Thursday, 17 June 2010

Quando se zangam as comadres, descobrem-se as verdades...

…Ou quando o Quarto Poder se exclui e colabora com os lesa-pátria...

Beira (Canalmoz) – Se havia alguma dúvida sobre o que movia a maioria dos jornalistas moçambicanos, um facto aparentemente não ligado a eles e nem por eles iniciado ou investigado teve a virtude de mostrar para todos o tipo de jornalistas que temos.
Ao mesmo tempo veio validar a tese de que temos uma maioria de intelectuais de trazer no bolso, pois para pouco mais servem.
As diferentes abordagens que abundam na imprensa moçambicana, e elaboradas por jornalistas moçambicanos, sobre o alegado treinamento de terroristas em solo moçambicano só podem espantar aos observadores menos atentos.
Quase todos se pronunciam no sentido e em defesa da soberania nacional, sem olhar para o outro lado da mesma questão. Há já muito tempo que se ouvem e se observam sinais inegáveis de todo um procedimento que coloca a defesa da soberania em risco prático e concreto.
A equação de defesa da integridade e soberania nacionais constituem questões que ultrapassam conveniências partidárias e dizem respeito a todos nós, enquanto cidadãos de um país independente.
Quando do lado da comunicação social pública e alguma ligada aos que realmente decidem e governam este país só se tem um silêncio preocupante, estamos perante uma maneira de estar perigosa para a real soberania nacional. É raro, para não dizer “nunca”, acontecer agentes de tal comunicação virem a público e tratarem de assuntos como o estado e as práticas da Migração nacional. Em Moçambique entra quem quer e introduz-se o que se queira, desde que se saiba utilizar os esquemas apropriados.
Na febre de enriquecer e recuperar o tempo perdido, instalou-se uma cultura de atropelo feroz das leis. E um clima de impunidade florescente favoreceu essa cultura. Em quase todos os sectores de actividade, e até mesmo da parte daqueles que se julgava estarem acima de práticas comprometedoras da segurança nacional, observam-se procedimentos de funcionários que colocam em perigo todo um Estado.
Esta é a situação, em termos resumidos. Falar e abordar estas questões nunca foi tão necessário. O país está a sofrer uma derrapagem nos seus esforços para se reerguer e se afirmar no contexto das nações.
Utilizando uma auto-censura castrante e uma atitude de esconder abertamente o que se sabe e se tem consciência de que é maléfico para os moçambicanos, vemos jornalistas fechando-se em si e explorando vias que só favorecem a manutenção de uma situação insustentável. Não se fala dos processos de “procurement” que levaram à escolha da entidade privada emissora dos documentos de identificação nacionais, porque isso não está em sintonia com o que a chefia do país quer e, aparentemente, mandou fazer. Os desmandos nos diversos sectores de actividade até têm sido oportunamente identificados por entidades competentes, mas daí não resulta nenhuma acção para corrigir o que foi declarado abertamente errado e contrário às leis nacionais.
Por troca de dinheiro estabelecem-se os mais estranhos procedimentos, e depois não se faz nada para contrariar essa maneira de agir, que é efectivamente contra a tal “Pátria Bem Amada” e denominada poeticamente de “Pérola do Índico”.
A comunicação social pública, e alguma que com ela é relacionada, está a contribuir todos os dias para a venda retalhada dos interesses nacionais, ao recusar-se a denunciar práticas reconhecidamente lesivas para o país.
É importante e urgente que se trabalhe no sentido de trazer ordem e respeito para com os órgãos de soberania. É necessário e urgente que se faça o recrutamento de agentes para a PRM que correspondam a um perfil que signifique uma maior capacidade de operar e lidar com os fenómenos da sua responsabilidade. Não se pode continuar a permitir que o nosso país seja um paraíso para traficantes de toda a espécie e que as autoridades simplesmente façam de conta que tudo está a andar bem. O fenómeno da criminalidade e as suas consequências sociais tem de ser tratado conforme convém e é necessário, de acordo com os preceitos da Boa Governação.
Os órgãos de soberania, o Parlamento, as organizações da sociedade civil, as Forças de Defesa e Segurança têm de acordar do sono ou hibernação em que se colocaram e retomar as rédeas do poder neste país.
Urge emprestar seriedade às acções e cumprimento das directivas de funcionamento dos diferentes órgãos e entidades governamentais.
