Pretoria (Canal de Moçambique) - A crítica do primeiro embaixador soviético à forma como o regime de Samora Machel, no âmbito da sua política económica, se relacionou com as minorias étnicas do país, mormente a portuguesa, e, por inerência os moçambicanos de origem portuguesa, asiática e de outras nacionalidades, mereceu a resposta de José Luís Cabaço atrás citada. Tendo o entrevistador do jornal O Pais feito recordar a história, a qual “reza que a Fre¬limo tratou muito mal os bran¬cos que estavam em Moçambi¬que nos primeiros anos após a independência”, Cabaço considerou que tal “não era verdade” e que “os portugueses abandonaram o país porque não aguentaram com a nova realidade”.
A “nova realidade”, que o diplomata soviético equacionou como reflexo do comportamento stalinista de Samora Machel, tem necessariamente de ser vista no contexto da política enunciada pelo regime no momento em que o país ascendeu à independência. Como ministro dos transportes e comunicações, José Luís Cabaço certamente se recordará da primeira sessão do Conselho de Ministros realizada em Julho de 1975 e que entre outras coisas anunciava que o novo regime se propunha “destruir todos os vestígios do colonialismo com o propósito de se eliminar o sistema de exploração do homem pelo homem e de se edificar as bases políticas, materiais, ideológicas, culturais e sociais da nova sociedade”. (11) Esta política viria a ser definida em termos mais claros por ocasião do 3° Congresso do partido dirigente, em que se anunciava “o histórico período em que o processo de destruição de todas as formas de dominação estrangeira da nossa Pátria, especialmente a dominação económica, e o processo de eliminação de todas as sequelas das sociedade tradicional-feudal e colonial-capitalista seria aprofundado”. (12)
A “destruição das sequelas da sociedade colonial-capitalista” teve como ponto de partida o banimento do exercício de profissões liberais nos sectores da educação, saúde e advocacia, seguido do confisco de casas de arrendamento na posse de privados. Em consonância com a “destruição da dominação económica estrangeira”, o regime centrou a sua acção no desmantelamento das propriedades agrícolas privadas, sendo de destacar o sucedido ao longo do chamado corredor da Beira, no vale do Limpopo e na região da Angónia. Não foi por acaso, que o Inspector Comé da nova polícia foi destacado para a cidade de Chimoio a seguir à proclamação da independência com a missão de coordenar toda a campanha de intimidação, prisões arbitrárias, violações de domicílio e espoliação de bens com o propósito de se afastarem fazendeiros privados, em particular da zona de planalto de Manica, que para além da minoria étnica portuguesa incluíam cidadãos de origem alemã, grega e inglesa. O objectivo era a transformação dessas fazendas em machambas colectivas, aplicando-se o mesmo princípio na zona do regadio do Baixo Limpopo, que viria a ser transformado em Complexo Agro-Industrial do Limpopo (CAIL), e na zona da Angónia cujas propriedades foram integradas num outro complexo estatal.
De referir que o ex-embaixador soviético em Maputo não foi o primeiro a condenar o tratamento dado pelo regime de Samora Machel às minorias étnicas do país, e cujas consequências para a economia nacional se traduziram na falta de quadros para o sector de serviços, quebra da produção agrícola e na transformação de Moçambique em país cronicamente dependente de donativos alimentares, quando antes produzia o suficiente para se abastecer e exportar os excedentes. Outras vozes houve, ainda mais próximas do regime, que alertaram o governo de Samora Machel para as consequências nefastas de se erradicar do tecido social moçambicano aquilo que na propaganda oficial se designava de forma pejorativa de “burguesia”. Adrião Rodrigues, antigo vice-governador do Banco de Moçambique, na carta de demissão endereçada a Samora Machel em 1977, apontava uma das razões que o haviam levado a tomar a decisão de deixar o país:
1. A política de afastamento das minorias étnicas residentes em Moçambique.
Esta política - cuja determinação voluntária por parte do governo não me oferece dúvidas e é facilmente demonstrável - além de pôr em causa a existência de uma sociedade pluriracial em Moçambique, em que eu pessoalmente apostara, empurrou o país para o caos económico e social. Por virtude de uma injustiça decorrente da situação colonial, mas que ao governo revolucionário seria fácil corrigir, parte importante dos conhecimentos necessários ao país estavam concentrados nessa gama populacional (brancos, indianos, chineses e mulatos).
