Friday, 15 January 2010

O preço da tirania

Passam agora dez anos desde que a economia do Zimbabwe entrou no seu processo de colapso, que teve o seu ponto de partido no ano de 1999. De facto, este processo começou em 1997, mas só dois anos depois entrou na sua fase de aceleração, quando o efeito da mudança de políticas começou a fazer-se sentir. É talvez altura de olharmos para trás, para esta década perdida e tentar avaliar o preço que tivemos que pagar. Os números são assustadores — se assumirmos o potencial de uma média de crescimento do PIB de 5% durante esta década, então o custo real em termos do PIB é de 76 biliões de dólares de rendimento perdido. Em termos humanos, a esperança de vida reduziu-se a metade e mais de três milhões de pessoas morreram.
Para a África do Sul, o colapso do Zimbabwe custou mais de 43 biliões de dólares em receitas perdidas, e essa estimativa é um terço abaixo daquela que feita por Tony Blair quando visitou a África do Sul há três anos. A crise (do Zimbabwe) poderá ter custado à região (da África Austral) cerca de um milhão de empregos — uma estimativa que se rivaliza com as perdas de emprego atribuível à recente crise global dos mercados financeiros.
Em termos humanos o colapso não foi nada menos que uma catástrofe — um terço da nossa população abandonou o país — cerca de quatro milhões deles tendo se refugiado nos países vizinhos. Cerca de meio milhão de pessoas perderam os seus empregos e quase dois milhões de pessoas encontram-se internamente deslocadas. A pobreza é agora a norma, com a média dos zimbabweanos a viverem com menos de um dólar por dia.
As consequências do Gukurahundi que se abateu sobre muitas partes da região da Matabelelândia de 1983 a 1987 ainda não foram resolvidas e muitas comunidades continuam a levar uma vida sombreada. Tudo isto são consequências de uma tirania política que tem estado a todo o custo tentar defender o seu controlo do poder e privilégios.
Enquanto o país vive na pobreza e continua no caminho do colapso acompanhado do desemprego, desabrigo e desespero, uma pequena minoria que está no poder desde 1980, tornou-se tão rica para além de qualquer imaginação. Fazem compras em Dubai e Joanesburgo, e passam férias nas ladeiras de neve da Europa.
Os seus filhos vão para as mais refinadas universidades e escolas do mundo. Muitos têm no Zimbabwe mansões que seriam de invejar no Ocidente.
Tentativas para introduzir reformas na comunicação social e permitir a abertura de novas estações de rádio e televisão tiveram como resposta uma resistência total, apesar de fazerem parte do pacote de reformas acordadas ao nível do Acordo Político Global (GPA). Apenas 12% das reformas negociadas durante um período de dois anos, sob facilitação da SADC, foram implementadas em nove meses de disputas políticas.
Não há progressos quanto a condições democráticas para a realização de eleições, não há progressos no que diz respeito ao respeito pelo Primado da Lei, à liberdade de associação e de reunião, não há progressos no respeito pela lei do contrato e direito de propriedade, não há progressos quanto a reformas no sector da comunicação social.
No lugar destes que seriam passos positivos para a normalização da situação política no país, somos bombardeados com propaganda sobre estações de rádio “piratas”, “sanções” (restrições para compras) e “mudança de regime”; como se eleições não fossem um método de mudança de regime por meios democráticos.
No lugar de verdadeiras reformas continuamos a testemunhar a perseguição contra a oposição política, detenções e acusações ilegais, o uso do sistema legal (não para a justiça) como meio de sufocar as forças que lutam pela democracia. A violência política continua em todo o país, com milhares de milícias distribuídas por todas as regiões e em acção no meio de comunidades que vivem com o medo constante do toque na porta à meia noite.
Estamos à espera, tal como todos, das notícias sobre as discussões iniciadas há duas semanas. Estas discussões não são negociações — elas dizem respeito ao calendário para a implementação daquilo que foi acordado entre e assinado por todas as partes do GPA.
Porquê todo este tempo é para mim um mistério — o que é que ainda há para discutir? Assinaram o acordo, tudo o que falta é trabalhar no sentido de implementar na totalidade o acordo.
É óbvio que mais uma vez nós no MDC estamos a ser obrigados a ceder. Muito francamente, é difícil ver qualquer razão porque temos que ceder. Ganhamos claramente as eleições de 2008; sem margem de dúvida controlamos dois terços do país ao nível das autoridades municipais.
Todos sabem muito bem que numa eleição genuína em condições justas e livres, a oposição ao MDC é minúscula. Não nos estou a imaginar a ceder naquilo que são as questões mais fundamentais e substantivas, mas podem ter a certeza que haverá uma infinidade de questões marginais que serão colocadas na mesa só para ganhar tempo.
Já sofremos com esta tirania durante os últimos 30 anos. Acreditem que estamos dispostos a sofrer um pouco mais se o objectivo é que possamos eleger uma liderança a quem podemos confiar o nosso futuro, na base de um sistema que nos permite desalojar tal liderança se ela não conseguir realizar os nossos sonhos ou abusar da nossa confiança. De resto, democracia é isso mesmo.
Está a chover e a época agrícola começou bem. Conseguimos colocar uma pequena quantidade de semente nas mãos de 700 mil famílias nas zonas rurais — o suficiente para a sua própria alimentação se tivermos uma época decente. Tal como o Primeiro Ministro Morgan Tsvangirai disse na semana passada, temos que rezar por um Natal decente para todos nós — merecemos e precisamos disso.

Eddie Cross

*Eddie Cross é coordenador político do MDC. No passado, ele foi presidente do Beira Corridor Group (BCG), uma associação de empresários que coordenava com o governo para a melhor utilização do Corredor de Desenvolvimento da Beira.

FONTE: Savana

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