Não se pode ficar à espera que sejam os outros que venham dizer o que temos de fazer para governar o nosso país.
A situação prática de ser um corredor para toda uma indústria migratória que utiliza o país para transferir recursos humanos e materiais para lugares antecipadamente designados não corresponde ao interesse nacional na frente da soberania e da defesa da integridade territorial. A planificação orçamental, a identificação das necessidades de formação dos recursos humanos, a normalização governativa em geral correspondem aos objectivos e à agenda nacional. Então há que fazer de tudo para que isso aconteça.
Não se pretende ensinar a governar a quem está no poder, mas sim afirmar que só é possível governar quando se tem a capacidade de escutar os governados.
A falta de consistência e continuidade na acção, que determinados departamentos governamentais exibem, pode ser um dos reflexos da falta de sentido e de atitudes públicas dos executores. O dilema da pobreza afecta todo o funcionamento da máquina governamental. Ministros, directores nacionais, governadores provinciais, administradores de distrito, professores, médicos, enfermeiros, profissionais de todas as áreas, polícias e soldados vivem num mundo real em que que as circunstâncias favorecem o desenvolvimento de práticas corruptas. Quem não ouviu sobre os problemas de “procurement” no Ministério da Saúde? Quem não se apercebeu que as folhas de salários do sector da Educação tinham problemas na Zambézia? Quem não leu sobre os rombos financeiros na Direcção Provincial de Finanças de Manica? Quem não leu sobre irregularidades nas Finanças de Inhambane, ao ponto de se distraírem e anunciarem num jornal público um concurso para o fornecimento de material político para o partido no poder?
Quem não tem conhecimento de que, na Beira, um imóvel do Estado, os antigos Correios, foram alienados em troca com um edifício declaradamente de menos valor? Quem não tem conhecimento de que há planos de utilização de instalações do Ministério da Defesa por privados? Quanto património dos Caminhos de Ferro de Moçambique não mudou de mãos através de processos ilícitos?
Mas devidamente que os agentes da comunicação social pública não se referem a estes ou outros factos, porque alegadamente lesariam as aspirações de quem governa o país.
Combater a pobreza, governar o país, realizar e concretizar uma agenda com impacto positivo e visível para os cidadãos de Moçambique requer algo mais que trabalhar para encher a barriga.
Estabeleceu-se uma perigosa maneira de estar em certos quadrantes da vida política nacional. A troco de favores e numa atitude mercenária, pessoas com responsabilidades aceitam calar-se e deixar a banda passar.
É um muito mau serviço ao país ver certas intituladas personalidades do jornalismo alinharem por um silêncio cúmplice perante certos factos que alegam serem do domínio restrito. Em nome da segurança, permite-se que assuntos de interesse público sejam retirados e jamais apresentados ao público. Mas quem sofre as consequências são os cidadãos.
Aquando da febre dos transportadores humanos de drogas do Brasil, houve detenções de correios humanos moçambicanos, mas os seus patrões ou zarparam ou jamais se falou deles. Aquelas moçambicanas que foram apanhadas em aeroportos moçambicanos não tinham por si recursos financeiros nem ligações que lhes permitissem irem viajar para o Brasil e adquirirem as mercadorias proibidas que traziam para Moçambique. O dinheiro que a maioria não tem, tem sido utilizado de maneira a garantir o silêncio.
Infelizmente temos directores de órgãos públicos aceitando calar-se e actuarem em sintonia com determinados interesses, em vez de promoverem um debate nacional activo e significativo. Temos uma “corja de corvos”, que se supõe insubstituível, cavalgando com autorização plena de fazê-lo.
Desde que não se esqueçam de censurar e auto-censurar, interessam aos detentores do poder.
Está claro que assim não se combate pobreza alguma nem se promove a auto-estima nacional.
Assim a única coisa promovida é a mediocridade institucional e a corrupção desgastante.
Por hoje vou ficar por aqui... (Noé Nhantumbo)


Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo, CANALMOZ, 16/06/10


NOTA DO JOSÉ =
Mais um excelente texto do Noé Nhantumbo que mercece uma profunda reflexão. Eu também questiono a postura de muitos jornalistas e intelectuais!

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