Nas celebrações do 35ª aniversário da independência, no dia 25 de Junho, podemos todos ter estado envoltos sob o manto da bandeira nacional, mas certamente que a efeméride teve significados diferentes para diferentes pessoas.
A luta pela independência não foi apenas uma missão difícil devido à natureza da confrontação com o inimigo colonial português. Foi também complexa pela necessidade do movimento de libertação gerir as suas próprias contradições internas, as quais iam-se multiplicando cada vez que novos desafios se colocavam à frente.
A luta pela independência não foi apenas uma missão difícil devido à natureza da confrontação com o inimigo colonial português. Foi também complexa pela necessidade do movimento de libertação gerir as suas próprias contradições internas, as quais iam-se multiplicando cada vez que novos desafios se colocavam à frente.
O movimento de libertação nem sempre esteve unido quanto à estratégia a ser aplicada para a conquista da independência. Do mesmo modo, o período pós-colonial era idealizado de formas diferentes pelas diferentes tendências ideológicas que militavam na Frente. A opção marxista-leninista nunca foi uma decisão tomada por aclamação, embora se tenha tentado dar a ideia de que assim o tenha sido.
Das várias correntes que perfilavam dentro da Frente, somente uma podia triunfar. É essa corrente que fica com o privilégio de contar a história. Ou melhor, a sua versão da história, uma versão que tem que ser moldada para demonstrar que foi a “linha correcta” que triunfou.
Na lógica das coisas, os derrotados ou teriam que desertar e formarem um movimento alternativo, ou conformavam-se com a derrota, submetendo-se à vontade dos vencedores. Não foi nada disto o que aconteceu. Os derrotados que não foram a tempo de buscar o conforto do exílio no Quénia, Estados Unidos, Europa ou outras partes do mundo foram presos, humilhados e finalmente mortos. Nunca foram sujeitos a nenhum julgamento para que os seus acusadores provassem a sua culpabilidade. Escusado dizer que lhes tenha sido oferecida oportunidade para se defenderem.
Com o tempo, a situação transformou-se de forma radical, e deve haver entre os vencedores aqueles que se sentem arrependidos pelo que aconteceu. Afinal, a idade também pode ajudar a olhar para o passado com um sentido crítico.
Pode-se aproveitar o actual momento de abertura para debater as coisas de forma honesta, sem emoções, demagogias, rancores ou ódios. A independência de Moçambique nunca estará completa enquanto não houver reconciliação entre os que ousaram sacrificar a sua juventude para que futuras gerações nascessem livres.
A Frelimo precisa de ganhar coragem e ultrapassar o embaraço de ter que esclarecer as circunstâncias em que alguns dos seus ex-dirigentes foram mortos. Os familiares destas figuras precisam desses esclarecimentos para poderem também se sentir livres.
Há questões práticas que devem ser confrontadas para que a vida se torne normal e para que os fantasmas do passado sejam exorcizados. Por exemplo, é necessário que sobre os mortos sejam emitidas as respectivas certidões de óbito como prova legal desse facto, para facilitar que os seus descendentes possam reivindicar seja qual for a herança material que tiver sido deixada pelos seus progenitores.
Será igualmente um gesto prático de reconciliação se os corpos destes indivíduos pudessem ser formalmente devolvidos aos seus legítimos familiares, permitindo-lhes a realização de cerimónias fúnebres condignas.
Não basta a retórica de que “os traidores foram fuzilados”. O conhecimento da data exacta desse acto permitirá aos familiares realizarem cerimónias comemorativas em datas que não sejam produto da sua própria imaginação.
Tudo isto são direitos humanos imprescindíveis, e de que qualquer nação livre se deve orgulhar.
Haverá mais uma questão por esclarecer. Em que circunstâncias é que supostas ofensas cometidas no contexto de um movimento de libertação (portanto, a priori sem Estado), são julgadas e as respectivas penas executadas extrajudicialmente num Estado independente.
Terá sido o caso de uma decisão de alguém com excesso de zelo, agindo por conta própria? Até que ponto tal acção terá em si constituído um crime? Quem é o responsável?
Estas não são questões triviais. Elas não devem ser reduzidas ao âmbito do partido Frelimo, pois trata-se de cidadãos moçambicanos que pelo seu envolvimento na luta pela independência nacional são património comum de todos nós. Estas são questões cuja abordagem frontal ajudará muito para a consolidação da reconciliação nacional, a base mais sólida para a Unidade Nacional que tanto almejamos.
Fernando Gonçalves no Savana, citado no Diário de um sociológico - 09.07.2010
Das várias correntes que perfilavam dentro da Frente, somente uma podia triunfar. É essa corrente que fica com o privilégio de contar a história. Ou melhor, a sua versão da história, uma versão que tem que ser moldada para demonstrar que foi a “linha correcta” que triunfou.
