Thursday, 10 November 2011

Maputo aos 124 anos: Destino ditado pelas circunstâncias


AINDA na ressaca de ter acolhido dois grandes eventos históricos, nomeadamente os X Jogos Africanos e os 25 anos da tragédia de Mbuzini, Maputo celebra hoje 124 anos após a elevação ao estatuto de cidade. São 124 anos que desafiam a sua existência e história caminhando com vista à afirmação de um destino que as circunstâncias determinam.

Maputo, Quinta-Feira, 10 de Novembro de 2011:: Notícias


Algumas cidades de renome estão fadadas a uma existência normal, previsível. Outras como Maputo não têm, não tiveram e possivelmente terão esse privilégio. Tudo está a acontecer de repente desafiando a tudo e todos. A cidade das acácias está em transformação mesmo por conta das circunstâncias. As autoridades gestoras encontradas em contra-pé tentam a todo o custo remar como forma de pôr ordem e adiar um possível caos.
Muita coisa ainda ficou por fazer. Desde o crónico e incompressível problema de lixo, as estradas esburacadas, sarjetas e drenagens a reclamar limpeza compatível, o controlo do tráfego, estacionamento, o tratamento do parque arbóreo, do qual já derivou o nome de “cidade das acácias”, a urbanização ao já embriagante, marcante e visível problema do transporte.
Aliás, quatro paradigmas marcam neste momento a vida e o quotidiano dos “maputenses”. Trata-se da crónica falta dos transportes que, apesar dos esforços empreendidos, a solução ideal tarda a acontecer, a gestão dos resíduos sólidos que está melhor do que ontem, do solo urbano numa cidade em rápido crescimento e o crescente desemprego, principal fonte do negócio da esquina.
A face mais visível dos problemas que a cidade vive hoje é certamente a dos transportes. Longas e esgotantes filas nas paragens anunciam diariamente o desespero de muitos citadinos. No esforço que os citadinos fazem quotidianamente para se fazerem aos postos de trabalho têm de gastar invariavelmente 50 meticais só num sentido, num cenário em que a insegurança prevalece quando, não raras vezes, tem de se recorrer às camionetas a caixa aberta, que se multiplicam que nem cogumelos e que serpenteiam da cidade do caniço ao cimento.
O ritmo em que as coisas acontecem é estonteante. Muitas destas pessoas demandam a cidade idas de bairros que há um par de anos eram habitat de répteis e corujas. Os serviços do município chegaram para se entrosar na desordem já estabelecida. Faltam arruamentos, as construções desordenadas se impuseram face à falta de um plano de estrutura, privados reinam no abastecimento do precioso líquido e para completar o cenário, faltam espaços para impor bens públicos mais preciosos, como a escola.
Este cenário contrasta, no entanto, com a realidade na zona do cimento. Gruas e mais gruas anunciam a nova moda dos condomínios e escritórios. A cidade virou um gigantesco canteiro de obras a tal ponto que se contam hoje a dedo os espaços vagos. A par e passo os condomínios estão a empurrar o caniço para outros lugares de tal jeito que até se pretenda mudanças de nomes tradicionais como Polana-Caniço para “Sommershield II”, configurando crise de identificação.
Apesar de a cada dia que passa se construírem novos edifícios e proliferarem novos projectos, um dos mais emblemáticos são as duas torres do Banco de Moçambique, cuja construção deve arrancar brevemente, e o edifício de 47 andares em vista no espaço dos Correios de Moçambique, constata-se que ainda persiste um défice em termos de habitação social. A requalificação da Mafalala e agora do Chamanculo é exemplo feliz que tira as nódoas representadas pelos bairros suburbanos na maioria desalinhados.
A construção de silos-auto, os parquímetros e os “sentido único” são um aviso aos tempos que correm e ao previsível caos que se avizinha. O tráfego intenso já é um problema e as artérias da cidade já não têm a fluidez desejada.
Devido ao estilo de vida vigente, várias doenças já se manifestam como sejam a “condomitite aguda”, a “metropolitite” e a “asfixia citadina”. Esta última resultante do entupimento das artérias da cidade. Tal é o efectivo de automóveis que calcorreiam as ruas. Pululam carros de todas as marcas e feitios desde o básico Toyota Corrola, vulgarmente conhecido por “rhambo”, os “assassinos” Mark II, aos cobiçados e temíveis “bêbados”- Audi Q7, os Land Cruiser V8, VX, Navarras, BMW X6, Mercedez CLS 350, ao Licoln Navigator, às mãos de uma classe média alta emergente assente no comércio e na política. Estes potentes carros transitam, no entanto, por estradas apinhadas de vendedores informais que lutam pela sobrevivência.
Enquanto tudo isto acontece no coração da cidade, que se pretende abrir a cada vez maior fluxo de turistas, a erosão e a subida dos níveis do mar carcomem, que nem um cancro, o que de mais belo a cidade tem – as suas praias. O futuro de uma cidade turística que acaba de ganhar um novo símbolo, a estátua de Samora Machel, na Praça mais emblemática da cidade, está pouco a pouco a ser adiado ao ritmo das ondas do mar que são cada vez mais violentas e ao atraso de uma solução à altura dos desafios das mudanças climáticas que não poupam até cidades com apenas 124 anos como Maputo.
Estes são os contrastes de uma cidade em franco crescimento e que cada vez mais requer uma negociação entre o bem e o mal, da pobreza e da riqueza.

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