Friday, 6 January 2017

É difícil interpretar ou ficar alheio aos “acordos telefónicos de tréguas”


Canal de Opinião por Noé Nhantumbo

Antes era o poder monocromático e depois a bipolarização político-militar.

Agora resiste-se para permitir que a democracia vingue e avance.
Quando se pensava que o “dossier” de um Exército republicano havia sido acordado e implementado, o que se ficou a saber é que uma das partes jamais esteve interessada em ver um Exército daquele tipo e natureza existindo. Também não houve interesse de que uma PRM e SISE autenticamente republicanos existissem.
Da mesma maneira, não houve interesse em desamarrar o sistema judicial da tutela do Executivo e do partido de suporte do Governo.
Sem ou com células do partido no poder, a realidade mostra que têm sido os comandos partidários que aliciam e viciam o panorama político nacional.
Agora, depois do aparente falhanço ou descalabro das conversações no CCJC e em sede de Comissão Mista, são os presidentes da República e da Renamo que negociam telefonicamente o que deve ser feito ao nível das hostilidades militares.
Isso tem de ser visto como algo importante, mas também revelador do que era o mandato efectivo da Comissão Mista.
Do lado do PR, fica a impressão de que recebeu finalmente os poderes necessários por parte da Comissão Política para tomar a dianteira do processo negocial. Se isso tivesse sido decidido há mais tempo, já teríamos paz efectiva e um acordo político reestruturante. Quem tinha dúvidas de que a inconstitucionalidade do dispositivo dos estatutos da Frelimo que diz que o PR quando é membro da Frelimo obedece à Frelimo terá ficado esclarecido.
Da parte da Renamo, jamais houve dúvidas de que Afonso Dlahkama era quem decidia. Os seus membros na Comissão Mista estavam lá com mandato determinado. Como as reuniões políticas dos órgãos da Renamo praticamente não se realizam por condicionalismos diversos.
O que se pensava que seria um processo relativamente simples de reuniões de uma Comissão Mista com mediadores internacionais escolhidos a dedo e aceites pelas partes tem-se revelado complicado ou pelo menos lento e de resultados imprevisíveis.
A Frelimo, entanto bancada parlamentar, vive dependente das decisões prévias da sua Comissão Política. Não há voto por consciência mas voto pré-determinado em função do que tiver sido a decisão da CP. Isso tira utilidade ao parlamento, visto que a Frelimo é maioritária naquele órgão. Enviar ao parlamento alguma proposta legislativa que não tenha passado pelo crivo da CP da Frelimo e aceite por esta é inútil, como já se viu no passado, mesmo recente.
Agora que as coisas parecesse alinhavadas naquele nível até temos o PR dialogando telefonicamente com o líder da Renamo. É sumamente bom que os dois falem e continuem se falando. Isso não acontecia no consulado de AEG. Era a arrogância que reinava.
Mas, compatriotas, tenhamos atenção e cautela ao procurarmos interpretar o que está acontecendo neste momento.
Será simplesmente uma pressão multifacetada que tem empurrado os dois para fazerem o há muito óbvio e necessário?
Será a conclusão por parte dos que mandam na Frelimo de que opção advogada por alguns falcões “sem dentes nem garras” fracassou?
Será que a actual CP da Frelimo finalmente entendeu que o país se encontra mergulhado na ingovernabilidade devido à manipulação político-eleitoral e que prolongar este estado de coisas pode ser perigoso e fatal para os seus interesses?
Será que se chegou à conclusão de que existe campo para manobrar e estender o poder até aos próximos pleitos eleitorais ao mesmo tempo que se recupera a intenção de voto dos moçambicanos descontentes e desavindos com um partido que só promete, mas não faz?
Ou será uma manobra de antecipação face à mudança de comportamento nas chancelarias internacionais, como tem demonstrado a recusa de apoio financeiro a um regime que se mergulhou em dívidas ocultas para adquirir armamento em Pequim e algures?
A insustentabilidade de uma cooperação internacional alegadamente visando promover a democratização, mas favorecendo o enriquecimento ilícito da elite político-governativa está mais do que demonstrada.
Resolver militarmente uma questão política também se apresenta insustentável a altamente lesivo para todo um povo. Ir para as próximas eleições do quadro altamente inclinado a favor do regime do dia, com uma CRM privilegiando prerrogativas de um PR omnipotente também não é promover nem potenciar a democracia política e económica em Moçambique.
Sabendo-se que as potências mundiais têm os seus próprios problemas e que os nossos são de países periféricos sem peso no panorama internacional mesmo que existam aqueles que acreditem que o nosso gás e petróleo nos fará outro valor é contraproducente.
Ter e não saber negociar com vantagem é pior do que não ter recursos.
O que dizer destas tréguas telefónicas?
São importantes, porque poupam vidas humanas.
Simbolizam a bipolarização político-militar também não nos devemos esquecer. Contra factos, não há argumentos. Quem organizou as cartas no sentido de se prolongar no poder foi um dos signatários do AGP de Roma. Convém não esquecer.
Que acontecerá finda mais esta trégua?
Veremos também trégua no processo de eliminação física-selectiva de opositores de ambos os lados? Não parece que isso aconteça, pois isso comprovaria a sua autoria, o que nenhuma das partes obviamente quer.
Que teremos?
Poderemos ver o assunto conhecendo um fim que é desejo dos moçambicanos, mas também podermos ser surpreendidos por mais manobras dilatórias.
Conhecemos os políticos que temos e sabemos que em geral “engordam” sempre que têm algum protagonismo, mesmo quando nem são eles os protagonistas.
Será importante travar o que acabará por ser uma guerra de recursos e pelos recursos antes que ela se alastre e tome conta de todo o país.
Aos moçambicanos e a todos os parceiros genuinamente interessados na paz e não no gás existente importa que continuem a pressionar para levar os beligerantes a entenderem--se e a compreender que só a paz interessa a todos. (Noé Nhantumbo)

CANALMOZ – 06.01.2017, no Moçambique para todos

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