Thursday, 24 September 2009

Batota na CNE?



Há quem diz que a política é um jogo. Secundo e digo mais: é um jogo de batota, onde ganha quem domina a arte de lu­dibriar. Os políticos, em campanha eleitoral, vendem expec­tativas procurando atingir o seu eleitorado em todos os seus pontos fracos. Até os “mais conscientes” são atingidos. Enfim, está longe o dia em que as coisas não serão assim.
Já quando se fala de Comissão Nacional de Eleições (CNE) é inaceitável a ideia de ver qualquer que seja o jogo. Até porque se trata de um órgão do Estado que se presume ser independente e imparcial na supervisão dos actos eleitorais. Regida apenas pelas Constituição e leis, a CNEdeve ser independente de todos os poderes públicos e, no rol das suas competências, deve assegurar a igualdade de tratamento dos cidadãos em todos os actos do processo eleitoral. Porém, os capítulos passados da novela política que os anos eleitorais sempre nos proporcionam suscitam dúvidas relativas à natureza, competên­cia,(...) desta instituição. Ora vejamos:
Os partidos tiveram o período de 1 de Junho a 29 de Julho para a apresentação das suas candidaturas. Ok, assim proce­deram. O número 1 do artigo 173 da Lei 7/2007 diz que terminado o prazo para a apresentação de listas, o presidente da CNEmanda afixar cópias, à porta da CNE. Que eu me lembre, isto não acon­teceu. O número 2 do mesmo artigo diz que, nos oito dias subsequentes ao termo do prazo de apresentação de candida­turas, a CNEverifica a regularidade do processo, autenticidade dos documentos que o integram e a ilegibilidade dos can­didatos. Quando identificada alguma irregularidade, os artigo 174 e 175 apon­tam para mecanismos de substituição. A CNEgarante ter feito, mas os partidos dizem o contrário, e mais uma área de penumbra emerge entre um intervalo e outro, visto que que as provas não con­vencem os (tel)espectadores.
O artigo seguinte, 176, explica que depois desta corrida para a supressão de irregularidades (cujos cálculos apontam para 18 dias, se somarmos os oito que a CNEtem para a verificação das candi­dturas e o prazo máximo que os manda­tários têm - 10 - para eliminar as irregu­laridades), mais uma vez, a CNEafixa à sua porta as lista dos admitidos e excluí­dos. Se obedeceu ou não a Lei não sei. O que sei é que esta lista foi afixada 40 dias depois da data limite de entrega das can­didaturas (curiosamente, nos dias seis e sete do mês corrente, mas com a data de 28 de Agosto, deixando, portanto, extemporâneo o prazo de reclamação) e seis dias antes do início da campanha eleitoral. Esta lei, no seu artigo 177, tam­bém prevê reclamações ao Conselho Constitucional (CC), órgão que, por sua vez, não aceitou receber a reclamação de um partido, alegando tratar-se de um contecioso eleitoral, pelo que devia dar entrada na CNE. Entretanto, quando vou ao número 3 do artigo 184 da lei que venho citando, entendo que quando se fala de contecioso eleitoral se está a falar de uma fase posterior à da votação, e nós ainda não fomos às urnas.
Esta lei também prevê, agora no arti­go 178, uma terceira e última fase de afixação de listas, depois da apreciação das reclamações pelo CC. O que sei é que as listas foram afixadas apenas uma vez e, no mesmo dia, fez-se o sorteio, como sentença final do assunto. Isto é, deixando nula a hipótese de aceitar a entrada de outros candidatos depois de apreciadas as reclamações previstas na lei. Pior: a isto junta-se o argumento conveniente de har­monização da lei para justificar a forma de sorteio. E, sobre o financiamento, que transparência houve na entrega do dinheiro aos partidos?
Meus caros, quando se joga xadrez, os passos são muito claros, mas quando se joga “batota”, as artimanhas distraem a clareza dos processos e as explicações não são facilmente digeríveis. Ainda que as leis nos permitam manobras diversas para acomodar as nossas pretensões, elas não se sobrepõem à nossa capacidade de en­tendimento do fim que se pretende.


( Olívia Massango, O País, 14/09/09 )

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