Beira (Canalmoz) - É evidente e já está claro para todos que o Orçamento Geral do Estado vai ser aquilo que a liderança da Frelimo e os seus deputados na Assembleia da República querem. Qualquer tentativa de conferir àquele documento alguma legitimidade e substância que o faça reflectir os anseios do povo estão condenados ao fracasso, devido à ditadura do voto que vigora no parlamento moçambicano. Decerto que, se os deputados pudessem votar em consciência e não em obediência de orientações ou instruções, teríamos um OGE bem diferente.
As questões colocadas pelos deputados da oposição em geral vão ser ignoradas e vamos ver os deputados do partido no poder impondo o seu ponto de vista, se é que tal é o caso.
Aquilo que se viu e se ouviu sobre os discursos de alguns deputados da Frelimo leva facilmente a concluir que muitos deles e “muitas delas” estão decididamente dispostos a desempenhar um papel de seguidores disciplinados da palavra de ordem do seu partido. Se já era hábito ver deputados carimbarem como bom o desempenho do Governo, agora temos a tentativa de os mesmos mostrarem a sua obediência e servilismo, ao optarem por uma autêntica campanha de elogios à liderança. Em vez de se pronunciarem com lógica sobre o tema em discussão, vemos deputados pagos com os nossos impostos a gastarem o tempo produzindo elogios ao mais puro estilo estalinista ou maoísta. Guebuza deve estar farto da náusea de um tanto elogio. Cada deputado “camarada” que se levanta tem de, em primeiro lugar, tecer rasgados elogios ao chefe, num procedimento que tem a cor e a substância do culto à personalidade do chefe. Tanto elogio e “lambebotismo” já cheira que tresanda. É um esforço vil e de resultados embrutecedores o que se vê e se escuta os “deputados camaradas” fazendo. Não há objectivamente necessidade de tanta escova ao chefe. Compreende-se que a manutenção no lugar de deputado dependa em certa medida de obediência e disciplina em relação às instruções partidárias, mas sinceramente que julgamos exagerado tecer tantos elogios ao chefe.
Ser-se deputado é mais do que tomar a palavra para falar bem das realizações do chefe. Ser-se deputado requer, antes de tudo, uma capacidade de reflectir sobre os assuntos em discussão, capacidade de estudar com rigor os dossiers, escutar a voz dos cidadãos dos seus círculos eleitorais e tentar, em consonância com os outros deputados, trazer para a assembleia assuntos com significado de importância para a vida dos moçambicanos.
Pelo que se tornou evidente, da análise dos documentos em discussão, sobre o OGE nada mais se pode dizer senão que estamos em presença de um OGE que reflecte agendas conflituosas com o discurso oferecido aos cidadãos. Os governantes estão decididos a levar avante uma agenda que está centrada na concretização de objectivos que não correspondem exactamente aos os interesses dos cidadãos. Presidente e ex-presidentes, sector de defesa e segurança apresentam-se como os campos que merecem primazia orçamental, em detrimento de outras áreas que têm maior impacto para a vida dos cidadãos. Mostra-se uma super preocupação em satisfazer chefias e garantir que as coisas aconteçam de maneira rápida e célere para os chefes. A sua segurança é mais importante do que a fome dos cidadãos.
Se alguém ainda tinha dúvidas quanto à natureza e objectivos estratégicos do Governo, agora possui elementos suficientes para proceder a uma análise fundamentada.
Mesmo com uma massa crítica de conselheiros nacionais e estrangeiros, continua-se a não ter uma capacidade de influenciar as acções do Governo, de modo a que este seja mais efectivo e coerente.
É uma atitude de “mamar na porca enquanto esta dorme”. Entendem-se os constrangimentos colocados ao Governo, devido à dependência real que existe em relação a fundos externos para sustentar o OGE. É exactamente por isso que se julgava que os documentos submetidos ao parlamento seriam modestos e coerentes com o tal manifesto eleitoral propalado aos “quatro ventos”.
E, quando do parlamento se tem unicamente uma maioria que carimba sem questionar a razão de ser certos números, estão abertas as portas para um despotismo que lesa o país.
Parece que os doadores, que se negavam a apoiar o OGE devido a razões fundamentalmente políticas, vão ver os fundos que se dispõem a colocar em Moçambique mais uma vez utilizados para agendas obscuras.
As corridas de helicóptero em visitas de presidência aberta, em que o PR substitui ministros e governadores, vão continuar.
Pelos vistos e por tudo o que os actuais factos mostram, vamos continuar a ver o PR a inspeccionar a utilização dos tais “7 milhões” e a exigir o seu pagamento...
Até porque grande parte do “bolo” deste OGE se destina à Presidência...
Não se deve esquecer que o próprio PR já disse que, para governar, tem de gastar...
A austeridade vai continuar a ser uma palavra objectivamente ignorada com todas as consequências que isso tem. Os “camaradas” sabem que, basta quererem, que os créditos aparecem, sem preocupação de ter que amortizá-los.
Tuesday, 20 April 2010
Clarificaram-se posições e agendas
Ainda sobre o Orçamento Geral do Estado
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