Wednesday, 29 September 2010

Um crescimento económico que não beneficia às populações é nulo

- considera o economista Carlos Nuno Castel-Branco, em entrevista exclusiva ao Canalmoz

Nos últimos 15 anos, a taxa do crescimento do país varia entre 7% e 7,5%, mas a taxa da produção é de 1,2% por ano. Esta taxa é a metade da taxa do crescimento da população, o que significa que, todos os anos, há menos comida per capita, mas há uma economia per capita mais rica” – Professor Castel-Branco “Se a riqueza que a gente produz é acumulada por um grupinho que fica cada vez mais rico! Então, porque é que vamos trabalhar?” - idem

Nampula (Canalmoz) – O “robusto” crescimento económico de Moçambique, considerado dos melhores do continente africano, de nada vale para o país se não se reflecte na melhoria das condições de vida dos cidadãos. “O crescimento económico deve servir às pessoas, tem que servir à grande massa da população do país. As pessoas precisam de melhorar as suas condições de vida”, referiu o professor de Economia, Carlos Nuno Castel-Branco, falando ao Canalmoz em Nampula, à margem do lançamento do Plano Estratégico Provincial de Nampula, onde ele participou como um dos oradores.
Castel-Branco prosseguiu afirmando que “o crescimento económico só tem sentido se resolver o problema das pessoas”. “Se o crescimento económico é grande e as pessoas não conseguem comprar roupas, não conseguem ir à escola e satisfazer outras necessidades, não serve de nada”, afirma, repudiando as políticas económicas do Governo do dia.

A razão das manifestações

O economista deu ainda ao Canalmoz – Diário Digital e Canal de Moçambique – Semanário, a sua interpretação sobre as razões das manifestações populares de 1 a 3 de Setembro. “Alguns se admiram que tenha havido aquela revolta, se há crescimento económico”. As manifestações aconteceram porque “o crescimento económico não serve o interesse das pessoas e estas pessoas não vão dizer que eu como o crescimento económico, eu visto o crescimento, eu durmo o crescimento económico”, rematou.
“Medindo pela taxa do crescimento do PIB, estamos em franco desenvolvimento económico, ninguém pode negar. A questão é que este crescimento não beneficia as pessoas. Por exemplo, nos últimos 15 anos a taxa do crescimento do país ronda os 7% e 7,5% e a taxa da produção alimentar anda a 1,2% por ano, e esta taxa é a metade da taxa do crescimento da população, o que quer dizer que todos os anos há menos comida per capita, mas há uma economia per capita mais rica”, considerou Castel-Branco.
Ainda na semana passada, o Governo aprovou a proposta do Plano Económico e Social para o ano de 2011, onde prevê um crescimento da economia em 7,2%.

Em Moçambique, quem trabalha nada ganha

Numa outra perspectiva, questionámos ao economista sobre o discurso de algumas personalidades ligadas ao Governo, segundo o qual, “falta cultura de trabalho aos moçambicanos.”
O economista respondeu que “o facto é que em Moçambique os ganhos não se reflectem na qualidade do trabalho. O que adianta trabalhar se os ganhos não compensam? Este país não é aquele país em que as pessoas que mais trabalham ganham mais. Então, por causa disso, nós temos um problema, a cultura de trabalho não é eu levar uma pessoa à escola e dizer que você deve ser um bom trabalhador. A cultura de trabalho tem que estar ligada com as condições de trabalho. É preciso trabalhar mais, é preciso trabalhar melhor, mas para isso, entre outros factores, temos que ver a quem beneficia o trabalho que fizemos”, disse.
Para ser mais directo, Castel-Branco especificou: “a riqueza que a gente produz é acumulada por um grupinho que fica cada vez mais rico! Então, porque é que vamos trabalhar?”, indagou.

A crítica aos mega-projectos

Antes de nos conceder a entrevista, falando durante o encontro do lançamento do PEP (Plano Estratégico Provincial de Nampula), o economista disse que as isenções fiscais atribuídas aos mega-projectos são prejudiciais ao país.
“O incentivo fiscal se aplica sobre o investimento, e 85% do investimento privado em Moçambique é estrangeiro, ora as empresas menos beneficiadas pelos incentivos são precisamente as pequenas e médias empresas nacionais”, disse o Castel-Branco, explicando que “com este tipo de estrutura de incentivos fiscais, o país perde muita riqueza e perde a oportunidade de, retendo alguma desta riqueza, poder usá-la para gerar outras coisas, para gerar melhores serviços, para ter uma base produtiva mais alargada, para melhorar a qualidade da educação, para fazer a formação técnico profissional”.

Nampula sem retorno do que nela se produz

Quanto à província de Nampula, Carlos Nuno Castel-Branco diz que a riqueza desta que é província mais populosa do país e com abundância de recursos minerais e florestais, não está a servir plenamente a respectiva comunidade. “Não se verifica o retorno necessário para a economia nacional e para a província. Em parte, por causa destes incentivos”, considera.

(Aunício da Silva, CANALMOZ)

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