trinta activistas nos principais pontos de concentração das cidades da Matola e Maputo para a recolha de pelo menos 15 mil assinaturas para uma petição à Assembleia da República contra a decisão de autorizar a MOZAL a emitir gases directamente para a atmosfera sem qualquer tratamento anti-poluição durante seis meses.
Desde que o governo moçambicano, através do Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental (MICOA), autorizou a multinacional de alumínio a trabalhar em escape directo “bypass”, ambientalistas insurgiram-se contra esta decisão. Alegam que os gases a serem emitidos são um verdadeiro atentado à saúde pública, podendo provocar irritação nos olhos, na pele, problemas cardiovasculares e cancros.
Contrariamente a esta posição, o MICOA alega que estudos feitos pela Universidade Eduardo Mondlane apontam que estas substâncias (Fluoreto de Hidrogénio, Dióxido de Enxofre, Dióxido de Azoto e Ozono) não têm impacto significativo na saúde pública, pelo que não encontra motivos para impedir que a Mozal opere sem tratar os gases durante o período de reparação dos seus centros de tratamento de gases e fumos.
Contudo, as organizações que se opõem à decisão do governo notam que se na óptica do governo não existe nenhum perigo, qual seria a necessidade da MOZA gastar 10 milhões de dólares para substituir os actuais filtros.
“Porque é que os filtros estão lá?” indagam.
Para o líder da Livaningo, António Reina, “se vão substituir os filtros é porque não podem trabalhar sem eles. Isso significa que a operarem sem os filtros, durante seis meses, vai haver danos…é perigoso! As substâncias que vão sair por aquelas chaminés são coisas que assustam qualquer um”.
Nos finais dos anos 90, a Livaningo fez parte de um grupo de organizações de defesa do meio ambiente que exerceram pressão, obrigando o governo a abandonar o seu plano para a incineração de elevadas quantidades de pesticidas na fábrica de cimento da Matola.
Equipamento para medir o nível de concentração de gases
Ambientalistas têm reservas quanto à fiabilidade do estudo feito pela UEM, pois ao que tudo indica, Moçambique não tem os dados referentes ao nível de concentração dos gases a serem emitidos. Isto deve-se à falta de equipamento para monitorar o nível de concentração dos gases, embora haja competência humana para tal.
“O impacto do trabalho da Mozal vai depender do nível de concentração desses gases”, disse um Engenheiro Físico ligado à Universidade Eduardo Mondlane.
Falando na condição de anonimato, o referido Engenheiro fez notar que actualmente Moçambique não possui o equipamento necessário para medir a concentração desses gases, o que não permite avaliar o impacto da decisão do governo.
“Não podemos dizer se a empresa vai poluir ou não porque não temos equipamento para avaliar a qualidade do ar, de modo a confrontar com os dados da Mozal. A UEM tem capacidade e equipamento para monitorar apenas o nível de partículas, mas não de gases na atmosfera ”, disse.
Rosa Cesaltina Benedito, Directora Nacional de Avaliação do Impacto Ambiental do MICOA, não quis comentar em relação a este ponto. Alegou que “os estudos apontados não são conclusivos e ainda estão em curso. Enquanto os trabalhos estiverem a decorrer, nós vamos acompanhar e monitorar para garantir que a população não fique prejudicada”.
Raio de emissão pode atingir África do Sul
Outra questão levantada tem a ver com o raio que os tais gases e partículas poderão atingir. Dados em nosso poder indicam que o raio de alcance das substâncias a serem libertadas pela Mozal é de 40 a 100 quilómetros, a partir da fábrica. Isto significa que parte da província de Maputo e a cidade capital serão atingidas, incluindo algumas áreas da África do Sul e da Suazilândia. Isto é, as zonas potencialmente afectadas pelos gases Fluoreto de Hidrogénio, Dióxido de Enxofre e Dióxido de Azoto limitam-se a um raio máximo de cerca de 40 quilómetros do recinto da Mozal, enquanto que o Ozono e outras partículas em suspensão de diâmetro inferior a 10 micrómetros (milésima parte do milímetro) podem atingir um raio de 100 quilómetros.
Confrontada com estes dados, Benedito disse: “não quero cair no erro, de momento não tenho esse dado, mas consta no relatório do estudo”.
A sociedade civil exige que o governo diga as reais motivações que o levaram a tomar esta posição. Instam também o governo a realizar um estudo independente, e não depender das auditorias ambientais que lhe são fornecidas regularmente pela MOZAL.
Contorno das negociações
A Mozal apresentou em Novembro último a sua preocupação em reparar os centros de tratamento de fumos e gases “com urgência” de modo que as emissões ambientais da empresa cumpram os padrões exigidos por lei.
Assim, o governo criou uma equipa multi- sectorial que inclui representantes do MICOA, dos Ministérios da Saúde, Indústria e Comércio, do Trabalho, Planificação e Desenvolvimento, Energia, Finanças, governo distrital da Matola e UEM para analisar a matéria.
Dos vários encontros realizados, o executivo apresentou à MOZAL três propostas de solução, nomeadamente a paragem das actividades durante o período de reparação dos centros, o uso do sistema “bypass” e o aumento da temperatura dos ânodos.
Para a MOZAL, o viável foi optar pelo sistema “bypass”, mas para tal deveria realizar o estudo de impacto ambiental.
“Quando a Mozal apresentou o seu estudo, a UEM, através do Departamento de Física, fez um estudo paralelo de 5 de Abril a 26 de Maio para analisar os possíveis impactos ambientais e danos à saúde pública. Chegou-se à conclusão de que não haverá dano nenhum à saúde da população, pelo que não vejo motivo de alarme”, entende Benedito.
Para além de apresentar o estudo de impacto ambiental, a Mozal foi obrigada a comunicar à população bem como a apresentar um plano de gestão ambiental incluindo o de contingência.
Depois de cumpridas todas as obrigações e requisitos, o governo autorizou a Mozal a desenvolver as suas actividades em sistema bypass.
Actualmente, a Mozal está no processo de aquisição de equipamento para iniciar com as suas actividades e “vai procurar fazer o seu trabalho em espaço curto”, refere Benedito.
Reacção da Mozal
Os procedimentos burocráticos da MOZAL nas suas relações com a imprensa não permitiram que o SAVANA ouvisse o posicionamento daquela empresa sobre a matéria. Primeiro é preciso enviar uma carta de pedido de audiência, seguida posteriormente do envio das questões para uma entrevista.
PROTESTOS CONTRA POLUIÇÃO
Protestos contra fábricas cujas actividades poluem a atmosfera acontecem em quase todo o mundo, sobretudo na Europa, onde a poluição do ar mata mais de duas mil pessoas por ano.
Um dos casos que também levantou polémica, registou-se em Abril de 2004 quando a smelter de Hillside, uma fábrica produtora de alumínio, foi autorizada a operar durante 72 horas em bypass, na sequência de um incêndio que causou danos ao Centro de Tratamento de Fumos.
Situada em Richards Bay, África do Sul, durante os três dias, a fábrica descarregou para o ar vários gases que colocaram em risco a saúde pública, apesar de se ter advertido a população a usar máscaras e/ou permanecer dentro de casa para o caso de asmáticos.
Em 2008, a população da Islândia, realizou, pela primeira vez, manifestações contra a decisão governamental, em protesto da instalação de uma fábrica da Alcoa, maior produtora de alumínio, com diversas fábricas espalhadas no mundo.
Fonts: www. iceland-views.blogs.sapo.pt/4127.html ; www. zapper.xitizap.com
Salane Muchanga, SAVANA, 23/07/10