Na lógica das coisas, os derrotados ou teriam que desertar e formarem um movimento alternativo, ou conformavam-se com a derrota, submetendo-se à vontade dos vencedores. Não foi nada disto o que aconteceu. Os derrotados que não foram a tempo de buscar o conforto do exílio no Quénia, Estados Unidos, Europa ou outras partes do mundo foram presos, humilhados e finalmente mortos. Nunca foram sujeitos a nenhum julgamento para que os seus acusadores provassem a sua culpabilidade. Escusado dizer que lhes tenha sido oferecida oportunidade para se defenderem.
Com o tempo, a situação transformou-se de forma radical, e deve haver entre os vencedores aqueles que se sentem arrependidos pelo que aconteceu. Afinal, a idade também pode ajudar a olhar para o passado com um sentido crítico.
Pode-se aproveitar o actual momento de abertura para debater as coisas de forma honesta, sem emoções, demagogias, rancores ou ódios. A independência de Moçambique nunca estará completa enquanto não houver reconciliação entre os que ousaram sacrificar a sua juventude para que futuras gerações nascessem livres.
A Frelimo precisa de ganhar coragem e ultrapassar o embaraço de ter que esclarecer as circunstâncias em que alguns dos seus ex-dirigentes foram mortos. Os familiares destas figuras precisam desses esclarecimentos para poderem também se sentir livres.
Há questões práticas que devem ser confrontadas para que a vida se torne normal e para que os fantasmas do passado sejam exorcizados. Por exemplo, é necessário que sobre os mortos sejam emitidas as respectivas certidões de óbito como prova legal desse facto, para facilitar que os seus descendentes possam reivindicar seja qual for a herança material que tiver sido deixada pelos seus progenitores.
Será igualmente um gesto prático de reconciliação se os corpos destes indivíduos pudessem ser formalmente devolvidos aos seus legítimos familiares, permitindo-lhes a realização de cerimónias fúnebres condignas.
Não basta a retórica de que “os traidores foram fuzilados”. O conhecimento da data exacta desse acto permitirá aos familiares realizarem cerimónias comemorativas em datas que não sejam produto da sua própria imaginação.
Tudo isto são direitos humanos imprescindíveis, e de que qualquer nação livre se deve orgulhar.
Haverá mais uma questão por esclarecer. Em que circunstâncias é que supostas ofensas cometidas no contexto de um movimento de libertação (portanto, a priori sem Estado), são julgadas e as respectivas penas executadas extrajudicialmente num Estado independente.
Terá sido o caso de uma decisão de alguém com excesso de zelo, agindo por conta própria? Até que ponto tal acção terá em si constituído um crime? Quem é o responsável?
Estas não são questões triviais. Elas não devem ser reduzidas ao âmbito do partido Frelimo, pois trata-se de cidadãos moçambicanos que pelo seu envolvimento na luta pela independência nacional são património comum de todos nós. Estas são questões cuja abordagem frontal ajudará muito para a consolidação da reconciliação nacional, a base mais sólida para a Unidade Nacional que tanto almejamos.
Fernando Gonçalves no Savana, citado no Diário de um sociológico - 09.07.2010
"(...) embora não haja, talvez inocentes, alguns devem ser mais responsabilizados do que os outros (...) os que estiveram envolvidos terão que arcar com as consequências. Anecessidade de reconciliação implica a vontade de perdoar, mas a compreensão daquilo que aconteceu continuará a ser um tema fundamental da vida nacional" (MINTER. W 1998, P.10)
ReplyDeletePerante este apelo fica claro que os apelos à mutismo constituem um grito de desespero de quem lhe abafa a dor.
''(...) interpretações incorrectas do passado contribuem para os facassos futuros no estabelecimento de bases estáveis para a paz e reconstrução nacional." (indem).
Alguns presos politicos como Simango, J. Massiano e outros foram assassinados porque a FRELIMO temia que como desertores que eram poderiam se aliarem ao inimigo disse Chissano J. numa entrevista com José belmiro um Deplomata Jornalista da TV tim, apelando o não recuo para traz sob pretesto de preservação da Paz!
Em nós não há nenhum momento em que assassinar companheiros não seja erro, o que se quer é reconhecimento e perdão entre as partes só.
Ilustre amigo Chacate, muito obrigado pelo seu comentário, muita verdade junta.
ReplyDeleteA realidade é que sem reconciliação não vamos a lado nenhum!
"Em nós não há nenhum momento em que assassinar companheiros não seja erro, o que se quer é reconhecimento e perdão." Eu assino por baixo, estamos juntos nesta preocupação!