Urge acabar com uma cooperação sem sentido e sem resultados...
Beira (Canal de Moçambique) - Não quero parecer nem ser radical, mas com o actual quadro de cooperação internacional que não tem produzido resultados, com uma cooperação política que nem tem a vergonha de convidar líderes ilegítimos a conferências internacionais, só resta apelar para que este estado de coisas conheçam um fim rápido. Para bem dos africanos há que parar com uma cooperação que coloca a maioria na miséria e só tem feito sentido para o bem de uma minoria, o bem de uma elite que não consegue situar-se ao nível de suas responsabilidades e só tem tido o condão de degradar o país.
A hipocrisia e a pouca vergonha têm de ser substituídos por algo viável e com impacto para os cidadãos.
Procurar culpados para situações que somente tem por explicação a governação ruinosa de países por pessoas bem identificadas é gastar recursos escassos numa aventura sem sentido.
A mentira não pode ganhar o estatuto de política oficial.
A cooperação internacional nos moldes em que é efectuada não é mais do que um meio para perpetuar relações de dominação de África perante uma postura parasita de governantes corruptos e anti-patrióticos.
Há que ter a coragem de dar às coisas os nomes que merecem e não enveredar por uma demagogia histórica conhecida.
Que fez ou fizeram governantes como Mobutu para seu povo após décadas no poder? Havia cooperação e ainda há cooperação entre a Europa, África e América. Que ganhos houve? A miséria continua a ser a característica predominante na República Democrática do Congo.
Que aconteceu em Moçambique ou Angola após mais de trinta anos de independência? Justificações como a existência de conflitos armados e guerras não explicam todos os insucessos da governação nos países africanos.
Há que reconhecer que a chave para a solução dos inúmeros problemas é o estabelecimento de uma maneira de fazer política que seja diferente da actual.
O prolongamento do sofrimento dos africanos, as migrações forçadas por razões políticas e económicas, a falta de democracia e falta de respeito pelos direitos humanos não podem ser os produtos de uma cooperação alegadamente vital.
Urge reconhecer que com uma responsabilização efectiva dos governantes e com o uso criterioso dos recursos nacionais existentes em África, não haveria tanta necessidade de auxílio externo. As causas da instabilidade, das guerras, da fome cíclica, da miséria, das epidemias, da falta de desenvolvimento, do terrorismo, do recurso às armas para resolver problemas políticos estão na qualidade e tipo de governação que persiste em África.
A cooperação internacional sustentada em estratégias que sobrevalorizam as vantagens de uns em detrimento dos interesses da maioria dos africanos tem sido o oxigénio vital para ditaduras e a proliferação da corrupção politica e financeira como forma de governo em África. Esta cooperação não faz falta a África.
Faltam divisas para comprar produtos utilizados no tratamento de água em Harare. A cólera já fez mais quatrocentos mortos desde Agosto último. Mas a esposa do presidente ilegítimo do Zimbabwe não se cansa de fazer compras caríssimas em cada viagem que realiza ao estrangeiro. As mesmas pessoas que nem vergonha tem de se manifestar em público sobre situações de que são em parte responsáveis não se cansam de despender recursos públicos dizendo besteiras. É uma vergonha que um ditador como Mugabe se atreva a proferir discursos procurando culpados pela situação que se vive em seu país. É uma vergonha que tal tipo de pessoas seja convidado para fóruns internacionais como no recentemente havido em Doha. Fura-se o bloqueio e efeito das sanções a uma liderança que tem lesado os mais elementares interesses de seus concidadãos. Pelo resultado e maneira como foram conduzidas as eleições no Zimbabwe Mugabe não possui a legitimidade para representar o povo de seu país.
Um Chefe de Estado que assalta os cofres públicos para satisfazer os caprichos de sua esposa cada vez que se desloca ao exterior a fim de fazer compras, não tem legitimidade de acusar os outros de não fazerem o suficiente para aliviar o sofrimento dos seus concidadãos. A responsabilidade pela governação de um país não pode ser transferida para os outros quando as coisas estão correndo mal. Quem está arruinando o país é ele e não os outros. E ele deve ser democraticamente responsabilizado pelos seus actos. O que vale no Ocidente em termos de procedimentos legais a que todos estão sujeitos também é válido em África.
Existe uma atitude de pedinte irresponsável que ganhou pernas e raízes a coberto de uma política paternalista do Ocidente e outros parceiros como a China. Os africanos choramigam um pouco e os outros aparecem em seu socorro. Governação responsável e democrática é tudo menos isso.
