A frase é atribuída a um proeminente político moçambicano quando em 2008 era confrontado com os efeitos da crise mundial no país.
Menos de três anos passados, a crise aí está. Brutal, avassaladora e de consequências imprevisíveis.
Moçambique não sofre apenas com a importação da crise fora de portas.
A queda dos preços de matérias-primas e exportações e o aumento dos preços dos combustíveis.
Uma parte importante dos problemas que mais uma vez fazem os moçambicanos apertarem ainda mais o cinto, são endógenos, são gerados pelas políticas económicas actualmente em curso.
O aumento do preço dos combustíveis esta semana, deixando o gasóleo de fora, mostra que o governo não tem ainda uma estratégia de fundo que, por um lado enfrente a alta dos preços do petróleo e, por outro, consiga repassar internamente uma estratégia que não descambe numa espiral de subida de preços em flecha, comprando uma hecatombe social de que ninguém quer ser responsável.
O governo, tido habitualmente como bom aluno dos programas emanados de Washington, em 2009, porque tinha eleições a enfrentar, fez orelhas moucas a alguns princípios fundamentais de economia. Manteve artificialmente os preços dos combustíveis, controlou o valor do metical, mantendo a estabilidade dos produtos ao consumidor, chegando ao fim do ano com um índice de inflação “à europeia”.
Como os “falcões” queriam mesmo os dois terços do voto “à angolana”, afastaram qualquer possibilidade de conciliação quando o partido MDM foi miseravelmente impedido de concorrer em nove círculos eleitorais.
A política e a economia não tardaram em escurecer a abertura do segundo mandato do presidente Guebuza.
Os pagamentos apressados às gasolineiras secaram o pequeno mercado financeiro local. A falta de liquidez nos bancos comerciais e o que ficou convencionado como “a greve dos doadores” fizeram o resto. O açambarcamento das divisas disponíveis, apesar das sucessivas injecções de dólares pelo banco central, tornou inevitável o disparo das moedas mais importantes no mercado local. O dólar está 40% mais caro e não o há, o rand disparou 35% e tem um impacto terrível nos bens de primeira necessidade consumidos, sobretudo no sul de Moçambique. A inflação subiu dos artificiais 3,25% em 2009 para 14,5% no primeiro semestre de 2010. Este é o índice que indica claramente a perda do poder de compra dos moçambicanos nos últimos seis meses.
Uma imprensa acrítica, sempre embalada pelo discurso da auto-estima e pouco preocupada com os reais problemas do país, presta-se a um perigoso jogo de espelhos, passando para o governo e para o partido que lhe dá apoio, a percepção de que o país avança vitoriosamente nos seus grandes desafios, nomeadamente no estafado slogan da luta contra a pobreza absoluta.
O braço de ferro com os doadores - e há que se questionar se valeu a pena tamanho exercício - está a ser pago com juros enormes. Estagnaram as contribuições, aumentou o nível de pressão externa e está instalado um clima de grande suspeição e desconfiança que vai levar tempo a dissipar.
O governo, levemente retocado em Janeiro, perdeu algumas figuras de peso e os seus substitutos, não mostram o lustro dos antecessores e, mais preocupante, começa a haver a percepção pública de terem sido péssimas escolhas. Até o ministro dos Transportes, de promissora carreira no mandato anterior, se tem envolvido em enormes trapalhadas. O fiasco das mais-valias do Mundial de Futebol, as improvisações desportivas, as quedas em indicadores internacionais relevantes e até mesmo o debate irrelevante sobre uma hipotética “geração de viragem” mostram o desnorte que, aparentemente, parece ter tomado conta da direcção do país.
Mais grave que os problemas que possam ser assacados à conjuntura, na famosa reunião da Namaacha, os emissários de Washington fizeram saber ao governo que o actual modelo de crescimento económico está esgotado e não é sustentável. O país não pode viver de donativos.