Ora, grande parte dessas minorias étnicas ficaria no país, caso lhes fossem dadas determinadas garantias básicas (direito a não ser preso excepto nos casos permitidos por lei, respeito pela sua propriedade pessoal, garantias de julgamento rápido e de defesa em caso de prisão legal, respeito da sua identidade cultural própria.
Em troca destas garantias fundamentais (que não seriam uma excepção porque se deveriam aplicar a toda a população) elas dariam ao país o seu trabalho, que enquadrado numa economia socialista, era essencial para o arranque económico.
Em vez de se aproveitar essa parte da população, preferiu-se acossá-la. Multiplicaram-se as prisões arbitrárias, as violências verbais, o desrespeito pelos bens pessoais. Procurou-se substituir essa população pelos cooperantes e por uma apressada formação de quadros, mais apregoada que executada.
Escorraçou-se do país para fora homens que eram absolutamente insubstituíveis, para já, e que num outro contexto teriam ficado. Lembro só para exemplo os quadros agrícolas e veterinários escassos mas extremamente importantes, apostados em ficar mas que um a um se foram embora, bem contra vontade; os quadros de geologia e minas, falsamente acusados de desvio de ouro, nas primeiras páginas dos jornais locais, e que depois de se ter constatado a sua inocência jamais mereceram uma reparação. [...]
E, neste caminho, acabou-se na pequena truculência anti-branco ou anti-mulato, como foram os casos da expulsão dos agricultores brancos do Vale do Limpopo - gente pobre que trabalhava a terra - e a expulsão dos chamados “comerciantes de nacionalidade” isto é, de pessoas que ao abrigo de uma lei ridícula e que devia ser revogada, mas que existia e tinha sido publicada pelo governo da República Popular de Moçambique, tinham mudado de nacionalidade, para se garantirem um pouco mais contra as arbitrariedades que apontei. Ora, esta expulsão veio afectar a economia do país, na medida em que afastou os últimos operários com alguma especialização e de capacidade de direcção que não fossem negros. E quanto a estes últimos ainda está por fazer o balanço dos que fugiram. Mas segundo me consta, a zona do Rand, na África do Sul, está cheia de carpinteiros, mecânicos, electricistas, operários da construção civil, fugidos de Moçambique.
Durante muito tempo convenci-me que esta política era, não uma política mas sim erros, próprios do processo. Ou tentei convencer-me. Mas a constância dos erros e sobretudo o reforço da posição das pessoas que eram o esteio desta política, surgido do 3° Congresso, convenceu-me que se tratava de uma política sistematicamente prosseguida.” (13)
Notas
8. Boletim da República, 29 de Julho de 1975 9. Documentos do 3° Congresso do Partido Frelimo, 1977 Dr. Adrião Rodrigues, carta de demissão endereçada a Samora Machel, 1977.
(Redacção, Canal de Moçambique, 07/05/09)
NOTA:
A História deve ser examinada imparcialmente pois sabemos que os factos históricos apresentados pela Frelimo geralmente não correspondem à verdade.
A verdade é que a Frelimo conduziu em Moçambique uma política racista comparável a limpeza étnica e alguns dos chamados "retornados" são moçambicanos que fugiram ao terror frelimista.
A lição para aprender é que devemos estar vigilantes e denunciar e combater os racistas e tribalistas que ainda pululam por Moçambique!
Depois de ler as 3 partes deste artigo, cada um que tire as devidas conclusoes. Eu nao tenho a minima duvida que o regime de S. Machel tinha muitas caracteristicas do ex ditador stalinista, mas em proporcoes menores, atendendo a superficie do nosso pais e ao seu numero de habitantes. Eu nem sequer preciso que me recordem tudo isso, vivi nesse regime, paguei o preco e por isso ainda vivo 'exilada', mas nao guardo odio nem rancor. Concordo, no entanto, que devemos de aprender com os erros do passado e tentar jamais repeti-los. Os jovens que nasceram depois da morte de S. Machel nao viveram estes tempos dificeis e opressivos, mas cabe aos seus Pais e familiares mais velhos recordar e contar a verdadeira historia de Mocambique. Maria Helena
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