Saturday, 20 June 2015

Ostentação, arrogância, branqueamento, receitas para o desastre

 
Agora que a “atunada” mostra as suas entranhas, quem protege quem?

Excelentíssimos advogados incansáveis do regime, agora que o “caldo da EMATUM” está entornando e a “panela da ENI” começa a borbulhar, quem defende quem?
Aquela jogada judicial do Conselho Constitucional, gerada pela Comissão Nacional de Eleições, foi relativamente fácil, se atendermos a que o esquema de forçar a homologação de um PR estava blindado pela força do aparato policial e judicial. Tudo estava preparado e tinha que dar certo.
Agora que começam a chegar à superfície e ao conhecimento público escandalosos negócios de titulares de cargos públicos do Governo de Armando Guebuza, alicerçados no silêncio cúmplice de uma maioria parlamentar, como será executada a defesa de tais actos, que consubstanciam crime?
O país sofre de uma hemorragia dos seus recursos financeiros numa ofensiva orquestrada por um Executivo que se lançou de faca na mão para a dilapidação de tudo o que existia. A sua maioria parlamentar tacitamente se calou e deixou que esquemas extremamente lesivos dos cofres públicos fossem concretizados.
Não há como não questionar e relacionar a maneira de estar da liderança de um partido e do Governo, quando se demonstra que houve conluios para delinquir e roubar grotescamente dinheiros públicos. A coisa pública tornou-se privada, num processo acelerado pelo fim de mandato de um Executivo que se proclamava todo-poderoso. Goradas as tentativas de alteração do quadro constitucional que vedava a candidatura para mais um mandato presidencial, viu-se uma aceleração vertiginosa de assinatura de contratos de concessão e exploração de recursos, ao mesmo tempo que se blindavam formas de saque de fundos públicos por via de parcerias público-privadas e a criação de empresas, algumas delas fantasmas.
Quem teve uma EMPOPESCA e depois contribuiu para a sua falência descobriu milagrosamente que poderia alavancar operações nebulosas de hipotética pesca de atum num abrir e fechar de olhos.
Quem sempre defendeu que a terra é do Estado descobriu que poderia avançar com a sua venda para corporações internacionais sob disfarce de projectos de desenvolvimento agrários tripartidos onde o que é público é invisível e o que é privado segue acumulando lucros. Dizem que o Prosavana visa desenvolver, mas recusam-se a dizer se será em detrimento dos interesses dos camponeses residentes na área de implementação do projecto.
Desdobram-se na criação de ministérios para assegurar o controlo efectivo da agenda económica, como se o país fosse um grande mercado informal.
Face ao EMATUMGATE e ao PROSAVANAGATE, que nos dizem os defensores deste estado lastimoso de coisas?
Já não é sem tempo que cabeças rolem e que a justiça se faça sentir. Quem assaltou o Estado e fez dele a testa-de-ponte para a prossecução de negócios privados deve responder pelos seus actos lesivos.
Não se trata de “vendettas”, mas de uma simples operação de credibilização das instituições governamentais, a bem do Estado de Direito que alguns dizem, com frequência, defender.
Face à verdadeira justiça não há intocáveis.
Fomos martelados, durante dez anos, com discursos que pintavam o “estado da nação” como bom, e, passados alguns meses do fim do mandato de AEG, as notícias que chegam aos cidadãos são deprimentes, ao denotarem um assalto rigoroso e planificado aos recursos públicos, através de variados esquemas. Para enriquecer, não se olhou a meios, e todo um povo fica endividado para que fortunas privadas cresçam.
O esquema de auto-protecção estabelecido, baseado numa cultura política que reza a obediência cega ao que uma Comissão Política proclama como verdade universal e linha a seguir, manietou deputados e juízes.
Crimes de natureza económico-financeira passam por sabedoria empresarial e sentido de oportunidade.
Os alunos do “Black Economic ‘Empowerment’”, “Empoderamento” Económico Negro, ultrapassam os seus professores a grande velocidade. Na verdade, tudo é mais fácil quando o poder judicial e legislativo está perfeitamente controlado e coordenado por quem se organizou para enriquecer a qualquer custo e meio.
Parece que a decisão terá sido tomada partindo do princípio de que o poder detido era suficientemente forte para afastar incómodos e intenções obstrucionistas de quem quer que fosse.
Transfiguração governativa e abuso do poder tornaram-se normas a cumprir por toda uma cadeia hierárquica. Sem pestanejar vimos negócios do Estado sendo encaminhados para empresas tituladas por detentores de cargos públicos sem que houvesse reacção atempada dos deputados da AR.
Sob a justificativa de que filhos e dirigentes do Governo também tinham direitos económicos inalienáveis, vimos avançar uma promiscuidade nojenta entre a coisa pública e a privada.
Hoje estamos atolados de dívidas públicas que serão pagas por todo um povo, enquanto os que as engendraram estão sossegados, gozando de lucros fabulosos.
O tempo urge no sentido de que equívocos têm de ser escrutinados e decisões tomadas.
É todo um espectáculo escandaloso de “cambalachos” deliberados impostos como negócios do Estado merecendo segredo total que importa esclarecer para que credibilidade de todo um Governo aconteça.
Há implicações judiciais que uma Procuradoria-Geral da República não pode deixar de explorar.
O PR, enquanto guardião da justiça e o mais alto magistrado da nação, não se pode calar face às revelações calamitosas que abundam na praça pública.
A elite empresarial, as organizações da sociedade civil, a nata da jurisprudência nacional, os deputados, perderam oportunidades soberanas de intervir e acautelar o interesse público. De banquete em banquete, de prémio a prémio, de condecoração a condecoração, de distinção a distinção, afinal tudo não passado de teatro vil e porco, visando ofuscar a opinião pública nacional na defesa de interesses inconfessos.
E não nos enganemos, foram os mesmos que fabricaram resultados eleitorais que deixam o país pendurado e à beira do precipício da violência e de mais uma guerra fratricida.
Estancar a crise e resolver os problemas existentes vai exigir que haja coragem e determinação tanto do Executivo actual como do parlamento e judiciário.
O tempo não é palminhas nas costas, como se nada tivesse acontecido.
Ponderar sim, mas agir com responsabilidade, para que as teias da corrupção e tráfico de influências sejam liminarmente combatidas, em defesa do interesse nacional, são as tarefas de hoje.
Vão doer, mas não se pode ficar parado, paralisado pela dimensão dos prevaricadores ou pela sua ascendência histórica ou partidária.
O país ficou lesado, e alguém deve ressarcir os danos. Tão simples como isso.
Aqueles exercícios alegadamente em defesa das leis, que vimos ser implementados por um Executivo que dizia quer cortar com o “deixa-andar”, e que resultaram no encerramento de operações comerciais e económicas de antigos governantes, têm de ser recordados e considerados de implementação urgente. E que ninguém diga que se trata de vinganças. A reposição da verdade e da justiça é algo que pode ser doloroso, mas não deixa de ser necessário.
Todo um povo está atento ao desenrolar dos acontecimentos, e coerência e congruência são chamadas à mesa.

(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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