Wednesday, 19 May 2010

Não há transparência nas contas da Assembleia da República

Acusa a Renamo


“Não quero dizer que alguém roubou ou desencaminhou, mas é preciso que isso seja expresso na Conta, e que os gestores justifiquem qual foi a aplicação dada a este dinheiro. Agora, o que não podem fazer é manterem-se calados. Isso verifiquei somente em alguns documentos a que tive acesso. Quanto à contabilização e classificação, deve ser pior. Portanto, isto deve ser a ponta do ‘iceberg’”, declarou José Samo Gudo, da Renamo, que acrescentou que o que a sua bancada pretendia saber é quanto a AR gastou no exercício económico de 2009 e quanto resta nos cofres, o que ninguém está a conseguir esclarecer.

Maputo (Canalmoz) – A Renamo está a contestar a Conta Gerência da Assembleia da República, referente ao ano 2009. De entre as irregularidades apontadas pela Renamo, destacam-se falhas (propositadas ou não) no preenchimento dos mapas, registo dos números, omissão de fundos gastos e dos saldos contabilísticos e doações. No total, a AR recebeu dos cofres do Estado, em 2009, cerca de 589 milhões de meticais.
Apesar das irregularidades detectadas pela Renamo, a Conta Gerência da AR foi aprovada com votos a favor da Frelimo e do MDM, perante a abstenção da Renamo. A presidente do Parlamento, Verónica Macamo, comprometeu-se a corrigir todas as irregularidades apontadas, antes da conta ser submetida ao Tribunal Administrativo.
Falando ao Canalmoz, o porta-voz da bancada da Renamo, Arnaldo Chalaua, disse que a Conta Gerência da AR documenta a falta de transparência na gestão de fundos que se vive naquela casa. Chalaua questionou o facto de a conta se não referir aos gastos de cada bancada nem ao remanescente. Aquele parlamentar disse que tudo foi feito de forma propositada, para garantir a drenagem de fundos.
Por seu turno, o deputado José Samo Gudo disse que, da análise feita a alguns documentos a que teve acesso da Conta Gerência, descobriu uma omissão de 640 mil meticais, e questionou o destino dado a este montante.
“Não quero dizer que alguém roubou ou desencaminhou, mas é preciso que isso seja expresso na Conta, e que os gestores justifiquem qual foi a aplicação dada a este dinheiro. Agora, o que não podem fazer é manterem-se calados. Isso verifiquei somente em alguns documentos a que tive acesso. Quanto à contabilização e classificação, deve ser pior. Portanto, isto deve ser a ponta do ‘iceberg’”, declarou Samo Gudo.
Ele acrescentou que o que a sua bancada pretendia saber é quanto a AR gastou no exercício económico de 2009 e quanto resta nos cofres, o que ninguém está a conseguir esclarecer. Disse tasmbém que, ao procederem daquela forma, estavam a enganar-se a si próprios, enquanto deviam ser exemplo de organização e de boa gestão do dinheiro público.
“Infelizmente, a nossa casa já se habituou a que qualquer coisa que venha da oposição seja desaproveitada, o que é uma pena, porque, como fiscalizadores oficiais deste país, tínhamos que primar pelo exemplo, fazendo bem as coisas, para que possamos exigir aos outros”, vincou aquele parlamentar.
A resolução que aprova a Conta Gerência recomenda a criação da figura de auditor interno. Para Samo Gudo, este indivíduo vai melhorar substancialmente a gestão da coisa pública na AR, mas sublinhou a importância de não se esquecer do auditor externo, para se criar equilíbrio e garantir a transparência total das contas do parlamento.

Como sempre, Frelimo não vê irregularidades

O porta-voz da bancada da Frelimo, Damião José, em contacto com a nossa reportagem, desvalorizou as objecções da Renamo, afirmando que a Conta Gerência de 2009 foi executada dentro dos parâmetros legais estabelecidos, e não há nenhuma irregularidade que levasse a que algum grupo se opusesse à sua adopção.
“Não há nenhuma irregularidade. A conta foi gerida dentro dos parâmetros legais estabelecidos, e foi por essa razão que a nossa bancada aprovou este documento. O único reparo que a Frelimo faz é a necessidade de, nos próximos momentos, haver uma auditoria interna. A criação de um auditor interno vai ajudar o Conselho Consultivo da AR a melhorar procedimentos e normas, a dar maior celeridade e dinâmica à gestão da Conta”, frisou Damião José.
Outra questão que merece ponderação tem a ver com a alteração dos moldes de análise deste documento, uma vez que, antes, a apreciação começava na AR e depois ia ao Tribunal Administrativo, enquanto deveria ser o inverso.
Por seu turno, Eduardo Elias, da bancada do MDM, afirmou que a Conta Gerência da AR é um documento importante, que deve mostrar a transparência da gestão do orçamento atribuído ao parlamento para o exercício das suas actividades. Esclareceu que, como MDM, não puderam participar na execução desta conta, porque iniciaram o seu mandato este ano, razão pela qual a sua intervenção é no sentido que se garanta maior transparência na gestão dos fundos, cujo exercício precisa ser acompanhado pelo povo.
“Como forma de garantir maior transparência, propusemos a publicação de concursos públicos, e que os resultados decorrentes sejam igualmente públicos, nos órgãos de comunicação social, no “website” e fixados nas vitrinas da AR”, disse Eduardo Elias.
O MDM queixou-se da escassez de tempo para analisar com profundidade este documento, uma vez que foi entregue aos parlamentares somente no fim-de-semana, o que condicionou a sua análise. Contudo, evitou qualificar esta situação como premeditada.
No entanto, asseverou que o MDM, nas próximas ocasiões, estará atento, de modo a que se garanta que este documento chegue a tempo aos deputados, para apreciarem e consultarem as comissões especializadas e também peritos na matéria, para benefício da coisa pública e do povo.