Não faz qualquer sentido solicitar assistência financeira internacional para executar projectos nacionais quando se sabe que receitas públicas não são administradas de maneira transparente e com a responsabilidade necessária.
Porque haveria o mundo de ir em socorro de pessoas que não se cansam de mudar de frotas de viaturas de luxo para transportar seus ministros? Qual é a lógica e sentido que faz cooperar com quem não se mostra austero e responsável na gestão da coisa pública que lhes está confiada? Os outros correm em defesa de suas instituições e sistemas financeiros porque são governos responsáveis perante seus cidadãos. De contrário, no quadro dos processos eleitorais democráticos em seus países seriam decerto votados para fora como foi Mugabe, que teima em se manter no poder ilegitimamente.
Esta é verdade que Mugabe e seus aliados vizinhos não querem aceitar.
Não querem reconhecer que os povos tem direito a escolher quem querem que os governe e recorrem a todo o tipo de intimidação e ameaças, violência e repressão, manipulação, assassinatos, até a tortura para impedir que os cidadãos exerçam o seu direito de votar. Recusam-se a dar oportunidade para que a alternância democrática no poder se concretize porque receiam que o peso da lei poderia chamuscar seus interesses. Querem continuar a cavalgar seus povos porque de outro modo não conseguiriam alimentar seus egos e modos de vida muito acima de suas reais possibilidades financeiras. Assenhorearam-se de seus países em nome da participação para a conquista da independência. É este o filme que vergonhosamente nos mostram os vários Mugabes de África.
Que sentido faz pedir ajuda quando não se utiliza bem aquilo que se possui? Para onde vão e como são utilizadas as contrapartidas pela exploração de nossos recursos naturais? Quando não conseguem responder aos seus cidadão no Parlamento; quando ministros se recusam a revelar o conteúdo dos processos que levaram à “nacionalização” de Cahora Bassa; quando ninguém explica os contornos de negócios como o de gás ou de carvão; quando se é incapaz de proteger a riqueza nacional deixando recursos minerais sujeitos ao garimpo e pilhagem por estrangeiros dentro das nossas fronteiras, que legitimidade tem um governo para pedir ajuda internacional. De que ajuda realmente se está falando?
A melhor ajuda para África seria de facto o fim da assistência irresponsável a ditaduras e sistemas corruptos de governação.
A aparência democrática de alguns países africanos não esconde a verdadeira essência oligarquica e ditatorial dos regimes que temos.
A ser verdade toda a trama e contornos que levaram, por exemplo o MPLA ao poder nas últimas eleições em Angola, está claro que tipo de democracia existe na maioria dos países africanos. O silêncio cúmplice dos chamados parceiros de cooperação só mostra o interesse real dos mesmos. É como dizer que se a China fecha os olhos nós também devemos fazer o mesmo senão corremos o risco de perder posições no mercado angolano. Vergonhoso!
Os promotores do actual sistema de cooperação tem plena consciência e conhecimento de que estão apoiando o enraizamento da corrupção em nossos países e que deste modo os interesses que denominam de estratégicos continuam salvaguardados. Mas perderam a vergonha. Que credibilidade querem ter juntos dos povos que sofrem perante tanta hipocrisia?
Deixemo-nos de hipocrisia...
(Noé Nhantumbo, Canalmoz, 03/12/08 )
NOTA: Excelente artigo do Noé Nhantumbo, a ajuda a África tem mesmo de ser repensada pois não obtém os resultados pretendidos e incentiva a corrupção, falta de transparencia e clientelismo político.
A pergunta fica no ar: que aconteceu em Moçambique após trinta anos de independência?
Acho uma boa pergunta. Posso recomendar o livro "Há bicicletas, mas há desnevolvimento?" por Joseph Hanlon e tersa Smart.
ReplyDeleteO artigo está bem escrito. Penso que o problema é a gestão e controle.
ReplyDeleteA solidariedade é fundamental.
O problema é complexo: a sida, a malária, a falta de infra-estruturas...
A Europa, depois da II Guerra, desenvolveu-se com ajuda do Plano Marshall.
Ilustre Bosse, tomei nota do livro, já li partes na net mas gostava de o adquirir.
ReplyDeletePenso que a Suécia está a repensar a ajuda a África, é importante questionarmos certas situações.
Ivone, a solidaeiedade é importante e a ajuda humanitária é inquestionável, mas eventualmente temos de questionar se a ajuda atinge os objectivos pretendidos ou se estamos apoiando as elites que estão no poder, sabendo que há problemas com a corrupção e falta de transparencia.
ReplyDeletePenso que a solução passa por um maior controlo e pelo aprofundamento da democracia.