Tuesday, 21 July 2015

A “bola não está do lado do outro”mas do lado de todos nós



A PGR tem tanta fruta nas mãos, que precisa de ajuda urgente.

Mas quase todos os moçambicanos não acreditam que esta PGR mexa “alguma palha” sobre os assuntos de índole diversa que tem entre as mãos.
A PGR encontra-se virtualmente amarrada, acorrentada e amordaçada. As “cordas” estão sob o controle do partido no poder e do Executivo.
Afigura-se praticamente impossível que a PGR tenha “tomates” para acusar ou iniciar qualquer processo judicial que tenha em vista repor a verdade e justiça sobre toda uma série de assuntos identificados ou arrolados.
Comecemos pelo Conselho Constitucional, que, através de uma margem muito curta, conseguiu homologar todo o “dossier” eleitoral, dando vitória à Frelimo e ao seu candidato nas últimas eleições gerais e presidenciais.
Numa situação normal e num Estado de Direito digno desse nome, veríamos demandas dos partidos exigindo que a questão dos
editais fosse aprofundada. Eventualmente, teríamos resultados confirmando que sem editais não pode haver lugar a homologação de resultados eleitorais.
Mas no actual quadro orgânico e de hierarquia distorcida, em que um simples telefonema pode travar uma acção judicial, seria utópico vermos algo semelhante acontecendo.
De maneira simples, como sói dizer-se, estamos numa encruzilhada não só judicial, mas política.
Quem construiu um edifício legal pretendendo proteger-se de tudo e mais alguma coisa, acaba verificando que há fissuras que crescem todos os dias. Corre a proteger-se, mas novas fissuras se abrem, ou novos
“indícios de ilícitos antes secretos” são anunciados.
A herança de Filipe Jacinto Nyusi enquanto PR reconhecido por todos os partidos políticos do país é pesada e complexa. Ele terá que ser um exímio político e sobretudo pessoa de personalidade, verticalidade e honestidade para contornar as dificuldades de hoje em abordar e tratar tanta podridão
identificada nos meandros políticos e judiciais.
Se ele não fosse o candidato escolhido pelo seu partido, outro herdaria tal fardo. Mas manda a verdade dizer que alguém quis livrar- se de um “fardo tóxico”, mas mantendo-se por perto e controlando o desenrolar dos acontecimentos, por via das dúvidas.
Décadas de impunidade em tudo o que fosse relacionado com os poderosos criaram uma cultura de permeabilidade e corrupção institucional que teve como subproduto a aceitação da fraude e de crimes como algo
normal, desde que fossem cometidos por determinadas pessoas previamente identificadas.
Vivia-se a era dos generais e dos majores- generais, que punham e dispunham em virtude de seu estatuto. Por outro lado, navegavam os coronéis e os senhores chefes de departamentos no partido
ou nos serviços segurança do partido e do Estado.
Hoje, como pode FJN ou a PGR deliberar acusar e submeter a julgamento figuras de proa do partido Frelimo, identificadas como
proprietárias de empresas que fazem negócios privilegiados e sem transparência com empresas públicas? Hoje, como se pode
contrariar a cultura do “’Empoderamento’ Económico Negro” ilícito? E o outro “empoderamento” económico que nem é assim tão negro?
Hoje, como se pode requerer com êxito uma sindicância geral às empresas públicas? Hoje, como se pode questionar e investigar com êxito os contratos dos megaprojectos?
Face à relutância em transformar as discussões políticas decorrendo no Centro de Conferências “Joaquim Chissano” numa oportunidade soberana para “lavar roupa suja internamente” e tomar decisões vinculativas
que promovam a separação dos poderes democráticos, ao mesmo tempo que fortificam os alicerces da paz e estabilidade, vemos o país caminhando atabalhoadamente com rumo desconhecido.
Tem de haver políticos com coragem para tomar decisões que salvaguardem os interesses do país.
O primeiro passo talvez seja juntar os factores que nos unem e eliminar as causas da desconfiança que partidariza as forças militares e policiais.
De nada vale sugerir que os problemas não existem, ou passar o tempo a referir que temos problemas com listas de forças residuais da Renamo. Há que reconhecer que as FADM, depois de 1994, foram paulatinamente transformando-se em FPLM. E a PRM jamais deixou de ser PRM, obediente e ao serviço da Frelimo. Com ampla abertura e transparência no aparato de defesa e segurança, veremos uma convergência