(Matias Guente, CANALMOZ)


NOTA DO JOSÉ: As contas da Assembleia devem primar sempre pela transparência e nesse quadro é necessária uma auditoria. Se as contas não são claras, a Oposição tem legitidade em levantar a preocupação.

Quanto ao MDM, questiono se não teria sido mais prudente abster-se em vez de votar a favor, uma vez que não analisou profundamente o documento.


9 comments:

  1. Que vai fazer ainda no Tribunal Administrativo?

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  2. Vergonha, uma pouca vergonha...
    Tudo deveria de ser transparente, a oposição, o eleitorado, o povo, todos podem questionar e deveriam de ter acesso aos documentos relevantes. Quem não tem nada a temer ou a dever, também não tem nada a esconder.
    Afinal, vivemos em democracia ou não?
    Não consigo compreender a atitude do MDM.
    Maria Helena

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  3. 1. Durante o debate na generalidade, o MDM fez duras criticas a forma como o orcamento foi gerido no mandato passado e juntamente com a RENAMO absteve-se na votacao.
    2. Durante o debate na especialidade, o MDM propos medidas que visam assegurar uma gestao mais transparente. As mesma foram acolhidas por consenso e passaram a fazer parte integrante da resolucao a ser votada pelo plenario. Ai sim o MDM votou a favor. Portanto, o MDM somente votou a favor na especialidade por dois motivos essenciais: pelo facto de se ter acolhido as medidas que visam melhorar a gestao e pelo facto de o relatorio de contas ter sido aprovado por conselho pelo conselho de administracao ( composto pela RENAMO e pela Frelimo). E importante frisar que os dois membros que representam a RENAMO no referido conselho de administracao sao a chefe da Bancada da RENAMO(actual) e o respectivo Relator.Esta situacao embaracou bastante o partido e atenuou as criticas a meio do debate e retirou a legimidade de se fazerem criticas mais profundas.

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  4. Estimado Chacate, o que está mesmo em causa é a falta de transparência, exige-se mais rigor nas contas, auditorias sérias e faz sentido que se questione os métodos de análise dos documentos e o papel do Tribunal Administrativo.

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  5. Maria Helena, este é mesmo um assunto preocupante, se as contas da casa-mãe da democracia não são transparentes, é evidente que temos problemas sérios.

    Ainda sobre o MDM, o esclarecimento do Ismael Mussá talvez nos ajude a compreender melhor este imbróglio. Eu continuo a pensar que a abstenção neste caso talvez fosse a melhor opção, mas é apenas a minha opinião pessoal. Vamos esperar e confiar calmamente no bom desempenho do MDM no Parlamento.

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  6. Ilustre Ismael, muito obrigado pelo esclarecimento, ficamos assim com uma ideia do contexto em que a decisão de votar a favor foi tomada.
    O voto a favor faz sentido, mas nestas circunstancias a abstenção também seria aceitável e prudente.
    De qualquer modo, desejo ao MDM muita força, coragem e coerencia na denúncia e combate à falta de transparência,corrupção, partidarização,etc.

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  7. No portal da Rádio Moçambique vem o seguinte:

    "Assembleia da República: após introdução de propostas do MDM, parlamento aprova conta gerência de 2009".

    Mais adiante vem:

    Contudo, a bancada da Renamo, através do Deputado José Samo Gudo, entende que a conta em questão contem irregularidades que devem ser corrigidas, para que a mesma seja apresentada ao TA, depois de satisfazer a todos os 250 deputados. Samo Gudo, um auditor de profissão, chegou mesmo a prontificar-se a ajudar a AR a rectificar as alegadas falhas que a ‘conta contem’.

    Isto tudo consta deste artigo do Canal de Moçambique. E eu pergunto, o que da crítica da Renamo foi considerado pela Assembleia da República? Tudo o que os deputados da Renamo haviam proposto, até o voluntarismo de Samo Gudo era ruim? O que se pretende quando se introduzem propostas de uns e excluem de outros (ou ASSIM SE ESCREVE) mesmo que positivos? Fingir-se à abertura ou uma verdadeira abertura. ANDA UM JOGO DE MAU GOSTO NA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA?

    Maria Helena, como vê as minha perguntas, também tenho indignação.

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  9. Reflectindo, continuo a pensar que o voto a favor não foi a melhor opção.

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