Monday, 28 April 2014

Par(anormal)idade

Dissemos, na edição passada, que a exigência da paridade no contexto actual, no qual a formação política no poder, a Frelimo, assaltou o Estado e serve-se do mesmo num exercício ininterrupto de fornicação que começou em ‘75 é tudo, menos descabida. Nos últimos dias, contudo, uma corrente de opinião emerge alegando que o problema decorre de quem abandona o campo da constitucionalidade. Ou seja, defendem que reivindicar seja o que for é legítimo quando não se tira partido da violência porque, dizem, quem abraça esse caminho coloca-se fora do convívio democrático.
A ideia, quanto a nós, ignora uma perspectiva de análise. Aliás, poderia, para ter mérito, olhar por outro prisma. O que tornou possível a exigência da paridade? Essa é a questão central e de onde toda discussão em torno da legitimidade de que seja o que for deve começar. É que não se pode, de forma alguma, ignorar que o problema da Renamo é com a Frelimo. Ou seja, o problema reside na forma como a Frelimo abusa do Estado e da ausência clara e inequívoca de qualquer formação política crescer com o simulacro de democracia que nos calhou. Isto não quer dizer que a Renamo queira crescer ou apresentar-se como uma alternativa.
O que nos parece, diante do seu discurso, é que a Renamo pretende tirar igualmente partido do Estado. Contudo, os órgãos eleitorais, é claro, estão ao serviço da Frelimo e isso não vai mudar com a actual constituição do Comissão Nacional de Eleições. Aliás, os processos eleitorais em Moçambique são uma espécie de cartaz onde está escrito que todos devem vassalagem ao partido no poder.
A actuação da Polícia nestes eventos, que deviam celebrar a democracia, não passam de reminiscências de um período de orientação única. Há dias tivemos notícias das dificuldades que os notários impunham para reconhecer em assinaturas de indivíduos para a candidatura de Davis Simango. Mais um exemplo flagrante de ausência ou de democracia selectiva. O excesso de zelo dos funcionários do notário revela, na verdade, uma orientação superior de quem grita pela democracia quando meia-volta lhe dá facadas valentes.
No entanto, o que deve ficar claro neste exercício de disputa pelo monopólio da violência é que o espaço para a emergência de qualquer outra formação política, fora deste binómio, não terá possibilidade alguma de vingar. Ou seja, de controlar as forças armadas e quejandos não é feita em função de um desejo de servir da melhor forma o povo. É uma disputa para servir melhor os “donos” desses partidos.
É uma disputa por recursos. Curiosamente, uma formação política emergente como o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) não tuge nem muge. Enquanto caminha para o matadouro, alegre e sorridente, não percebe que não haverá, com paridade ou par(anormal)idade possibilidade para ela ser Governo. É que no caso de uma correlação de forças entre os dois ex-beligerantes cabe na cabeça de qualquer pessoa sensata que o MDM volte a ganhar eleições?
É melhor que a formação de Davis Simango não confunda as pequenas vitórias nas autarquias, com a ausência da Renamo, com crescimento. Quando tudo estiver claro e a Frelimo e a Renamo selaram o aperto de mãos do diabo o MDM terá de rezar para sobreviver. Não que as pessoas deixaram de votar na juventude de Davis Simango, mas é que a Frelimo e a Renamo é que controlarão os votos. Essa será, na verdade, a par(anormal)idade que nos abraçará.



Editorial, A Verdade

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