Tuesday, 17 February 2015

20 anos de artifícios e malabarismos e “ratices”

 
Tudo indica que esta etapa está chegando ao fim

 Uma era de imposição e de batota institucional o tempo todo, alicerçada numa orgânica republicana de fachada, em que o judicial obedecia ao executivo e em que o legislativo agia através da ditadura do voto, levou o país a revisitar o confronto militar entre os que todos queríamos que continuassem ex-beligerantes.
Arranjos “pré-históricos” de sucessão no seio da Frelimo quase levavam o país a uma alteração da Constituição da República. Gastaram-se milhões para alterar vírgulas, num processo que merece uma comissão de inquérito, pois não se pode dar liberdade de um grupo de cidadãos para “roubarem” em pleno dia o que aos moçambicanos pertence.
Afinal Armando Emílio Guebuza e o seu partido que queriam, quando avançaram com a criação de uma comissão parlamentar com missão de conduzir o processo de alteração da CRM?
O topo da elite que sempre governou Moçambique estava crente no seu reino de “mil anos”, mas a resistência titânica dos moçambicanos derrotou essas pretensões. Após uma sacudidela autárquica, que desmontou sucessivamente a sua “invencibilidade”, a Frelimo, encurralada, teve que recorrer a um sistema judicial por si controlado, para surgir como vencedora das eleições de 2015.
Há um cancro consumista e de clientelismo que tomou conta da Frelimo.
Alas e alas, críticos internos e externos, uma liderança que resumiu tudo ao “tacho” asfixiou de morte aquele partido histórico.
A emergência dos ministros-empresários caracterizou de sobremaneira a Terceira República. Se, com Joaquim Chissano, as coisas se faziam temerosamente e às escondidas, com AEG ser ministro-empresário tornou-se a marca registada. Todo o palavreado e teorias marxistas e leninistas de ontem foram incinerados e deitadas no Oceano Índico. Uma forte oposição interna liderada por resíduos daquela esquerda estalinista foi sufocada e removida cirurgicamente dos órgãos directivos da Frelimo. Uma situação que nunca havia sido equacionada. Alguns até espaço de opinião perderam nos órgãos de comunicação social públicos. Aqueles que pontificavam na Segunda República tiveram que optar entre fidelidade ao novo “imperador”, ou perder fortunas que só o diabo sabe como foram conseguidas.
Entretanto a oposição política evoluiu até chegar a governar dois importantes centros urbanos do país.
Uma escorregadela estratégica do Governo de AEG levou a desencadear acções militares fulminantes que não conseguiram debelar a liderança da Renamo.
Houve como que tiros contra os seus próprios pés por causa da recusa de incluir os outros nos assuntos nacionais. Uma cúpula teimosa e recalcitrante ficou míope e foi engolida pelo poder que vinha exercendo.
Não estaremos mentindo se dissermos que se apoderou da elite governante um grave complexo de superioridade. De maneira simultânea o “chefe” mostrava-se indisponível para diálogos sérios e abertos com a oposição, a sua fauna acompanhante embarcava numa ofensiva de culto da personalidade. Medíocres como tudo o que se assemelha, os dois projectos falharam.
Alguns, que já não conseguiam engolir “sapos”, simplesmente se demitiram de forma encoberta e jamais esclarecida ao público.
Os acérrimos defensores dos cargos que ocupavam especializaram-se em elogiar e lambuzar. O “homem dos imperativos”, o “homem das aberrações”, o “homem das vírgulas”, a senhora “catequista de Nampula”, todos cantaram suas hossanas, mas nada demoveu os moçambicanos quanto ao que queriam e quanto ao que era a sua posição.
Mesmo para mau entendedor, a impressão que ficou é que a Frelimo perdeu as eleições de 2015. É preciso ver o desaparecimento dos editais como forma de garantir a manutenção do poder.
A resposta confusa e tímida da bicéfala Frelimo/Governo, quanto à pressão exercida pela Renamo e pelo MDM, a capacidade real demonstrada pela Renamo, num passado recente, de confrontar-se com êxito contra as FADM/PRM/FIR, o reconhecimento de que os “curiosos” do centro e Norte são reais apoiantes de uma mudança recusada por uma CNE/SAE/CC controlada pela Frelimo, tudo isto transformou Moçambique e desmontou teses de renomados analistas e comentaristas.
Quem se supunha possuidor de elementos de análise fundamentados e de uma opinião útil para servir o regime do dia foi ultrapassado pelos acontecimentos. Muitos não terão sido consultados quanto à mudança de direcção. Os G40 terão ficado inúteis no quadro da nova estratégia da Ponta Vermelha. Parece que a “Pereira do Lago” e a Ponta Vermelha se afastam a olhos vistos, embora ninguém queira oficialmente reconhecer.
Há uma missão histórica e patriótica que tem de ser levada a cabo com muita seriedade e responsabilidade: manter a paz e conseguir a despartidarização do Estado e das Forças de Defesa e Segurança. Paralelamente, credibilizar o sistema judicial e assegurar que os próximos exercícios eleitorais decorram de forma livre, justa e transparente.
Essa é a batalha complexa de hoje e de amanhã. Esses são os alicerces de um Moçambique independente, desenvolvido e pacífico, forte e orgulhosos de todos os seus filhos.
Sem fintas, nem complexos de superioridade, com realismo e coragem somos todos chamados a dar nosso contributo em mais uma epopeia histórica.
Temos a oportunidade de sermos um exemplo a seguir em África.
Os únicos vencedores no fim serão os moçambicanos.




(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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