O país tem que procurar investimento externo – e aí os indicadores jogam papel crucial – tem de ser mais competitivo, tem de produzir mais procurando alcançar países como o Botswana e as Maurícias, mas sobretudo não se deixando ultrapassar por economias como a Namíbia, o Malawi e a Tanzânia. Os empresários, grande parte com ligações umbilicais ao poder do dia, estão a perder o verniz para questionar abertamente a falta de transparência e o afunilamento de oportunidades reinante no ambiente de negócios. Questionam também as políticas laborais, persecutórias e fechadas ao aumento da produtividade, competição e atractivas para potenciais parceiros externos.
Apesar dos slogans e do dinheiro a fundo perdido atirado para os distritos, a agricultura e os seus rendimentos – para o campesinato e os investidores – continua a ser adiada por falta de visão, incompetência e um poderoso lobby de açambarcadores de terras que ninguém parece ter coragem de travar.
Há opções de fundo que precisam de ser tomadas se queremos afastar o espectro do país de cobradores de rendas e de espaços concessionados. É preciso produzir, deixar produzir quem sabe produzir e afastar o populismo, um vírus que perigosamente infectou o cerne das nossas estruturas vitais de decisão.
E se de facto, a tal crise desdenhosamente descontada pelo dirigente de 2008 está entre nós instalada, é preciso mais austeridade vinda de cima, menos arrogância e mais honestidade na abordagem dos problemas que são de todos. Se ainda estivermos a tempo de rumarmos todos para o mesmo lado – governantes e governados - pois o risco do país faz de conta avança inexoravelmente.
Apesar do paraíso prometido pelos vendedores de ilusões.
Menos de três anos passados, a crise aí está. Brutal, avassaladora e de consequências imprevisíveis.
Moçambique não sofre apenas com a importação da crise fora de portas.
A queda dos preços de matérias-primas e exportações e o aumento dos preços dos combustíveis.
Uma parte importante dos problemas que mais uma vez fazem os moçambicanos apertarem ainda mais o cinto, são endógenos, são gerados pelas políticas económicas actualmente em curso.
O aumento do preço dos combustíveis esta semana, deixando o gasóleo de fora, mostra que o governo não tem ainda uma estratégia de fundo que, por um lado enfrente a alta dos preços do petróleo e, por outro, consiga repassar internamente uma estratégia que não descambe numa espiral de subida de preços em flecha, comprando uma hecatombe social de que ninguém quer ser responsável.
O governo, tido habitualmente como bom aluno dos programas emanados de Washington, em 2009, porque tinha eleições a enfrentar, fez orelhas moucas a alguns princípios fundamentais de economia. Manteve artificialmente os preços dos combustíveis, controlou o valor do metical, mantendo a estabilidade dos produtos ao consumidor, chegando ao fim do ano com um índice de inflação “à europeia”.
Como os “falcões” queriam mesmo os dois terços do voto “à angolana”, afastaram qualquer possibilidade de conciliação quando o partido MDM foi miseravelmente impedido de concorrer em nove círculos eleitorais.
A política e a economia não tardaram em escurecer a abertura do segundo mandato do presidente Guebuza.
Os pagamentos apressados às gasolineiras secaram o pequeno mercado financeiro local. A falta de liquidez nos bancos comerciais e o que ficou convencionado como “a greve dos doadores” fizeram o resto. O açambarcamento das divisas disponíveis, apesar das sucessivas injecções de dólares pelo banco central, tornou inevitável o disparo das moedas mais importantes no mercado local. O dólar está 40% mais caro e não o há, o rand disparou 35% e tem um impacto terrível nos bens de primeira necessidade consumidos, sobretudo no sul de Moçambique. A inflação subiu dos artificiais 3,25% em 2009 para 14,5% no primeiro semestre de 2010. Este é o índice que indica claramente a perda do poder de compra dos moçambicanos nos últimos seis meses.