construída e moçambicanos depondo as armas e concentrando-se numa agenda nacional consensual.
Amnistia geral para crimes políticos e financeiros determinando um recomeço dariam garantias aos que agora se mostram contrários a um entendimento sem reticências entre os interlocutores no CCJC.
Despartidarização do aparelho de Estado, acompanhada de uma remodelação profunda dos quadros que superintendem a máquina da
Justiça, dará lugar a um sistema de Justiça baseado na competência e no rigor, longe das órbitas partidárias. A lei acima de todos e servindo a todos tornar-se-á realidade verificável.
Os discursos que se ouvem na praça política são “forçados”, na medida em que se recusam a reconhecer que algo está muito mal encaminhado.
O PR, Filipe Jacinto Nyusi, precisa de libertar- se de assessores que parece que lhe foram impostos pelos detentores do poder no seio do
seu partido, pois estão mostrando muita incoerência e contra-sensos, se formos a avaliar o que tem sido dito a partir da Presidência da República.
Reconhecer erros de avaliação e de actuação não significa fraqueza, mas, sim, lucidez, franqueza e vontade de entrar em entendimentos abrangentes.
Talvez já seja tarde para o estabelecimento de uma “comissão nacional da verdade e reconciliação”, mas nunca é tarde para se fazer exactamente o que uma comissão desse tipo e natureza tem como prerrogativas. De maneira informal, eminentemente política, existem mecanismos para levar a que irmãos desavindos se sentem à mesma mesa e discutam de maneira profícua os problemas do país.
Mas é preciso ter a coragem de retirar a superioridade “intrínseca” da mesa. Os tabus que envolvem certas pessoas e que as colocam num patamar de inacessibilidade jogam contra a paz e a concórdia.
Nenhum acordo político será vinculativo e estabilizador se não contemplar formas práticas e efectivas de reabilitação oficial dos heróis dos outros. Podem aumentar os inquilinos da praça dos heróis nacionais, mas, sem que os heróis dos outros sejam lá depositados, continuaremos vendo adiada uma simples questão de perdoar para ser perdoado.
Libertar a PGR da Procuradora Geral da República talvez seja um primeiro passo que tem de ser dado, pois o tipo de tarefas que tem mantém-na entorpecida e inoperante. A sua forma de chegada àquele cargo tira-lhe a independência necessária, se não quisermos mentir.
Com objectividade negocial e espírito prático, mas também patriótico, é possível encontrar caminhos que levem à solução dos problemas actuais.
Moçambique precisa de ver a dualidade de critérios diluída e a responsabilização ganhando pernas e forças. De nada vale esconder o que acaba sendo do conhecimento público.
Não há quem seja superior a outro, como alguns pretendem fazer crer. Essa é a doutrina daqueles que eram antes intocáveis, que agora, vendo-se descobertos, procuram por todos os meios afastar de si qualquer
menção de procedimento incorrecto ou criminoso da sua parte.
Nenhuma muralha de segurança cria a estabilidade pretendida, como se pode verificar um pouco por todo o mundo. Ainda não temos grupos de terroristas desencadeando ataques suicidas como é noticiado de outros países.
Mas esquecer que temos conflitos de natureza militar localizada não conduzirá a um cessar- fogo duradouro.
É obrigação dos políticos lidar com os assuntos políticos de hoje de uma forma que ultrapasse os seus interesses estomacais.
Alguns passos inéditos estão sendo dados ao nível do parlamento, e isso augura um bom futuro para o país
Trazer para a mesa o assunto de todas as empresas públicas do país, sua forma de gestão, suas contas reais, seus contratos com terceiros, procedimentos de acesso a emprego nelas e formas de progressão na carreira é de interesse público e não coisa privada que tenha de ser mantida em segredo. Moçambique sem tabus e semi-deuses é de tal urgência que não se pode perder nem mais um dia. 


(Noé Nhantumbo)


CANALMOZ – 21.07.2015

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