Sunday, 19 June 2016

País vendido em hasta pública

O problema que separa os moçambicanos tem um nome conhecido e bem concreto que se chama Constituição da República de Moçambique que beneficia, largamente, ao candidato e partidos que forem proclamados vencedores das eleições presidenciais e legislativas.
Este é o verdadeiro e real imbróglio que divide os partidos políticos, a sociedade e as pessoas do nosso país. Em Moçambique de hoje, quem ganha uma eleição fica com tudo – abocanha o poder legislativo, executivo e judicial - e quem perde fica sem a dignidade, arremessado para a caixa da pobreza e vira cidadão menos importante ante aos olhos do suposto vencedor.
Tem sido sempre assim desde a independência nacional – 1975 - e a situação tornou-se mais visível com a introdução do sistema multipartidário e agravada com a chegada ao poder de Armando Guebuza.
A independência nacional não foi conquistada apenas pelas elites político-económicas do partido Frelimo, mas, por todo o povo. A intolerância política, a ganância pelo enriquecimento fácil e a corrupção são o obstáculo para a democratização e do desenvolvimento nos domínios social, económico, cultural e político de Moçambique.
Estes factores levam uma franja social que gira em volta da Frelimo a que se agarre ao poder e encontre formas à margem da lei para vencer as eleições e perpetuar-se como governo, valendo-se do apadrinhamento dos órgãos eleitorais.
A Frelimo que tem vindo a ser aclamada, sistematicamente, pela comunidade internacional como vencedora, enquanto não passa de uma farsa. Os problemas dos moçambicanos são agravados pelos países que apoiam as falcatruas eleitorais da Frelimo.
É mentira quando os políticos do partido no poder dizem que o problema é Afonso Dhlakama e a Renamo. O problema está no modus operandi dos dirigentes, a vários níveis, do partido Frelimo que já não se lembram dos principais objectivos que levaram o povo a opôr-se ao regime colonial.
O povo lutou contra o sistema colonial pela justiça social, igualdade de oportunidades, direitos humanos, desenvolvimento económico, social, cultural e pela independência nacional, que seja diferente da substituição mecânica do explorador branco pelo explorador de cor preta.
A independência nacional não significa somente o arrear da bandeira portuguesa e o içar da bandeira multicolor nacional com uma estrela atravessada por uma AKM.
Seria ridículo demais que a luta do povo se limitasse na simples substituição do colono estrangeiro branco pelo colono nacional preto. Seria mais doloroso morrer por uma mordedura de um crocodilo e menos doloroso morrer por uma mordedura de uma serpente?
O problema é a Frelimo que abocanhou as riquezas nacionais para si e privatizou o país todo a seu favor. Quem promove a guerra e a instabilidade política é a Frelimo que não tolera a diferença. Apesar da aparente abertura com os acordos de paz de Roma (1992), a postura dos dirigentes da Frelimo não melhorou nem admitem uma convivência pacífica entre o pensar diferente.
Para a Frelimo, pensar de modo diferente é ser agente do inimigo, deve ser combatido com todos os meios disponíveis. Assim, assiste-se, nas eleições, uma violência em espiral, fazendo infundir medo nos seus adversários. As eleições que deveriam funcionar como um tribunal para julgar o governo, transformam-se em encenação política para dizer aos doadores que aqui também se dança a música da democracia.
O povo já se apercebeu disso e perdeu o interesse de participar neste tipo de exercício deturpado e prostituído por um grupo de assassinos e gatunos que se servem do Estado para promoverem a corrupção e suas negociatas.
A solução está na mudança radical das mentalidades, na alteração profunda da Constituição da República – uma nítida separação de poderes, redução dos poderes conferidos à figura do Presidente da República, implantação de um sistema semi-presidencialista.
O chefe de Estado deve deixar de indicar reitores e institutos públicos, presidentes dos tribunais, introduzir o sistema em que o governador de província tem que ser eleito. Implantar um sistema eleitoral independente dos demais poderes estatais, diferentemente do que se passa agora em que a Frelimo domina os órgãos eleitorais.
A paz e o desenvolvimento jamais serão uma dádiva divina, mas um esforço colectivo dea sociedade onde ninguém se sente discriminado nem rejeitado por não pertencer ao partido no poder. Assim, teremos uma sociedade justa onde ninguém ganha tudo nem ninguém perde tudo.
Para que possa haver as alterações profundas que possam democratizar o país e as instituições, o primeiro passo tem que ser o de remover a Frelimo do poder, pois nenhum partido aceita, livremente, rejeitar o seu passado, principalmente, quando esse passado o beneficia grandemente. A oposição terá que se despir das suas manias, por vezes, mesquinhas, e começar a ver que o adversário político é comum e, gerador dos conflitos sociais, políticos e económicos por que hoje o país está a passar.
Que será um equívoco pensar que o problema do país ficará resolvido com um um simples telefonema entre Nyusi e Dhlakama. A troca de chamadas telefónicas já aconteceu muitas vezes, porém, o problema principal ainda persiste.
O descontentamento popular está vai aumentar cada vez mais, a corrupção a generalizar-se, os massacres, raptos e as valas comuns multiplicam-se. O afundanço do país surgiu porque o presidente tem poderes em excessos que o levam a acreditar que pode vender o país sem ser indagado.
As reformas aqui propostas visam colocar cada instituição no seu devido lugar para que ninguém se julgue “deus”. Nyusi e Dhlakama podem telefonar-se um ao outro quantas tantas vezes o entenderem, e até as armas podem deixar de cantar, contudo, teremos uma paz momentânea porque o silêncio das armas não resolve o problema que é a Constituição que permite a prática de injustiça política, social e económica.
A constituição faz do Presidente um ser absoluto. A oposição tem uma oportunidade ímpar para fazer descarrilar a Frelimo que enfrenta três bicudos problemas – crise político-militar, crise económica e o descontentamento popular generalizado.
É só empurrar e será como um golpe de misericórdia, que se aplicava, nas guerras do passado, aos camaradas de armas quando gravemente feridos, sem hipótese de sobreviver e em que a morte aparece como um mal menor. Não aproveitar a oposição esta ocasião magna para deitar abaixo a Frelimo só poderá ser por falta de astúcia e de ambição política.
Só uma oposição distraída pode ocupar-se de intrigas ao invés de investir na luta contra um regime corrupto, militarizado e moribundo.
As futuras gerações poderão julgar aos políticos de hoje pela sua contínua insolência política perante o imperativo nacional de libertar o povo das garras dos gatunos que vendem o país em hasta pública como se de ferro velho se tratasse.
Edwin Hounnou

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