Thursday, 2 April 2015

Sem “caça às bruxas” a escolha é o fim da impunidade

 
 Navegar entre impunes por excelência e a credibilidade governativa é algo de realização impossível.
Se alguém pensava que a relutância em abdicar do poder na Frelimo era uma questão de manutenção do poder em si, enganou-se em certa medida. A relutância deve ser entendida como instrumento para a salvaguarda do património acumulado.
O “demónio tem medo da cruz”. Quem beneficiou da impunidade judicial tem medo que o seu afastamento das hostes dos que detém o poder ponha em causa o usufruto de sua fortuna.
Os jogos nos bastidores, que decorriam e vão continuar a decorrer, têm em vista garantir-se a sobrevivência de esquemas que regem o enriquecimento ilícito. Nunca foi por este gostar daquele ou vice-versa.
Da Primeira República até ao fim da Terceira República, a promiscuidade entre o judiciário e o executivo, com o beneplácito do legislativo, tem assegurado que relações “incestuosas” persistam.
O poder político, visto como forma de controlo dos processos sociopolíticos, avançou para a detenção de grandes fatias da economia e finanças nacionais. Se antes era um partido-Estado de tendências socialistas em que os detentores do poder tinham acesso às benesses do poder e podiam atribuir-se regalias e salários longe das mãos da maioria, nos últimos tempos abandonou-se a máscara “socialista” e avançou-se abertamente para o abocanhamento de quinhões da riqueza nacional.
Entre a Segunda República e a Terceira República houve alguma caça às bruxas entre “camaradas”. O timoneiro da Terceira República terá, em algum momento, decidido que tinha de “recuperar o tempo perdido”.
A adopção e implementação de um sistema clientelista foram afinadas e apuradas ao mais alto nível. Tudo com base numa centralização viva e omnipresente do poder, a influência e condução efectiva dos assuntos da esfera do judiciário tornaram-se marcas registadas de um regime que emergiu.
Aquilo que receavam muitos dos súbditos do “rei morto” deve ser afastado das suas mentes através de acções concretas que mostrem que o Executivo não quer nem vai embarcar numa caça às bruxas.
Queremos que as pessoas enriqueçam com o seu trabalho e não através de comissões em negócios do Estado.
Queremos separar a coisa pública da coisa privada, de tal sorte que não apareçam agentes do Estado favorecendo agendas privadas, para depois se beneficiarem a eles próprios.
Quando digo “queremos”, refiro-me à maioria dos moçambicanos.
Mas não “caçar bruxas” não deve significar paralisação das instâncias judiciais em encetar acções para recuperar bens públicos, patrimoniais ou financeiros.
Tem de ficar claro que a acção governamental não será dirigida a pessoas específicas do regime passado, numa espécie de vingança.
Mas é evidente que o Governo, o parlamento e a PGR devem ter carta-branca para agir na reposição da Justiça no país.
Esta Justiça deve começar por reformular a PRM, no sentido de esta força paramilitar se situar e conhecer o seu foco. É preciso acabar com a interferência dos “grupos dinamizadores”, qualquer que seja seu nível, naquilo que é a agenda oficial da PRM.
Precisa ficar claro que o país está e estava escorregando para o abismo porque os detentores do poder passaram a tratar dos assuntos do Estado como se de interesses privados.
Na sua busca e protecção de interesses privados, responsáveis de pelouros governamentais esqueceram-se das suas responsabilidades. No lugar de antever e executar planos de mitigação de problemas, o seu tempo passou a ser gasto a monitorar a sua agenda privada.
Com tantos recursos hídricos com potencial de gerar energia eléctrica, um orgulhoso ministro da Energia, Namburete, deixa o país a braços com uma crise energética sem precedentes. Este mesmo senhor sempre disse que era segredo de Estado conhecerem-se os detalhes das contrapartidas da reversão da HCB para o estado moçambicano. Onde andava ele quando era aconselhável investir-se na reabilitação de Chicamba e Mavúzi? Que foi feito em tempo útil para evitar roturas no fornecimento de energia eléctrica? Trocar de PCA quase que periodicamente nunca foi a chave da questão.
Quem fala de energia eléctrica pode falar da água. Foi uma excessiva agenda privada sobrepondo-se ao interesse público que trouxeram o colapso de sectores essenciais para o funcionamento da economia e para o bem-estar geral.
Chegados a este ponto em que se conhecem de maneira geral os constrangimentos para um funcionamento mais fluído e menos problemático na esfera pública, há que potenciar as instituições para que exerçam as suas funções.
Nada será conseguido num só dia, e disso todos temos a certeza.
São os partidos políticos e extraparlamentares, os moçambicanos em geral, que terão que trabalhar no sentido de alcançarem consensos funcionais.
Um ponto de partida que ninguém pode ignorar é que sem honestidade continuaremos “andando às voltas sem encontrar a porta”.
Há espaço para todos e trabalho por executar.
Abandonar estilos e posturas promotoras da exclusão é um passo na direcção certa.
A intolerância deve ser abominada, pois semeia discórdia entre compatriotas.
Os ventos sopram do Norte, do Centro e do Sul. São moçambicanos dos mais diferentes quadrantes que se unem, independentemente da sua filiação partidária, e avançam as suas agendas de paz, inclusão e desenvolvimento.
Nunca foi tão claro que isso é possível.
Os que estavam habituados a cavalgar a maioria para realizarem as suas agendas de enriquecimento ilícito já tiveram tempo e oportunidade para entenderem que a “porca estava ficando sem leite”.
Quem for apanhado pelas malhas da rede anticorrupção não se queixe de perseguição.
Já é tempo para parar com negócios das “arábias”. O comércio criminoso de madeira para a China deve ser travado de imediato pelo Executivo moçambicano. O licenciamento da actividade madeireira não é uma troca de favores entre “camaradas-generais” nem contrapartida para o fornecimento de armas por uma China que não se importa com os nossos assuntos ambientais.
É toda uma cultura de rapina que ser erradicada para o bem de Moçambique e do seu povo.
Todos juntos somos mais importantes do que as fortunas individuais de uma meia dúzia de famílias.
Cabe ao Governo de moçambicano com auxílio do parlamento e da PGR estancar a drenagem de fundos das empresas públicas.
As contas de todas as empresas públicas devem ser urgentemente auditadas e conhecidas.
Só haverá democracia sem sacos-azuis para alimentarem operações secretas de engenharia eleitoral.




(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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