Thursday, 5 February 2015

Até onde alcançam os óculos do Dr. Gilles Cistac?


Beira (Canalmoz) – Caro Dr. Gilles Cistac,
Alguns, uns poucos acomodados nas dependências do regime, estão-se a rir de si. Não é fácil assumir posições iguais às suas, onde muitos afinam pelo politicamente correcto (a mesma prática dos batráquios, rãs e obnóxios), dos que perderam as vértebras por crerem e acreditarem que o certo é o que os patrões dizem e pensam, daí a razão do nosso pobre e pequeno país se encontrar nas mãos dos astutos. 
Caro Dr. Cistac, eu, que não sou constitucionalista, cheguei ao seu caminho por outra via. Lançando mão da Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos, nada obsta a Afonso Dhlakama de lutar para impor a autonomia nas províncias onde ele teve maior votação, consubstanciando que a Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos é um instrumento supraconstitucional, que regula os direitos civis e políticos em todas as Nações modernas do mundo. 
Para consubstanciar a sua pretensão, o líder da Renamo pode invocar que os Estados Partes do Pacto acima referido “comprometem-se a assegurar o direito igual dos homens e das mulheres a usufruir de todos os direitos civis e políticos enunciados” nele – artigo 3 do mesmo Pacto.
O Estado é violador desse Pacto, de que é subscritor há bastantes anos. 
A pretensão desse povo, que parece acolher a manifesta pretensão demonstrada nos banhos das multidões em todos os locais visitados pelo líder, nas seis ou sete províncias reivindicadas, não pode ser defraudada pelo Estado, porquanto a Carta das Nações Unidas reconhece a dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis, sendo estes os fundamentos da liberdade, da justiça e da paz no Mundo, conforme o preâmbulo da Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos, de 16 de Dezembro de 1976.
A Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos reconhece (preâmbulo) que estes direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana. Reconhece ainda que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o ideal do ser humano livre, usufruindo das liberdades civis e políticas e liberto do medo e da miséria, não pode ser realizado a menos que sejam criadas condições que permitam a cada um gozar dos seus direitos civis e políticos, bem como dos seus direitos económicos, sociais e culturais.
A Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promoverem o respeito universal e efectivo dos direitos e das liberdades do homem. Assim, o líder da Renamo tem elementos bastantes na sua pretensão, porquanto sustenta que a soberania deste povo foi capturada por um punhado de gente que detém as rédeas da esfera do poder e controla as instituições jurídicas e de organização/gestão eleitoral.
O presidente da Renamo, como indivíduo, tem deveres em relação a outrem e em relação à colectividade a que pertence e tem a responsabilidade de se esforçar por promover e respeitar os direitos reconhecidos no presente Pacto, servindo-se da legitimidade que o voto lhe concede, pois sabe-se que o vencedor das eleições foi proclamado sem que para tal se baseasse na soma aritmética e parcelar dos editais das assembleias dos votos, em pretensa acção tendente a favorecer o candidato da Frelimo.
Ora, Caro Dr. Cistac, a pretensão da Renamo e do seu líder tem cabimento, pois as províncias autónomas têm por objectivo (artigo 1 da Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos) que todos os povos tenham o direito a dispor desses mesmos direitos civis e políticos. “Em virtude deste direito, eles determinam livremente o seu estatuto político e dedicam-se livremente ao seu desenvolvimento económico, social e cultural”, como se extrai do segundo parágrafo do mesmo artigo.
Para atingir os seus fins (de autonomia, sem que se os qualifique de divisionistas), (artigo 1, número 2): “todos os povos podem dispor livremente das suas riquezas e dos seus recursos naturais, sem prejuízo de quaisquer obrigações que decorrem da cooperação económica internacional, fundada sobre o princípio do interesse mútuo e do direito internacional. Em nenhum caso pode um povo ser privado dos seus meios de subsistência”.
Para dar provimento à pretensão da Renamo e do seu líder, o artigo 2, número 2 da Carta das Nações Unidas dos Direitos Civis e Política fixa que “os Estados Partes no presente Pacto (no caso o Estado Moçambicano), incluindo aqueles que têm a responsabilidade de administrar territórios não autónomos e territórios sob tutela, são chamados a promover a realização do direito dos povos a disporem de si mesmos e a respeitar esse direito, conforme às disposições da Carta das Nações Unidas”.
Cada Estado Parte no presente Pacto compromete-se a adoptar, de acordo com os seus processos constitucionais e com as disposições do presente Pacto, as medidas que permitam a adopção de decisões de ordem legislativa ou outras capazes de dar efeito aos direitos reconhecidos no presente Pacto que ainda não estiverem em vigor, conforme o número 1 do artigo 2 daquele instrumento jurídico.
A pretensão dos povos das províncias de Sofala, Manica, Tete, Zambézia, Nampula e Niassa, se se atender legítima, da criação de províncias autónomas, não ameaça a existência da Nação. 
Diferentemente do que um representante dos advogados referiu, visto deste modo, o líder da Renamo não deverá ser submetido à tortura nem a pena ou a tratamentos cruéis, inumanos ou degradantes (artigo 8, número 1 da Carta das Nações Unidas para os Direitos Civis e Políticos), apenas por evocar os direitos de seu povo a uma autonomia administrativa. O Pacto é claro: “Ninguém pode ser privado da sua liberdade a não ser por motivo e em conformidade com processos previstos na lei”, artigo 9, número 1).
Nestes termos, o presidente da Renamo como pessoa acusada de infracção penal é de direito presumido inocente.
No momento em que o líder da Renamo afirmou sobre a necessidade de regiões autónomas estava consciente de que não poderá ser condenado por actos ou omissões que não constituam um acto delituoso, segundo o direito nacional ou internacional, em se tratando, como você afirmou, a lei moçambicana não limita a autonomia.
Assim sendo, de acordo com o princípio geral de direito reconhecido pela comunidade das nações, a Carta das Nações Unidas opõe o julgamento ou a condenação do Presidente da Renamo.

 (Adelino Timóteo)

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