Friday, 28 October 2011

As marchas pela “libertação económica”, dos “indignados” e "Occupy Wall Street"

Moçambique é uma pátria de mistérios. São esses mistérios que o tornam um “país pólvora” que, a qualquer momento, pode explodir. De que lado, ninguém sabe. Quando o mundo marcha, os moçambicanos dormem. Quando o mundo dorme, os moçambicanos continuam a dormir. Nunca acompanham a evolução do mundo. É perigoso viver uma situação desta natureza. Mas isso revela a perigosidade que o moçambicano representa. Um indivíduo que não reage às provocações é perigoso. Isso devia preocupar o Governo, porque, de certeza, não significa a passividade dos moçambicanos. Muito pelo contrário pode significar a acumulação de raiva. Uma sociedade assim é tão perigosa quanto os líbios que, durante 40 anos, se fizeram cidadãos pacíficos, que morriam de amor pelo seu presidente, quando, na verdade, andavam a acumular raiva. De amado, Kadafi passou a odiado e, de estimado, transformou-se num animal de atracção populacional à imagem de “João Tokwene” do nosso jardim Zoológico nos anos 90. Todos queriam ver o cadáver daquele que até há oito meses era venerado.
Mia Couto disse, recentemente, em Portugal, que “é preciso sair à rua, é preciso revoltarmo-nos, é precisa esta insubordinação”. Interrogado pela agência Lusa sobre o movimento dos “indignados”, Mia Couto admitiu que preferia a ingenuidade combativa dos manifestantes “à resignação, que acaba por ser uma aceitação antecipada de um veredicto que é o da marginalização e o da redução ao nada”. E acha “que só há que saudar gente que faça coisas e não cruze os braços, mesmo que ainda não compreenda exactamente qual é a saída. Pelo menos vem dizer que não aceita o que está a acontecer, e isso é importantíssimo”.
Na verdade, mais do que acumular raiva para descarregá-la nas pessoas que nada decidem sobre o destino do país, como aconteceu nas manifestações de 1 e 2 de Setembro do ano passado – queimaram viaturas e saquearam lojas de pessoas inocentes – é preciso que sejamos indignados como os “Indignados” europeus; que sejamos uma “geração à rasca” como em Portugal. Também é preferível sermos como os “Occupy Wall Street”, nos Estados Unidos, a acumularmos frustração.
O Governo precisa de ter consciência de que as medidas de austeridade devem fazer-se sentir mais nos seus membros do que no cidadão que ganha um salário insignificante já corroído pela inflação, um cidadão que não é proprietário de nenhuma empresa, nem detentor de nenhuma riqueza. Refiro-me ao cidadão que, com o seu salário – não beneficia de nenhum subsídio –, tem que adquirir alimentos para todo o mês, pagar transporte – com encurtamento de rotas – para os seus filhos, além de pagar renda de casa, impostos, água, luz, taxas de lixo, da rádio, etc.. Tal como dizia Mia Couto: “Dizem-nos que o mundo está mal e que o mundo precisa do nosso sacrifício, de que entendamos a situação, mas acho que, uma vez mais, estão a pedir sacrifícios a quem sempre foi pedida a mesma coisa”. Se um servente vive com 2 500 Mt, por que um governante não pode viver de 100 mil meticais sem subsídio? Por que o Governo insiste em importar 250 viaturas de luxo para deputados que nada representam os interesses do povo?
Ontem, na África do Sul, Julius Malema organizou uma manifestação que juntou mais de 10 mil jovens e adultos para pedir a “libertação económica”. O ANC consentiu a manifestação e apenas pediu que fosse ordeira. E foi. Manifestação é demonstração de indignação pelo que não se faz por nós. Não é vandalização, ser arruaceiro, marginal, como tem acontecido, e “bem” dizia o desastroso ministro do Interior, José Pacheco.
A pátria chama por nós. O barco está a afundar. Quando o governo insiste em tomar decisões marginais, temos de o obrigar a tomar decisões do fundo. Se não quer tomar nenhuma, temos de o obrigar a tomar várias. Essa é a lógica da democracia.
Controlar a imprensa é um exercício inútil. Calar é uma atitude de cobardia. O silêncio pode revelar um carácter de perigosidade. O Governo deve estar mais preocupado com o silêncio do que com a crítica.

Lázaro Mabunda, O País

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