Uma imprensa acrítica, sempre embalada pelo discurso da auto-estima e pouco preocupada com os reais problemas do país, presta-se a um perigoso jogo de espelhos, passando para o governo e para o partido que lhe dá apoio, a percepção de que o país avança vitoriosamente nos seus grandes desafios, nomeadamente no estafado slogan da luta contra a pobreza absoluta.
O braço de ferro com os doadores - e há que se questionar se valeu a pena tamanho exercício - está a ser pago com juros enormes. Estagnaram as contribuições, aumentou o nível de pressão externa e está instalado um clima de grande suspeição e desconfiança que vai levar tempo a dissipar.
O governo, levemente retocado em Janeiro, perdeu algumas figuras de peso e os seus substitutos, não mostram o lustro dos antecessores e, mais preocupante, começa a haver a percepção pública de terem sido péssimas escolhas. Até o ministro dos Transportes, de promissora carreira no mandato anterior, se tem envolvido em enormes trapalhadas. O fiasco das mais-valias do Mundial de Futebol, as improvisações desportivas, as quedas em indicadores internacionais relevantes e até mesmo o debate irrelevante sobre uma hipotética “geração de viragem” mostram o desnorte que, aparentemente, parece ter tomado conta da direcção do país.
Mais grave que os problemas que possam ser assacados à conjuntura, na famosa reunião da Namaacha, os emissários de Washington fizeram saber ao governo que o actual modelo de crescimento económico está esgotado e não é sustentável. O país não pode viver de donativos.
O país tem que procurar investimento externo – e aí os indicadores jogam papel crucial – tem de ser mais competitivo, tem de produzir mais procurando alcançar países como o Botswana e as Maurícias, mas sobretudo não se deixando ultrapassar por economias como a Namíbia, o Malawi e a Tanzânia. Os empresários, grande parte com ligações umbilicais ao poder do dia, estão a perder o verniz para questionar abertamente a falta de transparência e o afunilamento de oportunidades reinante no ambiente de negócios. Questionam também as políticas laborais, persecutórias e fechadas ao aumento da produtividade, competição e atractivas para potenciais parceiros externos.
Apesar dos slogans e do dinheiro a fundo perdido atirado para os distritos, a agricultura e os seus rendimentos – para o campesinato e os investidores – continua a ser adiada por falta de visão, incompetência e um poderoso lobby de açambarcadores de terras que ninguém parece ter coragem de travar.
Há opções de fundo que precisam de ser tomadas se queremos afastar o espectro do país de cobradores de rendas e de espaços concessionados. É preciso produzir, deixar produzir quem sabe produzir e afastar o populismo, um vírus que perigosamente infectou o cerne das nossas estruturas vitais de decisão.
E se de facto, a tal crise desdenhosamente descontada pelo dirigente de 2008 está entre nós instalada, é preciso mais austeridade vinda de cima, menos arrogância e mais honestidade na abordagem dos problemas que são de todos. Se ainda estivermos a tempo de rumarmos todos para o mesmo lado – governantes e governados - pois o risco do país faz de conta avança inexoravelmente.
Apesar do paraíso prometido pelos vendedores de ilusões.
Editorial do Savana de 06/08/10
Jose,
ReplyDeleteEquipe tecnica tem que estar bonitinha, por favor.
Sem duvida, Karim, apenas temos de aprimorar as tácticas!
ReplyDeleteNão prevejo mudanças neste comportamento em relação à crise financeira que afecta o mundo.
ReplyDeleteEstes continuarão a fazer 'orelhas moucas' - e a fingir que a crise ainda não chegou a Moçambique.
O segredo é só um: trabalhar muito, produzir muito, suar muito, e deixar de ficar sempre à espera dos donativos externos. Depois não venham com a história de que os problemas de Moçambique devem ser resolvidos pelos Moçambicanos (que até concordo), quando até estamos de mão estendida para que financiem o nosso orçamento de estado. Moçambique e o povo Moçambicano merece muito mais, pois isto não passa de uma falta de empenho, orgulho e pudor.
Maria Helena
Não há crise para os tubarões, para eles está tudo bem, o Povo é que tem de sofrer.
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