Tuesday, 4 March 2014

Esticar a dívida pública com o fim do mandato?

Em benefício dos mesmos de sempre?…

Maputo (Canalmoz) – É preciso analisar com apreensão e sensatez toda uma ofensiva de endividamento que corre em período de fim de mandato do actual governo de Moçambique.
A coberto de “facilidades” parlamentares e de uma liberdade alicerçada na impunidade, o gover...no decidiu enveredar pela via de criação de parcerias público privadas de dimensão muito importante, mas muito longe do escrutínio público.
Nos tempos da guerra civil e porque o parlamento era parte do partido único, obviamente que não seria fácil questionar a razão de determinada decisão tendente a endividar o país. Hoje mesmo em plena vigência de um parlamento multipartidário as dívidas contraem-se e crescem a olhos vistos sem que nada seja dito ou informado aos deputados e ao povo em geral.
Negócios de utilidade pública muito duvidosa surgem como cogumelos e sempre chancelados pelo governo.
Quando se procura por alguma lógica por detrás de algumas decisões de investimento a resposta que se recebe não é satisfatória. A maioria dos deputados nem se dá ao esforço de perguntar algo que seja ao governo quando este se apresenta no parlamento. É um autêntico show business de discursos e elogios sem substância ou pelo menos sem o tipo de consequências que os cidadãos anseiam.
Numa economia de mercado seguindo modelos mais ou menos liberais seria de esperar que a iniciativa privada recebesse promoção e atenção dos governantes. O que se pode verificar é que todos os dias é o governo anunciando a sua participação em investimentos ou aliando-se ao capital privado internacional para implementar projectos de cariz eminentemente económico. Chamadas no agora palavreado politicamente correcto de parcerias público-privadas, de elogiar se efectivamente assim fosse, há fundadas suspeitas de que são formas engenhosamente utilizadas para alguns membros do executivo se tornarem accionistas e sacarem vantagens financeiras. Primeiro cria-se uma empresa daquela natureza e depois a parte do Estado é entregue a algum membro da nomenclatura num esquema que qualquer “estranho” mesmo que seja moçambicano participe. Estrategicamente situados a montante e a jusante de qualquer iniciativa, existem estes “pescadores” de benesses apanhando e abocanhando tudo o que interessa.
Em tempo de fim de mandato regista-se uma aceleração na constituição de joint-ventures.
Europeus aflitos com a situação económica e financeira em seus países abrem mão de qualquer preceito de cooperação sã entre países. Se é comum dizer-se que Angola financia Portugal numa reversão ou correcção histórica das relações económicas e financeiras, Moçambique serve de prato predilecto de todo o tipo de investidores. Escrupulosos ou desconhecidos e sem créditos firmados ou conhecidos, tudo pode ser um negócio. É estranho mas compreensível que a França, país adulto e democracia madura, abraços com problemas conhecidos de esgotamento e crise económica e financeira entre em determinados negócios. Mas François Hollande, apertado por uma impopularidade progressiva, ciente de que o emprego em França é vital, não hesitou em autorizar uma operação financeira de vulto para alavancar uma empresa embrionária de captura de um atum que uns já denominam por outros termos.
A velocidade recorde de estabelecimento da empresa moçambicana que fará tal pesca, num sentido que coloca a “carroça à frente dos bois” levantou suspeitas ainda não dissipadas. Satisfazer a França ou no movimento assegurar vantagens estratégicas e de vulto num empreendimento que os protagonistas são servidores públicos devendo obediência aos que tomaram a decisão.
Estranhamente, mas de modo completamente normal, segundo os padrões do dia, ninguém entre os deputados vem a público explicar como se deu ou aconteceu o negócio.
O antes “militante” Grupo Moçambicano da Dívida praticamente nada diz, talvez por receio de um bombardeamento partindo dos altos comandos de quem dirige a operação ou seus operacionais de campo. Os partidos políticos da oposição fazem algum burburinho mas sem aprofundar a questão como se impõe. O endividamento do país deve obedecer a um conjunto de pressupostos, tudo no sentido de não acarretar ou significar peso acrescido numa balança de pagamento já deficitária.
Esta “brincadeira” de endividamento público deve ser analisada com olhos de ver. Estaremos a contrair dívidas em nome do Estado, a serem pagas pelos impostos de todos para benefício de algumas figuras de proa de um regime em fim de mandato?
Estaremos a ser utilizados por uma máfia erradamente chamada de governo para sacar fundos de uma maneira que não nos querem explicar?
É perigoso para a soberania nacional que o endividamento não seja sustentável.
Levanta todo o tipo de questionamentos em fim de mandato o executivo entre em negócios de vulto com entidades suspeitas segundo se pode ler na imprensa internacional. Salvar um estaleiro naval sem obras na França endividando o país será em benefício de quem?
Assuntos de consequências profundas na capacidade financeira do Estado nos próximos anos são tratados de ânimo leve perigoso.
Se por um lado toda uma conjuntura matou a indústria de pesca nacional, por outro lado vê-se o Estado entrando no mesmo negócio sem aprovação da Assembleia da República. Governo tem prerrogativas mas estas não são a de endividar gerações futuras sem que o país colha benefícios.
Os que antes diziam que a dívida era insustentável e que aniquilava os esforços de desenvolvimento do país estão calados ou estão amordaçados? Terá havido alguma troca de mensagem a respeito?
Julgando pelo que nos é dado a ver, alguém está a governar como se o país fosse propriedade privada de alguns de “sempre eleitos e especiais”.
Politicamente haverá que repensar acordos assinados e eventualmente revogá-los porque os legítimos interesses do país não estão a ser acautelados.
Não se pode vender gás ao desbarato e depois comprar mesmo gás a preços de mercado. Não faz sentido que uma infra-estrutura seja estabelecida no país, sabendo-se que de pouco vai servir o país. Atrair investimentos estrangeiros de vulto que vão viabilizar a exploração de recursos naturais tem de conhecer outra lógica e sentido.
De outro modo, não faria qualquer sentido ter-se consentido sacrifícios e derramado sangue pela conquista da independência. Nos actuais moldes a luta pela democracia política que significou uma guerra civil de 16 anos não tem nenhum sentido.
“Carne barata” de predadores internacionais, apoiados por suas máquinas governamentais é um destino inglório e inaceitável…
Quem não traz consequência e benefícios para a maioria dos moçambicanos tem de ser democraticamente afastado de lides governativas…



(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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