A imprensa nos últimos dias tem sido fértil com informações sobre actos de tortura na chamada cadeia de máxima segurança, vulgo BO, em Maputo.
Preocupada com aquilo que parecia ser uma abominável violação dos direitos humanos, a ministra da Justiça, Benvinda Levi, visitou o local na semana passada, tendo ouvido em primeira mão os relatos dos horrores por que passam alguns dos reclusos. Coisas da Idade da Pedra, cometidas em pleno século 21, por indivíduos que pela sua conduta tornam-se eles próprios criminosos.
A situação nas prisões moçambicanas já desde há algum tempo que tem sido motivo de apreensão por parte de pessoas e organizações que se preocupam pelo respeito da dignidade do ser humano. E que não haja ilusões: o que virou do domínio público sobre os acontecimentos na BO é apenas a amostra de uma situação generalizada e que ocorre em todo o país.
E as mazelas manifestam-se de várias formas. Por um lado temos a violência física perpetrada por guardas prisionais incompetentes e ignorantes das suas responsabilidades reformatórias sobre os reclusos, e por outro as condições delapidadas, e de má higiene em que se encontram todas as cadeias deste Moçambique. Acresce-se a isso a má nutrição e a ausência de cuidados médicos a que são sujeitos os prisioneiros, e temos a receita completa para que o sistema prisional, em vez de ser uma instituição de reforma da mentalidade do cidadão, se transforma num centro de formação de criminosos do mais alto calibre.
Há factores estruturais que tornam os nossos serviços prisionais a antítese do que de facto eles deveriam ser. O serviço prisional na sua essência foi concebido como uma instituição de reabilitação do indivíduo, preparando-o, durante o período de reclusão, para a sua posterior reintegração como elemento útil na sociedade.
Mas será que no seu processo de formação os guardas prisionais são instruídos no sentido de no desempenho das suas funções terem este objectivo como a sua principal missão? Aparentemente não, prevalecendo entre eles a noção de que quanto mais brutal se for no trato aos reclusos melhor se estará qualificado para o exercício da profissão.
Tudo isto torna imperioso a institucionalização de um serviço nacional de prisões autónomo e profissionalizado, e em que os seus membros sejam formados sobre questões éticas e de respeito pela condição humana do recluso.
Questões de subordinação institucional podem também constituir parte do problema. Uma possibilidade seria de transformar os serviços prisionais não numa instituição dependente de uma estrutura em que ela, por ser vista como uma entidade que lida com pessoas aparentemente privadas de direitos, acaba sendo tratada como o parente pobre, para cuja direcção são escolhidos os funcionários menos qualificados.
Pela quantidade de pessoas sob sua responsabilidade, e dada a natureza do seu trabalho, o serviço nacional de prisões deveria ser concebido como um ramo autónomo no conjunto das forças de defesa e segurança, dotado de um comando e orçamento próprios, e de um contingente de funcionários e guardas altamente profissionais.
As prisões moçambicanas não podem continuar como elas estão, um local de excelência para o cultivo do ócio, do vício e onde se planificam os mais hediondos crimes. Envolver os prisioneiros em actividades produtivas, aproveitando as suas diferentes competências profissionais, parece ser a via mais aconselhada para que os recintos prisionais deixem de ser células de vícios e de crimes.
Editorial do Savana de 23/04/10, citado no Diário de um Sociólogo
Bem dito!
ReplyDeleteIsso acontece em alguns países, onde os prisioneiros também são produtivos, ou onde aprendem uma arte.
Maria Helena
A situação nas prisões é muito preocupante e algo tem de ser mudado urgentemente.
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