Wednesday, 7 October 2009

Lei e leis


Nestes turbulentos dias que correm parece haver uma súbita apetência para debitar textos sobre a lei. Como se no país que temos, no nosso dia a dia, uma parte do que vemos e assistimos não fosse feito a arrepio da lei. A começar pela nuvem de “vendedores informais” que inundam as cidades e não pagam impostos até aos milhares de preventivos que aguardam o julgamento que nunca mais chega.
Também no tempo das brumas, havia lei. Era invocada lei, os artigos e os respectivos códigos. A norma que dizia os que eram cidadãos e os que não eram. Os moçambicanos que podiam ter BI e os que tinham apenas caderneta.
Os que votavam e os que não votavam. Até mesmo depois da vitória das sufragistas que conquistaram o direito a voto das mulheres, o Portugal atrasado e fascista não permitia o voto às mulheres.
Era a lei.
A lei tem que ser percebida em contexto e não pode ser dissociada da envolvente social.
Juizes retrógrados invocaram no tempo recente da democracia multipartidária uma lei do monopartidarismo e da repressão snaspiana, para tentarem a soldo, amordaçar um punhado de jornalistas e o seu jornal. Foram humilhados pelo descrédito público que ridicularizou o invocar de uma lei ultrapassada, apesar de ainda em vigor.
No 5 de Fevereiro, o que era verdade a quatro, deixou de o ser no dia seguinte e, finalmente, nunca houve tantos coelhos e soluções para a “crise dos chapas”, depois do cheiro asfixiante dos pneus a arder nas ruas suburbanas da capital. Ainda hoje, e até ao fim do ano, estamos a aproveitar a boleia do combustível “barato” decorrente do pavor de uma nova rebelião.
Da Beira, donde escrevo, as ruas estão tomadas por apoiantes do MDM. Apesar de não poder entrevistar cada um dos transeuntes com a camisete do galo, nem os carros e carrinhas que circulam com cartazes e bandeiras do “Moçambique para todos” , parece-me mais ou menos curial pensar da violência que seria, esta população orgulhosa do seu edil, ser impedida por uma qualquer lei eleitoral, ou uma interpretação da mesma, não ter a possibilidade de expressar a sua vontade pela força do voto.
Uma tal visão não sugere, em momento algum, que se mandem às urtigas os requisitos legais para alguém se alcandorar à posição de candidato.
Mas a situação de cidadania, de moçambicano não é definida pelo facto de o BI ser válido ou estar momentaneamente caducado. A cidadania não se interrompe intempestivamente.
Aqui chegado estou nas escadarias da CNE e do CC (Conselho Constitucional).
Uma melhor compreensão do que é cidadania e das aprendizagens que todos estamos a fazer – cidadãos, partidos e instituições reguladores – teria permitido um melhor ambiente de cooperação, por oposição a crispação, desconfiança e antagonismo. E nesse ambiente, o da cooperação, algumas das nulidades invocadas poderiam ter sido saudável e pacificamente supridas.
Pensando assim, permito-me passar ao lado das doutas considerações de uns senhores de togas que decidem se o desejo dos cidadãos deve ser ou não defraudado. Se são ou não verosímeis os argumentos que os homens do edil da Beira estão a esgrimir clamando por queima de arquivos.
Na ausência de uma séria auditoria aos procedimentos e decisões da CNE.

( Fernando Lima, no Savana )

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