Monday, 28 September 2009

Algumas verdades que têm que ser ditas



Tem sido comum em África, que quando os dirigentes políticos são confrontados com situações de crise se desviem dos factores principais da crise, para se concentrarem no secundário e trivial, como, por exemplo, culpar o Ocidente pelas suas fraquezas.

Eles são uns imaculados que não fazem mal nem a uma mosca. Os ocidentais é que são uns malvados, que se intrometem de qualquer maneira nos seus assuntos internos, que ainda não se aperceberam de que o colonialismo já acabou, que não têm respeito pela dignidade do Preto.

Tudo discursos de conveniência, apenas para ocultar o facto de que se não fosse esse mesmo Ocidente, mais de dois terços das suas populações não teriam comida, hospitais decentes, medicamentos e tudo quanto o ser humano necessita para continuar a existir.

Um discurso de hipocrisia que serve apenas para ocultar os apetites ocidentais de que morre a nova elite africana. Gostam do dinheiro do Ocidente, da roupa e dos últimos lançamentos da indústria automobilística ocidental. Tanto gosto que alguns acabam mesmo morrendo em clínicas ocidentais, para onde são evacuados quando doentes, por já não confiarem na segurança dos seus próprios hospitais, desprovidos de pessoal médico adequado, medicamentos e boas condições de higiene.

Para o Ocidente também mandam os seus filhos estudar porque não acreditam no seu próprio sistema de ensino.

É com estes empresários ocidentais que forjam as suas parcerias empresariais, muitas vezes sendo o seu único capital a influência política que detêm. O que Frantz Fanon, no seu clássico Peles Negras, Máscaras Brancas, designa de “burguesia mercantil”. Uma burguesia que suga o sangue do seu próprio povo e guarda o produto do seu roubo nos bancos do mesmo Ocidente que simulam que odeiam quando a sua hegemonia política e o controlo total sobre os recursos nacionais são postos em causa.

É esta hipocrisia que de forma nauseabunda nos é dada a consumir todos os dias por certos sectores da nossa sociedade, quando se debate a crise actualmente instalada na sequência da decisão da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de excluir alguns partidos da corrida eleitoral que se avizinha.

Não se discutem os méritos do problema, que até nos podem conduzir à conclusão de que a CNE agiu correctamente, tendo como base a força da lei. Não, discute-se a intromissão de um grupo de embaixadores ocidentais que estão apenas a fazer o trabalho que as suas capitais lhes pagam para fazer. A função de um diplomata é precisamente procurar informar-se dos desenvolvimentos políticos no país de acolhimento, para com propriedade informar os seus chefes, que depois usam essa informação para tomar uma atitude em relação ao país em causa. Na verdade, seria negligência gravosa se os embaixadores se tivessem mantido quietos nas suas chancelarias, e deixassem de transmitir aos governantes deste país aquilo que eles, no seu entender, consideram uma preocupação legítima, independentemente de se nós concordamos ou não com eles. Deve ter sido com este espírito que até o Presidente da República aceitou recebê-los em audiência, mesmo que eventualmente não esteja de acordo com os seus pontos de vista.

Não é pela intromissão dos 19 embaixadores que o problema criado na CNE deixará de ter os elementos que o caracterizam. Por isso, é aconselhável que nos concentremos nesses detalhes, deixando o marginal, o supérfluo, o trivial para fora da equação. Com esse espírito construtivo, sem menosprezar a importância das nossas leis, com a cabeça fria, sem rancores nem subterfúgios chegaremos a um desfecho do qual todos nós sairemos vencedores.

Dói escrever estas coisas no dia 25 de Setembro, mas elas têm que ser ditas.


( Editorial do Savana )

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