Monday, 26 October 2015

Quando o silêncio diz mais do que as palavras


EDITORIAL

Quando o estimado leitor estiver a ler a edição do “Canalmoz” desta segunda-feira, 26 de Outubro de 2015, terão passado exactos 17 dias (mais de duas semanas) depois do vergonhoso episódio da cidade da Beira, em que o Governo mandou cercar, para posterior assalto, a residência do presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, no Bairro das Palmeiras.
O presidente do maior partido da oposição, vindo de umas eleições duvidosas, viu a sua residência cercada por homens armados com material bélico de calibre vário. Até aqui nenhuma autoridade do Estado apareceu a comentar o assunto, pelo menos; seria exigir demais esperar que condenasse o episódio.
Filipe Nyusi continua calado, num acto de extrema e perigosa cobardia.
Sendo Nyusi o comandante-em-chefe das Forças de Defesa e Segurança, não se explica o seu silêncio perante a brutalidade que a sua força demonstrou contra um cidadão que representa, provavelmente, a vontade da maioria dos moçambicanos.
Querendo Filipe Nyusi ou não, Afonso Dhlakama é uma instituição política nacional, porquanto representativa de uma franja considerável de moçambicanos. A sua casa não só esteve cercada, como havia um plano, que saiu errado, de promoção de violência e sangue.
Se Filipe Nyusi diz ser Presidente da República, porque alegadamente que ganhou as tais eleições, era de esperar que se tomasse uma posição perante tamanho estupro da liberdade individual preconizada na Constituição da República e do uso ilegal da força do Estado para fins banditescos. O Conselho de Estado não reuniu. A Assembleia da República manteve-se em silêncio.
A questão torna-se ainda mais grave quando se sabe que o presidente do maior partido da oposição foi à Beira num esforço de aproximação de diferenças, para se ultrapassar a crise pós-eleitoral que já se arrasta há um ano. Se o Governo decidiu fazer parte da saída de Dhlakama da “parte incerta”, como é que se explica que, no dia seguinte, o mesmo Governo pretenda assassinar ou humilhar Afonso Dhlakama, perante um Nyusi calado e cúmplice?
Não passa pela cabeça de qualquer cidadão medianamente racional que aquela operação frustrada tivesse por objectivo recuperar as tais três armas perdidas na tentativa de assassinato de Afonso Dhlakama em Zimpinga. Pois bem, assumamos tal hipótese. Quer dizer que Nyusi fica calado quando as suas tropas fazem uma dupla incursão de tentativa de assassinato do seu adversário político que agora o Estado catalogou como inimigo.
No dia 25 de Setembro, vinte pessoas foram mortas pela acção irresponsável das Forças de Defesa e Segurança dirigidas por Nyusi. E Nyusi continua calado?
Tudo vai ficar assim como está? Então é caso para dizer que os que subvertem a ordem constitucional não são os outros. São os que se intitulam arautos da lei. Como é que Nyusi quer que os outros cumpram a lei quando ele próprio dá ordens ilegais para as forças de segurança assassinarem outros moçambicanos? Que tipo de mensagem estará Nyusi a tentar transmitir com o seu silêncio perante toda esta bandalheira de Estado?
Moçambique é o único exemplo no mundo onde o que se diz vencedor de umas eleições confusas tenta, à luz do dia, tirar a vida ao seu adversário.
Isso é arrepiante. Como é que o senhor Nyusi se sente junto da sua família e dos seus filhos depois de planear e ordenar essas emboscadas?
O que lhes tem dito? É assim que pretende ser um bom governante? É assim que pretende estar no coração dos moçambicanos? É assim que pretende ser um exemplo?
A tese que neste momento está a ser vendida, segundo a qual Nyusi é refém de um tal eixo “radical” changana- maconde, que assaltou as pastas da Defesa e Segurança, não passa, na nossa opinião, de uma teoria falaciosa, para apresentar ao público uma falsa figura de um Nyusi “teleguiado”. É uma falsa ideia que visa inocentar Nyusi das possíveis atrocidades que este grupo de cunho delinquente pretende levar a cabo num futuro não muito distante. Para depois se atribuir as culpas aos tais “radicais”.
Esta tese é uma ideia romancista funcional, mas, na realidade, é ilusória.
Quando o país entrar num arranca-arranca, com os outros a mostrarem que também têm os seus “radicais”, ninguém estará aqui para arcar com as despesas da destruição e da tragédia. Que Nyusi não se faça de bobo nem tolo, que não engana a ninguém. Essa propaganda de atribuir as tais acções ilegais das Forças de Defesa e Segurança a uma suposta “ala radical” pode parecer impressionante agora, mas já não terá graça nenhuma quando as coisas degenerarem para o extremismo generalizado de todos os lados.
Ainda bem que o arcebispo da Beira já fez questão de informar que o povo não é tolo e que, depois dos acontecimentos das Palmeiras, tem mais propriedade e soberania cimentada para indicar quem de facto anda a fingir que quer paz, quando, na verdade, patrocina o caos. Ou os moçambicanos se levantam perante toda esta tentativa de infantilização colectiva, ou será tarde demais quando a preocupação for cada um salvar a sua própria vida num país em chamas. Esta história de “radicais” macondes ou changanas deve ser imediatamente denunciada e travada, sob pena de conferirmos autoridade a um bando de loucos, caducos sem escrúpulos que acham que ainda vivemos na Idade da Pedra.
Nyusi tem duas hipóteses: ou aparece na mesma fotografia com esses bandidos que no passado assassinaram, sem direito a julgamento, vários moçambicanos em nome do tal radicalismo, ou distancia-se deles e manda-os internar por delinquência tendencial.



(Canal de Moçambique)




CANALMOZ – 26.10.2015, no Moçambique para todos

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